Yoani Sánchez no Brasil (Foto: www.gerivaldoneiva.com) |
Por
Gerivaldo Neiva, Juiz de Direito de
Conceição do Coité (interior da Bahia), membro
da Associação Juízes para a Democracia (AJD) e do Law Enforcement Against
Prohibition - Leap-Brasil. (Título original: A chegada de Yoani em Coité e o
papel do Juiz de Direito. O título acima é deste blog).
Para quem ainda não conhece, Yoani
Sánchez é cubana, apresentada por boa parte da mídia mundial como sendo uma
blogueira que rompeu as barreiras da censura em Cuba e faz oposição ao regime.
Pois bem, esta moça está visitando o Brasil, depois de várias tentativas de
sair da Ilha, e resolveu aceitar o convite para palestrar em Conceição do
Coité-Ba, comarca da qual sou o Juiz de Direito.
Sabendo da visita, os estudantes da
cidade e políticos de esquerda começaram a se organizar para impedir a entrada
da moça na cidade e também impedir a realização do evento. Em seguida, fui
procurado pelos organizadores do evento, acompanhado de dois bons advogados,
para garantir que sua convidada pudesse entrar em Coité e realizar a palestra.
Primeiro, tentei mediar um diálogo
entre os estudantes e os organizadores do evento, mas não obtive êxito. Os
primeiros estavam irredutíveis e não admitiam de forma alguma a presença da
moça cubana em terras coiteenses e os segundos não abriam mão de realizar o
evento, pois contavam com a presença de políticos famosos e convidados de toda
a região.
Diante do impasse, convidei o
comandante local da polícia militar e lhe determinei que garantisse, sem
violências ou repressão, a realização dos dois eventos. Primeiro, preparasse
uma escolta desde a entrada da cidade e conduzisse a moça cubana por onde
pretendesse circular na cidade, garantindo-lhe a integridade física. Segundo,
preparasse uma boa guarnição para garantir a realização do protesto dos
estudantes, mesmo barulhenta, desde que não impedisse a realização da palestra.
Enfim, comandante, seu papel é garantir a realização da palestra e também do
protesto dos estudantes.
E decidi assim com a Constituição
aberta sobre minha mesa de trabalho. O Brasil é um “Estado Democrático destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais
e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”, conforme, escrito em seu preâmbulo; o Estado
brasileiro tem como fundamentos a cidadania, a dignidade da pessoa humana e o
pluralismo político (art. 1o) e, por fim, é livre a manifestação do
pensamento, a liberdade de consciência, a expressão da atividade intelectual e
de reunião, dentre outras garantias previstas no artigo 5o da
Constituição.
Pois bem, decidindo
assim, a moça chegou à cidade sob vaias e protestos, mas teve garantido o seu
direito de locomover-se em território nacional e expressar seu pensamento. Da
mesma forma, garantiu-se o mesmo aos contrários ao seu pensamento.
Sabendo da minha
decisão a seu respeito, para minha surpresa, fui o primeiro a receber a visita
da moça cubana. Depois de alguns cumprimentos e agradecimentos, já na saída,
ela me pediu uma sugestão de roteiro na cidade. Pensei um pouco e, já que tinha
sido solicitado, respondi: olhe, conhecendo os que te acompanham, sei que irão
te oferecer um saboroso jantar acompanhado de bons vinhos; depois, não se
assuste se algum deles, para te impressionar, saque de sua caixinha um dos mais
finos charutos cubanos (saudades de casa?); depois, não irão te permitir
repousar em um dos hotéis da cidade, pois teu quarto de hóspede já está
preparado. Então, apesar do conforto, durma pouco e acorde na madrugada para
conversar com pessoas que já estão nas filas dos postos de saúde para marcar
uma consulta para alguns meses, apesar da urgência do seu caso; depois, visite
os bairros periféricos da cidade, completamente abandonados pelo poder público,
e converse com os jovens dependentes de crack para tentar entender suas razões;
mais tarde, visite a zona rural do município para ver os estragos causados pelo
seca e as condições de vida dos pequenos produtores rurais e entenda que
milhões de nordestinos ainda estão vivos graças aos programas sociais do governo
federal; na saída, passando na cidade vizinha, visite o presídio regional e
veja as condições em que vivem os presos deste país, quase todos analfabetos,
sem profissão e delinquentes comuns; por fim, quando tomar a rodovia para
Salvador, não deixe de visitar um assentamento do Movimento Sem Terra e então
poderá entender as consequências de tantas cercas por este país... Depois
disso, creio que você será capaz de entender que o Brasil não se resume aos
jantares das elites, ao luxo do Congresso Nacional, a alegria do carnaval e o
que divulga a mídia brasileira. Enfim, o Brasil que irão te mostrar talvez não
seja o Brasil real. De qualquer forma, conte comigo para ver assegurado o seu
direito de ir e vir, mas principalmente de ir e ver as contradições desse país.
Com ironia,
despedi-me de Yoani: seja portadora de saudações ao Comandante Fidel e, estando
em Santa Clara, deposite por mim uma flor no mausoléu de Che Guevara! Ela
sorriu meio sem graça, mas não se esquivou de me apertar a mão.
O autor adverte: esta notícia não é verdadeira, esta visita
não aconteceu.
(Matéria
enviada pelo companheiro Goiano/José Donizette)
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