(Foto: reproduzida da Carta Maior) |
João Paulo Rodrigues (MST) defendeu
a elaboração de bandeiras que dialoguem com a realidade do povo. “É
impressionante como a gente fala um palavrório que não dialoga com nossas
massas. Fica panfletário e só atinge meia dúzia de militantes”, alertou. Tal
como (Guilherme) Boulos (MTST), ele também acredita que nenhuma frente vai
avançar sem a retomada das lutas populares.
“A direita fala com metade dos 80 milhões de internautas brasileiros, enquanto a esquerda só fala com 15 milhões. Além disso, eles têm as igrejas neopentecostais que defendem seus valores e já estão até nos assentamentos do MST”.
GUILHERME BOULOS: ESQUERDA
ASSISTE ESGOTAMENTO DA ESTRATÉGIA DO PT, BASEADA NA CONCILIAÇÃO E NO PACTO
SOCIAL
“Nesses 13 anos, o governo
fugiu do conflito como o diabo da cruz. E isso limitou o alcance da sua
estratégia política. Não fizemos nenhuma das reformas estruturais necessárias
ao país, como a urbana, a agrária, a da comunicação e a tributária, entre
outras”.
Segundo Boulos, a direita brasileira tem hoje três grupos, cada um com sua estratégia: o liderado por Geraldo Alckmin, outro do vice Michel Temer e um terceiro liderado por Aécio Neves e Eduardo Cunha.
Por Najla Passos – no portal Carta
Maior, de 10/11/2015
Para avançar, frente de esquerda deve
retomar mobilizações populares
Em seminário promovido pelo Fórum
21, representantes de movimentos populares debateram alternativas políticas ao
esgotamento do modelo de governo do PT.
Para avançar na constituição de uma frente de esquerda no Brasil, é imperativo retomar as mobilizações populares e, a partir delas, criar uma alternativa política ao esgotamento desse modelo de governo adotado pelo PT. Essa é a síntese das ideias debatidas na primeira rodada do ‘Seminários para o avanço social”, evento promovido pelo Fórum21, que teve início nesta segunda (9), na Assembleia Legislativa de São Paulo, e segue até a próxima sexta (13).
Coordenador nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST), Guilherme Boulos afirma que a esquerda assiste hoje ao esgotamento da estratégia política adotada pelo PT para governar o país nos últimos 13 anos, fundamentada sobretudo na conciliação, no pacto social. Da política econômica adotada, que apostou no chamado “ganha-ganha”, em que os mais ricos mantêm seus lucros históricos enquanto os mais pobres melhoram sua qualidade de vida, à polêmica decisão de garantir a governabilidade via aliança com setores mais conservadores, apresentada como uma forma de se chegar ao poder, mas depois eternizada.
“Nesses 13 anos, o governo fugiu do conflito como o diabo da cruz. E isso limitou o alcance da sua estratégia política. Não fizemos nenhuma das reformas estruturais necessárias ao país, como a urbana, a agrária, a da comunicação e a tributária, entre outras. Todas as conquistas do período – como, por exemplo, a política valorização do salário mínimo - foram feitas exclusivamente por meio de manejos orçamentários. Isso gerou uma popularidade ímpar para Lula, porque nem a burguesia nem os trabalhadores tinham do que reclamar. Mas o modelo entrou em colapso frente à crise”, afirmou.
Conforme o ativista, a partir do momento em que o orçamento não era mais suficiente para atender a todos, o pacto social começou a ruir e a ofensiva conservadora ganhou as ruas. “Chegou-se a uma encruzilhada onde não dava mais para empurrar com a barriga: ou se avançava com as reformas pendentes ou recuava com uma política de austeridade tradicional. Esse, inclusive, foi o debate do segundo turno das eleições de 2014. E a saída da Dilma pela esquerda conseguiu constituir um campo que lhe permitiu vencer as eleições. Mas na semana seguinte, o discurso dela mudou”, acrescenta.
Para ele, o drama da conjuntura brasileira atual provém desse paradoxo: ao mesmo tempo em que temos um governo acovardado que assumiu a pauta da austeridade, é real a ofensiva conservadora de uma direita que quer derrubá-lo a qualquer preço. Nas palavras dele, para além de um governo que está atacando direitos sociais, há uma direita que não se contenta só com isso e avança rumo ao golpe nas ruas e na mídia. “Mesmo com todas as concessões, mesmo com este governo cedendo tudo que a direita conservadora e a elite financeira quer, a direita não quis mais repactuar“, sustenta.
As três direitas do Brasil
O coordenador do MTST ressalta que a direita hoje se divide em três grupos, todos eles com condições de viabilizar seus propósitos, dada a conjuntura tão conturbada. O primeiro é o que prefere desgastar o PT até 2018 e vencer as eleições no voto. Sua figura mais proeminente é o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. O segundo é o que aposta no impeachment e tem o vice-presidente Michel Temer nas suas fileiras. O terceiro e mais radical é o que defende a cassação do mandato da presidenta via judiciário, e reúne figuras emblemáticas como o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o senador Aécio Neves (PSDB-MG), o candidato derrotado ao Planalto.
