ATILIO BORON: AS DUAS TÁTICAS DA DIREITA VENEZUELANA

(Foto: Carta Maior)
A estratégia da direita foi promover o desabastecimento programado de artigos de primeira necessidade para desatar a ira popular contra o governo.
Por Atilio A. Boron (cientista político argentino) – para o Página/12 – reproduzido do portal Carta Maior, postagem de 06/12/2015

Muito tem se falado sobre que a direita venezuelana não fez campanha para as eleições deste domingo 6 de dezembro. Não é verdade. A MUD (Mesa de Unidade Democrática) trabalhou intensamente para derrotar o governo de Nicolás Maduro, mas sua campanha não esteve focada no terreno eleitoral, porque é um espaço no qual tem sido sistematicamente derrotada desde o triunfo do Comandante Hugo Chávez nas eleições presidenciais de dezembro de 1998. Sua tática tem sido outra: promover o desabastecimento programado de artigos de primeira necessidade para, desse modo, desatar a ira popular contra o governo, “incendiar as ruas” através de provocações, do terrorismo midiático e da desinformação, estabelecer vínculos e articular ações desestabilizadoras dentro do país com a ajuda de forças paramilitares comandadas pelo ex-presidente colombiano Álvaro Uribe. Ademais, também apostam numa campanha internacional de coberturas poucas vezes vista na história, para satanizar o governo bolivariano, distorcendo as informações sobre o que está ocorrendo no país e recrutar, sob as ordens do ex-mandatário espanhol José María Aznar, conhecido lugar-tenente de Washington, uma legião de supostos guardiães da democracia, que atacam o governo de Maduro sem perdão com seus escritos e conferências, através dos meios hegemônicos.
 
Essa direita tem um DNA incorrigivelmente autoritário: apoiou apaixonadamente o golpe de abril de 2002, pensando que o povo chavista seria indiferente à usurpação do poder presidencial, apoiou a antipatriótica greve petroleira e o locaute patronal entre dezembro de 2002 e fevereiro de 2003, e mais recentemente, respaldou a sedição encabeçada por Leopoldo López após o resultado das eleições presidenciais de 2013 e, principalmente, a categórica derrota sofrida nas regionais de dezembro, naquele mesmo ano. Se trata, portanto, de uma formação política profundamente antidemocrática, que só sabe jogar uma carta, reservando a outra para fazer a batalha econômica, na sociedade e no sistema internacional, com qualquer arma, legal ou ilegal. Uma de suas líderes, Lilian Tintori, esposa de Leopoldo López, vem repetindo até o cansaço que “no dia 6 de dezembro, se a oposição não ganhar é porque houve fraude”. É difícil encontrar uma demonstração mais irrefutável do espírito antidemocrático que uma expressão como essa. O que fará a direita venezuelana caso isso aconteça?
 
Há dois cenários possíveis. Se a oposição ganhar – e “ganhar” significa obter uma maioria na Assembleia Nacional – certamente que proclamará o carácter plebiscitário do pleito e exigirá a renúncia de Nicolás Maduro. Por se tratar de eleições parlamentares, é óbvio que o presidente não poderia aceitar uma chantagem desse tipo. Não só ele, mas também o povo chavista. Além disso, a Constituição bolivariana possui um instrumento chamado “referendo revogatório”, que pode ser utilizado para remover legalmente um presidente na metade do seu mandato. Uma oposição que respeita as regras da democracia, sem apostar na sedição ou na guerra econômica, deveria se organizar para lutar por esse referendo. Mas não é o caso da direita venezuelana.
 
Para concluir a direita apelará a essas duas táticas para tentar obter a ansiada “saída” de Maduro e a “mudança de regime” que Washington espera. Se consegue um triunfo nas eleições, ela argumentará que o povo se manifestou contra Maduro e que ele deve renunciar. Se as urnas favorecerem o governo, gritará “fraude” com todas as forças. Infelizmente, essas duas táticas visam desatar a violência, tal como ocorreu nos primeiros meses de 2014. Será uma prova dura para o governo bolivariano, evitar que a conduta de uma coalizão que não está disposta a competir segundo as regras do jogo provoque outra vez um caos como o desatado no começo do ano passado, que levou a um saldo de 43 mortos e mais de trezentos feridos, além dos consideráveis danos materiais. Poderemos discutir depois, e muito, sobre como se chegou a esta situação. O perverso acionar do imperialismo e da direita vernácula tem sido especialmente maligno, agigantando os problemas de ineficiência e da corrupção oficial. Porém, no momento em que as críticas aos erros governamentais diminuem, é preciso destacar, com mais força do que nunca, que os acertos históricos do chavismo superam com folga as deficiências que possam ser atribuídas à gestão de Maduro.

 
Tradução: Victor Farinelli

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