Leopoldo López (Foto: Internet) |
Será que o “preso político” venezuelano Leopoldo López foi condenado pela Justiça a 14 anos de cadeia simplesmente “por pensar diferente”, como quer o novo presidente argentino? Ou foi como um dos responsáveis pelos 43 assassinatos, 400 feridos e outros desmandos durante os protestos de 2014?
Por Jadson Oliveira - reproduzido do site Dia e Noite no Ar, de 22/12/2015
Há pessoas cuja cara de pau só é compreensível devido à desavergonhada cumplicidade da mídia hegemônica. O último caso na praça é o novo presidente argentino, Mauricio Macri, se transmutar em defensor dos direitos humanos na América Latina.
Só para efeito externo, pegando logo a Venezuela, o saco de pancadas preferido pelo império estadunidense, já que atualmente, depois de 50 anos, Cuba passou para outra dimensão. Internamente não, lá dentro da Argentina não, aí seria inverossímil demasiado.
Porque quem conhece um pouco a história recente dos argentinos sabe que Macri e seu partido PRO (Proposta Republicana), durante os últimos oito anos à frente da prefeitura de Buenos Aires, nunca deram um pio para ajudar a arrojada política de direitos humanos dos kirchneristas. Política que propiciou, com muitos obstáculos vencidos, que a Justiça prendesse e condenasse, até agora, mais de 500 torturadores da última ditadura (1976-1983).
Muito pelo contrário: as forças que apoiaram Macri – empresário ostensivamente neoliberal, adorador do deus “mercado” e dos “negócios” que entrou na vida pública como presidente do popularíssimo Boca Juniors – esperam impacientemente que o novo governo mude o disco e pare com essa mania de “perseguir” os antigos repressores do regime militar.
A demonstração mais cabal disso foi logo em seguida à vitória eleitoral de Macri: o jornal conservador La Nación (equivalente ao nosso Estadão, o decadente jornalão dos aristocráticos Mesquita) pediu, desavergonhadamente, que se abandone tão atroz “perseguição”. A coisa foi tão aberrante que os próprios jornalistas e outros empregados do diário se manifestaram publicamente contra o editorial, uma mostra do quanto está entranhada na sociedade argentina a política de defesa dos direitos humanos.
Certamente por isso, Macri, que pode ser direitista radical, mas não é bobo, não vai entrar nessa armadilha. Internamente não. Para consumo externo sim. E pau no governo bolivariano da Venezuela, tudo bem. Para isso ele tem o respaldo da mídia amiga.
Assim é que ontem (dia 21), na cúpula do Mercosul, em Assunção, posou de paladino dos direitos humanos, violados… onde? Na Venezuela, claro: pediu “a liberação imediata dos presos políticos” na terra de Simón Bolívar e Hugo Chávez, pontificando: “Não pode haver lugar para a perseguição ideológica e a privação ilegítima por pensar diferente”.
No ato, a chanceler venezuelana Delcy Rodríguez, em nome do presidente Nicolás Maduro, desmascarou o impostor. É o que este articulista tenta fazê-lo em seguida:
Para simplificar, não vamos falar de “presos políticos”, vamos falar de Leopoldo López, o “preso político” mais badalado. Será que a Justiça – não o governo, não o Poder Executivo – condenou López a 14 anos de prisão por “pensar diferente”?
López é o fundador e principal dirigente do partido de ultradireita Vontade Popular. Filho de tradicional família rica que já esteve envolvida em caso de corrupção na petroleira estatal PDVSA (Petróleo da Venezuela S/A). Participou do golpe de abril de 2002 que tirou o então presidente Chávez do poder durante 48 horas. Foi prefeito de Chacao, um dos cinco municípios que compõem a capital Caracas (um dos pequenos, habitado por maioria rica).
(Quando eu estive pela primeira vez na Venezuela, em 2008, ele tinha cumprido o mandato de prefeito e estava sendo acusado de irregularidades administrativas).
Foi o líder mais destacado dos protestos violentos contra o governo Maduro no primeiro semestre de 2014, cujo principal “programa político” era intitulado “La Salida” (A Saída). Ou seja, queriam derrubar na marra um governo legal e legitimamente recém eleito, simplesmente porque perderam a eleição e se recusaram a reconhecer a derrota.
Armaram em ruas de bairros nobres o que eles chamam por lá de “guarimbas” (barricadas); colocaram franco-atiradores (parte paramilitares colombianos, segundo denunciam os chavistas), inclusive com bazucas, em pontos mais altos em torno, provavelmente edifícios; assassinaram 43 pessoas, entre policiais, manifestantes pró e contra o governo ou simplesmente pessoas que passavam pelos locais.
Além disso, durante os protestos foram queimados prédios de serviços públicos essenciais, como o Ministério Público, 19 universidades e outras escolas, inclusive infantis, e instalações de atendimento à saúde. E ademais dos 43 mortos, cerca de 400 pessoas ficaram feridas.
Seria isso o simplório “pensar diferente”?
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