Lomanto Júnior morreu no último dia 23 aos 90 anos (Foto: do Dia e Noite no Ar) |
Do PTB, partido getulista/janguista que passou, obviamente, a ser perseguido pelos golpistas, nosso Lomanto estava numa enorme encruzilhada: reagir ou aderir?
Por Jadson Oliveira – jornalista/blogueiro – reproduzido do site Dia e Noite no Ar (www.diaenoitenoar.com.br), de 24/11/2015
Morreu o ex-governador baiano Lomanto Júnior, com aquela pinta de gordo bonachão, gente boa e pusilânime. Vi ontem, segunda-feira, a notícia, mas me esqueci. Ao passar hoje cedo (terça), na caminhada costumeira, defronte do Palácio da Aclamação, vi um velório. Perguntei a um policial e ele me disse: “É Lomanto”.
Já tinha me esquecido, como são fugidias as notícias diante de tantas no dia-a-dia! Ora, o Lomanto… e fui caminhando… nada como uma caminhada para rodar a roleta das lembranças de um septuagenário! Como o Lomanto aparece nas minhas recordações?
Primeiro desesperado, chorando, de cueca, na madrugada de 31 de março para 1º de abril, no início do golpe militar de 1964, vagando pelos corredores do Palácio Rio Branco, onde moravam os governadores da época.
O grande responsável por tal lembrança é o antigo deputado baiano Elquisson Soares, que costumava repetir nos atos públicos, para delírio de nosotros esquerdistas, que “o governador Lomanto Júnior foi visto chorando, de cueca, nos corredores do Palácio…”
(Elquisson, para os mais jovens – cuja grande maioria não sabe o que é ditadura, embora alguns tresloucados vivam a pedi-la de volta -, era do MDB “autêntico”, chamado assim porque sua turma fez oposição de verdade ao regime militar, apesar do MDB ter sido criado para fazer oposição de mentira).
O choro de cueca pode ser verdade ou mentira, mas a versão trombeteada pelo Elquisson se encaixa num contexto verdadeiro: do PTB, partido que passou a ser perseguido pelos golpistas, nosso Lomanto estava numa enorme encruzilhada: reagir ou aderir?
Pusilânime como demonstrou ser, não deu outra: num jornal da manhã (deve ter sido o Jornal da Bahia), divulgou um manifesto contra o golpe; e no jornal A Tarde (que antigamente começava a circular à tarde, como o nome indica) sapecou um segundo manifesto apoiando o golpe. E sobreviveu, cumpriu todo o mandato: de 1962 a 1965.
Uma segunda recordação é que foi ele o governador que patrocinou a solução da crônica falta de água em Salvador. Eu fui vítima dela: morava numa pensão vagabunda na hoje Rua Nova de São Bento (na época chamava-se Joaquim Nabuco, será isso mesmo?), ali atrás do Relógio de São Pedro, tão vagabunda que, ironicamente, a turma a chamava Palace Lila (que Deus a tenha, dona Lila, velha e avarenta como seriam todas as donas de pensão).
A salvação da turma era a construção dum edifício em frente. Lá nos abastecíamos de água para o banho nosso de cada dia. Em seguida, a salvação foi Lomanto, cujo governo resolveu o problema utilizando as águas do Rio Joanes, até hoje não esqueço o nome do rio e nem, claro, do governador. Passa o filme, rápido: Lomanto, falta d’água, edifício em construção e Rio Joanes.
A terceira lembrança me foi contada pelo colega Franciel Cruz: Lomanto governador, com dona Hildete, desce num aeroporto no interior da Bahia e, acidentalmente, a primeira-dama quebra o salto do sapato. Logo um prestimoso simpatizante agiliza o conserto e uma hora depois já lhe entrega o sapato em condições de uso.
E aí se dá um surpreendente diálogo: dona Hildete agradece e quer lhe pagar. Ele recusa o pagamento, mas ela insiste. Então ele lhe dirige uma recusa inapelável: “Vai tomar no cu, dona Hildete, a senhora acha que vou lhe cobrar uma coisa dessa!?” Dizem que o próprio Lomanto gostava de contar esse caso, naquele jeitão bonachão.
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