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Por Stella Calloni (prestigiada intelectual argentina) - da Agência Prensa Latina, de 02/09/2015
Buenos Aires - No momento em que se retomam as relações diplomáticas entre Estados Unidos e Cuba, sem dúvida um processo a longo prazo, como afirma o governo cubano, já que continua o bloqueio de mais de meio século, a ilegal permanência militar em Guantánamo e outros aspectos que afetam a soberania da ilha do Caribe, o governo estadunidense intensifica uma ofensiva contrainsurgente sobre vários países da região, que projeta mais sombras que luzes.
É impossível não duvidar de uma certa vontade de pôr fim a uma longa política terrorista para Cuba, que este país tem derrotado com uma resistência heroica, quando o secretário de Estado John Kerry hasteia a bandeira estadunidense reabrindo a embaixada em Havana no momento em que seu governo intensifica os ataques contra todos os governos progressistas da América Latina, que ajudaram a romper o cruel isolamento da ilha, que nunca deveria ter ocorrido.
De fato, foi altamente contraditório que em dezembro passado, quando se fez o anúncio da retomada de relações entre Cuba e Estados Unidos, o governo deste país ameaçasse duramente a Venezuela, e se tomassem medidas intervencionistas que esquentaram o clima na região.
Em 9 de março passado, o presidente Barack Obama declarou "emergência nacional" ante o que considerava uma "ameaça extraordinária e incomum à segurança nacional e à política exterior estadunidense" por parte da Venezuela.
Que Venezuela fosse uma ameaça à segurança dos EUA é incrível quando analisamos de onde parte tal acusação quando estudamos a situação, pois sabemos de todas as mentiras com as quais se começa uma ação ingerencista e intervencionista. Argumentos tão incríveis como este têm servido para as centenas de intervenções no mundo, e para as novas e genocidas guerras coloniais que se desenvolvem contra países irmãos no Oriente Médio, Ásia, Europa (Ucrânia).
O real deste momento é que vários governos da América Latina estão sob um ataque simultâneo de uma Guerra de Baixa Intensidade (GBI) que há tempos deixa seus rastros de "Golpes Brandos" mais fáceis de aplicar na Europa que em uma região que está tentando um verdadeiro processo de Integração emancipatória, com tudo o que isto significa.
A simultaneidade do ataque que se apresenta no Equador, Brasil, El Salvador, Bolívia, Argentina e Venezuela, especialmente, está desenvolvida para atingir a solidariedade, que sempre deve atuar rapidamente ante qualquer evento na região. Nestes momentos, cada país atacado está organizando suas próprias defesas e é evidente que resta força à reação solidária.
Isto, por uma parte, e pela outra Estados Unidos e seus sócios da direita em toda a América Latina, a mais dependente e financiada na história regional, estão atuando nestas desestabilizações simultâneas, para facilitar a "tarefa" nos planos de recolonização. Se conseguem dar o duro golpe em qualquer destes países, estimam que será mais fácil organizar um "efeito dominó" graças à "avançada golpista" já instalada em várias nações.
O ataque contrainsurgente produz-se com velhas e renovadas táticas e está castigando a Venezuela com todo tipo de guerra: econômica, psicológica (mirando golpes midiáticos diariamente), sabotagens, uma série de assassinatos de militares, camponeses militantes chavistas, escolta da segurança dos mais importantes funcionários governamentais, desabastecimento, infiltração de paramilitares colombianos. É um incremento notável no marco de todas as tentativas golpistas que têm deixado dezenas de vítimas e destruição nesse país. Não pode ser descartada a infiltração de comandos de Forças Especiais estadunidenses, que têm sua sede nas bases militares e estabelecimentos dos Estados Unidos na Colômbia. E todos sabemos o que são essas Forças Especiais. Sabem bem os povos vítimas de guerras coloniais em pleno século XXI.
Nestes últimos tempos e quando já se tem desgastado o tema dos chamados "presos políticos" venezuelanos, como se o governo de Nicolás Maduro e não os Estados Unidos fosse o maior violador dos direitos humanos em nossa região e no mundo, agora giram para o tema da quente fronteira colombo-venezuelana, com uma incendiária campanha midiática, mentindo descaradamente, colocando o agressor como vítima, uma vez mais.
O fechamento da fronteira em Táchira (estado que faz fronteira com a Colômbia) e o decreto de estado de exceção decidido pelo governo do presidente Maduro, no dia 20 de agosto passado, é um necessário ato de defesa de um país que praticamente desde o fracassado golpe de Estado em abril de 2002 até hoje é vítima de um esquema de golpismo eterno, que se intensificou de forma desmedida quando a morte do comandante Hugo Chávez Frias, em março de 2013, criou expectativas falsas de se conseguir render facilmente a Venezuela.
Toneladas de alimentos que foram escondidos, roubados, em uma ação de fato terrorista, pelos setores opositores, empenhados em derrubar Nicolás Maduro, têm passado por essa fronteira, por onde também entram os grupos paramilitares colombianos, que estão vinculados há anos a todas as tentativas violentas que se deram na Venezuela.
No mesmo momento em que foi decretado o fechamento da fronteira com a Colômbia e o estado de exceção em vários municípios de Táchira, por onde transcorria dia após dia o saque de gasolina, alimentos e outros artigos em um caso de contrabando para contribuir para o desabastecimento e o caos, ajudando a oposição golpista da Venezuela, começou o ataque opositor e midiático.
