Precisamos de soberania sobre nossos
corpos e nossas vidas para não sermos cidadãs de segunda classe. Se não podemos
decidir sobre nossos corpos, como disse Simone de Beauvoir, somos simplesmente
escravas.
Por Marta Dillon – trechos traduzidos de artigo do jornal
argentino Página/12, de 09/08/2018
(o complemento do título e o destaque acima são da edição deste blog)
(…) uma história que conserva a memória do genocídio
das bruxas e que se rebela contra a morte gritando: somos as netas de todas as
bruxas que nunca puderam queimar. Porque em algum momento (a las mujeres) nos
queimaram por tomar decisões sobre nossos corpos, nos queimaram porque nos
reuníamos entre nós mesmas, porque nossa capacidade reprodutiva necessitava ser
apropriada para reproduzir somente força de trabalho. Não nos esqueçamos disso.
É o mesmo poder que agora pressiona a mais rançosa –rançosa porque cheira mal –
da liderança política para que decida contra as mulheres. O mesmo poder que sempre
esteve contra todas as liberdades. A Igreja Católica e as igrejas evangélicas
pretendem falar por nós; usam seu poder de veto porque se sentem ameaçadas,
porque não têm como sustentar a moral que proclamam quando sua instituição está
corrompida pela pedofilia, pelos abusos contra as freiras, pela organização
patriarcal onde as mulheres não têm nenhum poder. Pretendem nos arrebatar nossas
vidas, nossos prazeres, nossos desejos; pretendem ocultar o que é uma evidência
concreta: a maternidade tem que ser desejada e é por isso que abortamos. O
fizemos por muitos anos com vergonha, com temor devido à criminalização, com medo
de não saber se estávamos nas mãos de quem sabia o que fazia. O fizemos,
abortamos na clandestinidade, porque isso é defender nossa liberdade. E a liberdade
não se pede, se toma, se busca. Mas já não queremos mais por em risco nossa
vida, não tem sentido, nossa insubmissão é essa: defender nossas vidas como
cada vez que dizemos #NiUnaMenos. Basta de femicídios. Basta de femicídios de Estado,
que isso e não outra coisa é cada mulher que morreu ou que morre agora mesmo
por ter que recorrer a um aborto inseguro.
Que argumento puderam colocar os defensores dos antidireitos?
Que argumento de peso se pode (pôde) escutar, nestes meses de debate, que tivesse
a força suficiente para contradizer que nós precisamos de soberania sobre nossos
corpos e nossas vidas para não sermos cidadãs de segunda classe? Se não podemos
decidir sobre nossos corpos, como disse Simone de Beauvoir, somos simplesmente
escravas.
(...)
Porque à clandestinidade não se volta, aborto se diz
em voz alta, as maternidades serão desejadas ou não serão. E a revolução que
estamos gestando, sem dúvida, é feminista.
Para ler o texto na íntegra, em espanhol:
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