(O mandante) está no incentivo à violência, no descaso na apuração,
no desmonte aos órgãos responsáveis pelas políticas públicas, na perseguição à
imprensa, na impunidade... Quem incentiva o crime também aperta o gatilho.
Por Mônica Bichara (jornalista) junho 16, 2022 (Reproduzido do blog Pilha Pura)
Quem não está com um choro entalado na garganta
hoje, no Brasil, está do lado do mandante. E seja lá quem for o mandante
oficial dessa barbárie que abateu, num só golpe, um jornalista e um
indigenista, a digital do verdadeiro culpado está espalhada por todos os
lugares (pouco importa quem puxou o gatilho). Está no incentivo à
violência, no descaso na apuração, no desmonte aos órgãos responsáveis pelas
políticas públicas, na perseguição à imprensa, na impunidade... Quem incentiva
o crime também aperta o gatilho.
Desde a primeira notícia sobre o sumiço dos dois, o
"chefe supremo" botou a carapuça: “Se arriscaram numa aventura não
recomendável”. Não! Não era, nem nunca foi uma aventura. Muito menos não
recomendável. Estavam cumprindo suas missões. Culpar as vítimas sempre foi a
saída preferida dos covardes. E para isso nem fingem um mínimo de preocupação.
Não colaria mesmo.
É sintomático que essa monstruosidade tenha
vitimado justamente um jornalista, além do indigenista. Somos o alvo principal,
e declarado, do atual governo.
E justo o britânico Dom Phillips, correspondente do
The Guardian no Brasil, autor da suprema ousadia de questionar o todo poderoso,
em junho de 2019, sobre o crescimento dos desmatamentos na Amazônia e a falta
de ações de preservação. Citou, inclusive, a parceria do então ministro do Meio
Ambiente, Ricardo Salles (o que queria passar a boiada), com madeireiros da
região. Sem sequer olhar no rosto do entrevistador, sentado ao seu lado, nem
disfarçar o ódio que espumava pela boca imunda, o incentivador de toda essa
onda de violência que se instalou no país vomitou essa pérola: “Primeiro você
tem que entender que a Amazônia é do Brasil, não é de vocês”.
O choro coletivo, que continua entalado, vem se
acumulando desde outro maldito golpe, o que permitiu essa múltipla tragédia
brasileira. E foram inúmeros os atentados, sob forma de declarações
desastrosas, tecendo a crônica das mortes anunciadas. Alguns exemplos:
“Se eu assumir a Presidência do Brasil, não terá
mais um centímetro para terra indígena”, disse em 8 de fevereiro de 2018;
“Em 2019 vamos desmarcar a Raposa Serra do Sol.
Vamos dar fuzil e armas a todos os fazendeiros”, na Câmara Federal, em 2016;
"As reservas indígenas sufocam o agronegócio”,
em 2015;
“Se depender de mim, todo cidadão vai ter uma arma
de fogo dentro de casa. Não vai ter um centímetro demarcado para reserva
indígena ou para quilombola”, dia 3 de abril de 2017, no Estadão;
“Se eleito eu vou dar uma foiçada na Funai, mas uma
foiçada no pescoço. Não tem outro caminho”, promessa de campanha cumprida com
“louvor” – reduziu pela metade a estrutura do órgão de apoio aos povos
indígenas. O próprio Bruno Pereira já tinha sido vítima desse desmonte, quando
perdeu o cargo de coordenador de povos isolados na Funai, vingança promovida na
gestão do ex-ministro Sérgio Moro na Justiça.
Que essas mortes não sejam em vão
E para que as mortes de Dom Phillips e
Bruno Pereira não sejam em vão, o Brasil e o mundo precisam acordar e ir para
as ruas, soltar o grito coletivo que está nos entalando. Exigir punição, exigir
demarcação, respeito aos povos indígenas, aos territórios tradicionais, ao meio
ambiente, à democracia. À dor que estamos sentindo. Difícil mensurar a aflição
das famílias, amigos, colegas. Mais ainda a dos indígenas, que depositam
ESPERANÇA na "aventura", ou "excursão", dos ativistas em
defesa da Amazônia,
Está cada vez mais difícil respirar nesse país,
onde raposas foram colocadas para tomar conta de galinheiros. Um racista na
Palmares, uma fundamentalista nos Direitos Humanos, um madeireiro na Funai, um
latifundiário na Agricultura....
Não basta mais apenas chorar ou se revoltar com a
confirmação das mortes. Que a repercussão internacional desse caso, por
envolver um jornalista britânico, branco, representante de um dos mais
importantes veículos de comunicação do mundo, não esmoreça. É o mínimo que
podemos fazer, e exigir, para que Dom e Bruno não tenham perdido suas vidas em
vão. Que, ao contrário, eles virem semente de um Brasil mais justo. Como a
memória de Marielle Franco vem ajudando a semear a luta pela redemocratização
do país.
#ForaBolsonaroGenocida
#domebrunopresentes
#MariellePresente
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Goiano.