Para Boulos, este cenário coloca desafios concretos e urgentes às forças progressistas. E para enfrentá-los, ele alerta que a esquerda não pode cometer dois erros principais. O primeiro é desdenhar do poder dessa ofensiva conservadora, como fazem alguns setores do próprio governo, que acreditam que a direita já está pacificada com o toma-lá-dá-cá de cargos e verbas políticas. O segundo é justamente o inverso: acreditar no discurso de que criticar o indefensável ajuste fiscal do governo é ‘fazer o jogo da direita’ e colaborar com o golpe contra a estabilidade democrática.
“Este erro nos limita a capacidade de disputar a insatisfação social. Se defendemos essas políticas do governo, nós perdemos a capacidade de dialogar com 80% da população e acabamos por jogá-la no colo da direita”, alerta. Para o militante, o desafio colocado é construir uma política de equilíbrio, de fio da navalha, porque qualquer descuido pode resultar na perda da base social dos movimentos, como já ocorreu com o governo. “Precisamos de um novo ciclo de mobilizações para construir uma alternativa política ao esgotamento do modelo que o PT criou”, conclamou.
A agenda robusta da direita
Membro da coordenação executiva do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), João Paulo Rodrigues ressaltou as diferenças entre as agendas da direita e da esquerda no Brasil de hoje. Segundo ele, ambas não estão unificadas e enfrentam contradições internas, mas a ofensiva conservadora tem dado uma pauta robusta à primeira, que não deve ser desconsiderada.
Segundo ele, a direita está dividida e não tem consenso quanto a forma de resolver o problema do esgotamento do modelo petista de governar. Ele acredita que há, inclusive, divergências sobre a eficácia do modelo econômico, já que setores do capital que se alinharam às ideias neodesenvolvimentistas ganharam muito dinheiro com a ascensão da classe média.
Rodrigues observa também que a direita enxerga o desgaste da esquerda como uma grande oportunidade. No Congresso, aproveita a crise para aprovar toda sorte de pautas conservadores, que implicam na retirada de direitos e retrocessos sociais. Nas ruas, defendem ideais fascistas. “Eles estão vindo com tudo. Pegam o tema da corrupção, mas vem contra todos os valores e bandeiras históricas da esquerda”, alerta.
Para ele, uma das maiores preocupações da esquerda deve ser justamente com a construção desse novo campo da direita, com componente popular, que consegue dialogar com um grande número de pessoas através não só da mídia tradicional, mas também da internet. “A direita fala com metade dos 80 milhões de internautas brasileiros, enquanto a esquerda só fala com 15 milhões. Além disso, eles têm as igrejas neopentecostais que defendem seus valores e já estão até nos assentamentos do MST”, denuncia.
Uma esquerda forte, mas contraditória
Do outro lado, a avaliação de Rodrigues é que o Brasil ainda conta com uma esquerda muito significativa e forte, com centrais sindicais robustas e movimento social capilarizado. As contradições, entretanto, são grandes. “A tática e estratégia da esquerda como força política no Brasil é só ganhar as eleições. Não vamos ficar mentindo para nós mesmos não. E isso dificulta a ideia de unidade da frente, porque nas eleições não temos unidade”, alega.
Ele também aponta como problema um déficit organizacional enorme. “No campo, nós temos hoje cerca de cinco milhões de sem-terra. E quantas organizações estão fazendo luta? O MST organiza 500 mil famílias. Mas e o resto? Temos que pensar como vamos organizar o nosso país de 200 milhões de habitantes. Porque votar na esquerda e se organizar pela esquerda são coisas diferentes”, destaca.
Outro problema fundamental para o militante é a falta de um projeto popular que sirva para unificar os diferentes campos. “Parte do campo progressista ainda se empolga com o neodesenvolvimentismo, incluindo aí o próprio Lula. A lógica dele ainda é a de fazer alianças com o capital, com os setores mais progressistas do capital, com parte da burguesia. E nada de um projeto popular”, criticou.
Ele defendeu maior comprometimento dos movimentos sindicais e sociais com a perspectiva da luta popular, e não apenas com questões corporativas, como a taxa de reajuste que será aplicada na data base ou mesmo a luta específica pela terra. “Temos que dar esse salto e transformar as lutas do movimento popular em lutas políticas. E como se faz isso? Bater no governo central é uma das tarefas mais urgentes agora. E bater no capital também. O nosso enfrentamento contra o capital não pode ter refresco”, defende.
Por fim, Rodrigues defendeu a elaboração de bandeiras que dialoguem com a realidade do povo. “É impressionante como a gente fala um palavrório que não dialoga com nossas massas. Fica panfletário e só atinge meia dúzia de militantes”, alertou. Tal como Boulos, ele também acredita que nenhuma frente vai avançar sem a retomada das lutas populares.
“Nós temos pela frente, como frente, muitos desafios. Mas eu acho que as frentes hoje que estão aí representam ainda a fragilidade de unidade que nós temos, fruto de todo esse processo histórico. Representam a dificuldade de termos unidade de projeto de longo prazo e de só conseguir ter uma síntese para as lutas táticas do dia-a-dia. Nenhuma frente das que estão aí tem condições de pensar o mês de janeiro. E isso é um problema”, alertou.
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