(Foto: Internet) |
Droga usada no tratamento da Aids subiu 5.000% nos Estados Unidos: o que
conta não são os pacientes, as pessoas, mas os “clientes” desse imenso e
rendoso mercado, onde giram negócios milionários.
Por Jadson Oliveira - reproduzido do site Dia e Noite no Ar, de 15/12/2015
Há três
meses vi uma notinha interessante na primeira página do meu jornal predileto, o
Página/12. É um diário privado que nos padrões argentinos é catalogado como de
centro-esquerda (no Brasil seria tachado de esquerda). Prefiro considerá-lo
como um veículo da mídia contra-hegemônica. Apoiava Cristina Kirchner e agora
fará oposição a Mauricio Macri, pois não é, decididamente, um adorador do deus
mercado.
Ontem, vi
uma amiga mencionar no Facebook a expressão “indústria da doença”, que acho a
melhor para designar a nossa medicina capitalista e todo seu aparato em torno.
A notinha, que tinha o título ‘Mercados’ (edição impressa de 23/09/2015), ficou
em meus arquivos já com o título que uso agora neste artigo. Traduzi do
espanhol:
“A droga Daraprim serve para tratar a Aids e tem
salvo vidas em todo o mundo. O valor da dose era de 13,5 dólares até há poucos
dias, ainda que fabricar um comprimido custe apenas um dólar. Como o
medicamento em geral faz parte das regras do jogo do mercado, na semana passada
(mês de setembro/2015), a empresa Turing Pharmaceuticals, de Nova Iorque, comprou
os direitos exclusivos de fabricação e venda do remédio nos Estados Unidos e
aumentou 5.000% o preço. Agora custa 750 dólares”.
É de lascar, não é? Diante duma notícia desta, a
gente fica até sem graça se perguntando: o que digo agora que possa causar
algum impacto?
Me vêm à mente aqueles casos mais convencionais de
quando o pai (ou a mãe) pergunta ao filho o que quer ser quando crescer e a
resposta: quero ser médico para ajudar as pessoas. Coitado! E a festa quando
passa no vestibular!? E na formatura!?
Me recordo dum conto do grande Monteiro Lobato
falando dum jovem médico, que substitui seu pai, também médico, no tratamento
dum fazendeiro rico e traça toda uma estratégia para prolongar a doença e
arrancar toda a fortuna do homem, inclusive no inventário pós morte.
Me recordo dum médico fdp que ia cuidar de minha
mãe já perto de morrer: a sacanagem foi
tão grande que o “xinguei” de deus e passei dois meses com uma dor de cabeça
que temi que se tornasse crônica.
Me recordo quando eu era um jovem repórter, na
década de 70, e chegava aqui o ministro da Saúde e ele anunciava – e a gente
escrevia e o jornal publicava com destaque – uma nova medida administrativa que
iria acabar com as filas do atendimento aos pobres.
As filas estão aí até hoje. Com a “universalização”
do SUS, parece que melhorou, mas outro dia estive marcando uns exames para uma
sobrinha ali na Rua Carlos Gomes (centro de Salvador) e testemunhei cenas de
resignação e revolta.
Mas passei a falar de pobres – mania de falar de
pobres, parece até coisa de comunista -, os quais não são bem o cerne dos
interesses do dito mercado.
O importante mesmo não são os pacientes, mas os
“clientes” desse imenso, rendoso e fascinante mercado, onde giram os negócios da
indústria farmacêutica, dos grandes laboratórios, dos chamados planos de saúde
(empresas seguradoras), clínicas, hospitais e dos médicos/empresários, em
conluio com os monopólios da mídia hegemônica, autoridades governamentais e
associações médicas.
Quem quiser avançar no assunto, deixo aqui o link
do artigo “A Máfia Médica” e a Indústria da Doença: http://www.fisiobrasil.com.br/main.asp?link=noticia&id=1471
Jadson Oliveira é jornalista baiano. Trabalhou nos jornais Tribuna da Bahia, Jornal da Bahia, Diário de Notícias, O Estado de S.Paulo e Movimento. Depois de aposentado virou blogueiro e tem viajado pela América do Sul e Caribe. Edita o Blog Evidentemente – www.blogdejadson.blogspot.com .
Observação deste Evidentemente:
Executivo-monstro que aumentou remédio em
5.000% é preso nos EUA
Dois dias depois que publiquei o artigo no site Dia
e Noite no Ar, do colega Vicente de Paula, vi a nota do “Executivo-monstro...”
no blog Tijolaço, de Fernando Brito. Transcrevo aí:
“Há três meses este blog publicou a história do executivo que, aproveitando-se
do controle da patente de um medicamento para malária e para Aids, aumentou em
5.000% o preço ao consumidor.
Hoje, este cidadão foi preso, não por esta
crueldade, mas por ter usado ilegalmente as ações da Retrophin, uma
empresa de biotecnologia que fundou em 2011 e da qual era um dos diretores,
para pagar dívidas de outros negócios, sobretudo de um fundo de investimentos
“picareta” que criou, o MSMB Capital Management.
A notícia foi dada pela Bloomberg e, embora por
outros motivos, é uma “justiça poética” que um cidadão destes, por qualquer
razão, passe uma temporada atrás das grades.
Afinal, quem faz isso com remédio essencial para
evitar a morte está cometendo um crime contra a vida”.
Comentários