Nepomuceno e Lula (Foto: Brasil 247) |
Em artigo publicado neste
domingo, o escritor Eric Nepomuceno aponta uma inversão da lógica policial nas
investigações em curso no Brasil: antes, do crime partia-se para a busca do culpado;
hoje, acontece o inverso: "A grande imprensa e a direita ressentida já têm
o culpado: Lula da Silva. Agora tratam de descobrir qual o crime
cometido", diz ele; segundo Nepomuceno, o Brasil enfrenta uma campanha de
ódio como não se via há 65 anos; o objetivo é "a fulminante
desconstrução da imagem do mais importante líder popular surgido desde Getúlio
Vargas, o mítico presidente que, acossado por campanha similar, optou por se
matar em agosto de 1954".
Por Eric Nepomuceno (*)
– reproduzido do site Brasil 247, de 14/02/2016
A
verdade é que existe, tanto no PT como no grupo mais próximo a Lula da Silva,
um claro incômodo diante do silêncio da presidenta Dilma Rousseff e seu governo
com relação ao verdadeiro massacre sofrido pelo ex presidente. Uma muito bem organizada
ação articulada por amplos e poderosos setores da Polícia Federal, do
Ministério Público e, claro, dos grandes meios hegemônicos de comunicação
encontraram num juiz de província chamado Sérgio Moro o eixo para uma campanha
como não se via no Brasil há pelo menos 65 anos, cujo objetivo é a rápida e
fulminante desconstrução da imagem do mais importante líder popular surgido
desde Getúlio Vargas, o mítico presidente que, acossado por campanha similar,
optou por se matar em agosto de 1954.
São ingredientes claros de toda clareza. De um
lado, os partidos de oposição, encabeçados pelo PSDB (Partido da
Socialdemocracia Brasileira), nocauteado pelo PT de Lula em quatro ocasiões
sucessivas em suas tentativas de voltar à presidência.
Dando mostras de que sua irresponsabilidade
desconhece limites, o PSDB não apenas tenta o golpe institucional por duas vias
– a do julgamento político no Congresso, e a da impugnação das eleições de
2014, que reconduziram Dilma Rousseff à presidência, no Tribunal Superior
Eleitoral – como se dedica, dia sim e o outro também, a derrotar medidas
propostas pelo governo que foram precisamente criadas e defendidas durante os
dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), principal expressão do
partido. Assim, qualquer coisa que possa ser prejudicial ao governo, não
importando as consequências sobre o país, merece o rápido apoio do PSDB.
De outra parte, o verdadeiro combustível da
fogueira destinada a tentar carbonizar Lula da Silva sem de um esquema tão
visível como absurdo, sem que ninguém tente desfazê-lo.
A coisa funciona assim: algum funcionário da
Polícia Federal adverte os meios hegemônicos de comunicação que foi detectada
uma suspeita sobre Lula da Silva (as provas e indícios são, claro,
desnecessárias). A informação é imediatamente publicada pela imprensa e
disseminada pela televisão, especialmente a Globo, que cresceu e se fortaleceu
durante a ditadura militar (1964-1985), e não oculta a nostalgia daqueles bons
tempos.
Baseado nessa notícia, algum procurador de escalão
intermediário pede à Polícia Federal uma investigação. O juiz Sérgio Moro
autoriza, e pronto.
Muitos dos delegados da Polícia Federal que
investigam o esquema de corrupção implantado na Petrobras e outras estatais
fizeram campanha, nas redes sociais, para o derrotado Aécio Neves, do PSDB,
contra Dilma, em 2014.
Muitos dos procuradores que orbitam ao redor do
juiz Moro integram seitas evangélicas que se opõem a tudo que se refira ao
governo, e alegremente participam de cerimonias condenando Lula, Dilma, o PT e
tudo que tenha cheiro de esquerda ao fogo eterno.
Moro, ídolo máximo da direita, atua como Justiceiro
Supremo. Não parece preocupado com os escandalosos abusos ditados pela sua
pluma afiada e sua voz fininha. O que importa é manter empresários e políticos
presos inexplicavelmente até que aceitem o recurso da delação premiada e
confessem qualquer coisa com tal de voltar para casa.
Há, efetivamente, uma inexplicável inação da parte
do ministro de Justiça de Dilma, a quem a Polícia Federal está subordinada
administrativamente. Não se trata, claro está, de impedir que se investigue a
fundo e sem limites todo e qualquer ato de corrupção. Mas, por que não impedir
o vazamento seletivo, à imprensa, de acusações sem prova alguma? Por que
permitir que não se investigue denúncias contra partidos de oposição, que se
multiplicam sem parar?
Nenhuma medida é adotada para que os minuciosos
regulamentos de conduta sejam respeitados e obedecidos.
Seja como for, alguma coisa já se conseguiu: Lula é
o culpado. De quê? De ser dono de um apartamento de classe média num balneário
decadente que ele mesmo admitiu ter tido como opção de compra, da qual
desistiu. De ser dono de um sítio que está em nome do filho de um de seus
melhores e mais antigos amigos.
Ambos os imóveis foram reformados por construtoras
envolvidas em escândalos de corrupção. E que, por sua vez, são as mesmíssimas
que financiaram a compra do imóvel e do luxuosíssimo mobiliário do instituto de
outro ex-presidente, Fernando Henrique Cardoso, do tão moralista PSDB.
Cardoso é um intelectual de alto coturno, um
exemplo nítido das elites acadêmicas não apenas de seu país, mas do continente.
Uma doação ao seu instituto é um ato de generosidade do empresariado.
Lula da Silva é um operário de escassíssima cultura
acadêmica, mas de indescritível sensibilidade social e intuição política. Uma
doação ao seu instituto é, claramente, um ato de corrupção.
A grande imprensa e a direita ressentida já têm o
culpado: Lula da Silva. Agora tratam de descobrir qual o crime cometido.
O mais importante, o essencial, é impedir que ele
torne a ser eleito em 2018.
(*) Eric Nepomuceno é jornalista, escritor e tradutor.
(*) Eric Nepomuceno é jornalista, escritor e tradutor.
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