O símbolo de um sistema político que ameaça ruir (Foto: Escrevinhador) |
A lógica
que faz o PSDB sorrir a cada nova prisão – que põe a economia de joelhos e os
empresários em polvorosa. Parte da oposição pensou nessa escalada apenas como
ferramenta para desgastar o PT… Mas há sinais de que a estratégia pode estar
saindo do controle.
Por Rodrigo
Vianna – no seu blog
Escrevinhador (Portal Fórum), de 26/11/2015 (sugestão do companheiro
Geraldo Guedes, advogado em Brumado-Bahia)
É inaceitável, sob qualquer justificativa, que um líder do governo no
Senado Federal trame estratégias de fuga junto à família de um réu. E que se
proponha a interferir nas ações do Supremo Tribunal Federal. É de uma
arrogância e desfaçatez, a indicar o grau de deterioração da política no
Brasil.
Quando um líder do governo ataca a Justiça e a República, estamos às
portas de uma crise institucional.
Mas há mais que isso no caso Delcídio. Ele é filiado ao PT, e é preciso
lembrar que não existe política de esquerda (ou centro-esquerda, vá lá) quando
se perdem todos os princípios de defesa da Justiça. A definição do velho
Norberto Bobbio para “esquerda” é: são aqueles que lutam para reduzir
desigualdades.
Não se reduz desigualdade atentando contra a Justiça. Acho que não seria
preciso lembrar isso. Mas cá estamos num mundo estranho, num momento estranho…
“Ah, mas os tucanos sempre fizeram igual, e jamais foram pegos”. Isso é
fato. Mas não exime o PT da responsabilidade por aceitar um personagem desse em
seus quadros. Delcídio não queria a fuga de Cerveró para a Espanha em nome de
um projeto político – o que já seria grave. Agia, usando o cargo de senador e o
poder que lhe confere a Constituição, para proteger a si mesmo.
Delcídio Amaral esteve na Petrobrás sob FHC. Delcídio é “parceiro” de
altos tucanos em empreitadas políticas e negócios mal explicados. Delcídio é
também um símbolo do neopetismo (na mesma linha de André Vargas).
Mas o mais grave: a irresponsabilidade de Delcídio abriu caminho para que
se arrebente com o discurso de defesa das garantias constitucionais – criadas
para preservar, sim, a democracia e as prerrogativas parlamentares (mas não
para proteger bandidos).
Juristas e professores alertam para a interpretação
“fora da curva” adotada pelo STF, para mandar prender Delcídio. Mas alguns
desses advogados são realistas na avaliação do que se passa agora no país: “o despudor dos homens do poder cuidou de legitimar toda e
qualquer exorbitância punitiva. Nem me canso mais de fazer discurso garantista,
porque quando o líder do governo vai pra esse despudor, só resta jogar a
toalha. Parece até encomenda do Moro.”
Com o “presente” oferecido por Delcídio, Nestor
Cerveró (em vez de pegar um avião para a Espanha, como sugeriu o arrogante
senador neopetista) pode fazer o governo, a oposição e boa parte do mundo
político embarcarem numa montanha russa: e, no percurso, muitos podem ser
lançados pelos ares.
A delação de Cerveró deve atingir Renan, Temer e talvez chegue a Dilma.
E se Delcídio também falar, aí os tucanos podem perder algumas cabeças
coroadas na guilhotina das delações sem prova e do terror midiático.
Ou seja, já não é apenas de impeachment que se trata; mas de uma crise
institucional sem precedentes, que pode engolfar os 3 maiores partidos
políticos brasileiros: PT, PSDB e PMDB.
O roteiro do juiz Sérgio Moro, traçado lá atrás, previa uma espécie de
“refundação” da política, empreendida por homens que “não são políticos”. Todos
sabemos o perigo desse caminho.
Moro usa camisas pretas em suas aparições fantasmagóricas. Na Itália,
onde me encontro nesse momento, as camisas negras não são de bom augúrio. Mas
avancemos em outras conjecturas…
Pode-se discutir se a prisão de Delcídio não abre um precedente
perigoso, levando a um novo patamar essa espécie de revolução francesa
jurídico-midiática. Abre-se o caminho para a exceção punitiva, o que assusta o
andar de cima brasileiro, sempre acostumado a acomodações.
Já estavam presos (pela Lava-Jato) alguns dos maiores empreiteiros do
país; agora, somam-se à lista um banqueiro (Andre Esteves, suposto parceiro das
estripulias delcidianas) e um senador com trânsito no neopetismo e no tucanato.
Isso é bom ou ruim? A princípio, pode indicar sim um sinal de maturidade
da democracia. Mas é preciso ver qual o alcance dessa escalada punitiva.
Sabe-se que, em Brasília e em suas andanças pelo Brasil, Aécio Neves
costuma dizer aos empresários e à elite que, quando chegasse ao poder, tudo
isso teria fim. Voltaríamos aos velhos tempos em que rico não pagava por
crimes. Empresários que ousaram fazer negócios com petistas estão enjaulados. A
saída seria uma “restauração” tucana.
Essa é a lógica que faz o PSDB sorrir a cada nova prisão – que põe a
economia de joelhos e os empresários em polvorosa. Parte da oposição pensou nessa
escalada apenas como ferramenta para desgastar o PT… Mas há sinais de que a
estratégia pode estar saindo do controle – o que pode levar a um aprofundamento
da democracia, depois de passarmos por uma crise que promete ser profunda e
dolorosa.
A prisão de Delcídio fez o mundo político (e não apenas o petismo)
tremer nas bases. Ninguém mais está a salvo. Esse é o sinal que vem dessa
prisão.
Na revolução francesa, como se sabe, os que começaram cortando cabeças
terminaram perdendo as próprias na guilhotina. A política brasileira (mal
comparando) parece ter entrado num caminho desse tipo, de autofagia e
destruição.
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