Sabe-se agora que grupos paramilitares formavam sociedades para tornar mais efetivo "o trabalho" de apoio ao golpismo, inclusive uma suposta "cooperativa" colombiana que negociava com o Mercal venezuelano, uma instituição de bem social, era de paramilitares desse país, disfarçados de cooperativistas.
A Venezuela teve paciência mais que suficiente, pois o governo venezuelano já havia comunicado ao governo da Colômbia sobre estes graves acontecimentos.
Imediatamente após o fechamento da fronteira em diversos pontos de Táchira, onde as forças armadas bolivarianas descobriram esconderijos do paramilitarismo e até um lugar onde os chamados "paracos" colombianos administravam o tráfico de pessoas, entre outros crimes, foi ativada a oposição e o parajornalismo dos grandes meios de comunicação da região.
Montaram um cenário de violência contra cerca de um milhar de pessoas que estavam ilegalmente nestes lugares, onde se camuflava o paramilitarismo... A difusão de rumores e notícias falsas estendeu-se em segundos, sem esclarecer que na Venezuela há mais de 5 milhões e 600 mil colombianos que fugiram da violência e do terror em seu país, bem como da pobreza, e estão integrados e protegidos pelas leis nacionais, muitos dos quais participaram nas marchas populares de apoio ao governo de Maduro.
NADA É NOVO
Já em 2012, o jornalista Raúl Bracho havia adiantado uma denúncia que hoje poucos recordam. Comparava a situação na Venezuela com o ocorrido na Síria, relembrando como infiltraram os mercenários disfarçados de Exército Livre da Síria, sob o comando da OTAN, que têm matado milhares e milhares de sírios, destruído cidades, infraestruturas, utilizando armas fornecidas pelos Estados Unidos, e Israel, especialmente. Estes dois países e a Grã-Bretanha criaram o chamado Exército Islâmico, infiltrando efetivos destes mercenários de 80 países do mundo, disfarçados de islamitas, pelas zonas fronteiriças.
Argumentando que vão combater seus próprios mercenários, destroem as infraestruturas como se viu na Síria e também os patrimônios da humanidade nesses países para apagar toda a história e memória cultural.
Bracho havia advertido nesse momento, que uma "oposição que se sabe derrotada contratará os mercenários de (Álvaro) Uribe para criar um massacre próximo da fronteira com a Colômbia e bem alertas devemos estar para impedi-los".
Nestes últimos dias, após encontros entre as chancelarias de ambos países, autoridades colombianas comprovaram que não houve os maus tratos que difundiram os meios de imprensa do poder hegemônico.
Na Argentina, se alguém quer saber por onde virá o ataque midiático contra a Venezuela, basta procurar "Infobae" para saber. Ou os diários Clarín e La Nación e seus repetidores.
Nestas horas tentam jogar mais lenha na fogueira, que está ardendo desde a semana passada. "Nicolás Maduro expulsa colombianos e também debocha deles. O presidente venezuelano dançou "La Pollera Colorá" durante a marcha chavista para respaldar as deportações em massa do regime. A cumbia é um símbolo na Colômbia e muitos consideram-na o segundo hino do país". Isso dizia Infobae.
Leia-se nas entrelinhas: "Maduro pisoteia o hino do país irmão". Falta algo mais para saber por onde vem a linha de Washington e a guerra entre irmãos que há muito tempo sonha o ex-presidente Álvaro Uribe Vélez?
Na "frente de batalha" do lado colombiano, Washington tem o agora senador Álvaro Uribe - que deveria estar na prisão pelos crimes de lesa humanidade que cometeu em seu país - amparando o paramilitarismo, que é sua "melhor" base política. No fim de 2011, Uribe criou em Washington a Fundação Internacionalismo Democrático que preside, na tentativa de estar à frente de um movimento de extrema-direita a nível continental.
Também foi promotor da criação da Fundação UnoAmérica na Colômbia no fim de 2008, reunindo os mais atuantes entre os ex-militares e policiais das ditaduras latino-americanas, para trabalhar infiltrando-se nas forças policiais e militares e ativá-las contra os governos progressistas. Já mostraram sua efetividade em Honduras, onde o presidente golpista desse país, Roberto Micheletti, condecorou o presidente da UnoAmérica.
Nada menos que o venezuelano Alejandro Peña Esclusa, envolvido em ações terroristas na Venezuela e na tentativa de assassinar o falecido presidente Hugo Chávez.
E mais ainda, Leopoldo López, que em 2014 encabeçou outra tentativa golpista contra o governo do presidente Maduro e o Partido Socialista Unificado Venezuelano (PSUV), anunciando que se manteria nas ruas até derrubar o presidente, havia mantido uma reunião com Uribe, já presidente da Fundação, que pretende liderar o golpismo em toda a região, financiado pela CIA estadunidense.
Essas são as baterias para a guerra suja ativadas na fronteira colombo-venezuelana. Menos de uma semana após a medida tomada pelo presidente Maduro, encontraram-se 70 toneladas de alimentos já preparadas para serem enviadas à Colômbia; e o vice-presidente Jorge Arreaza também confirmou que em horas se reduziram as filas em Táchira para conseguir gasolina e apareceram alimentos nos supermercados.
O presidente Maduro propôs a criação de uma Comissão sul-americana pela verdade na fronteira. "Como há tanta manipulação, eu vou propor que se estabeleça de maneira paritária uma comissão sul-americana da verdade que venha ver a situação fronteiriça da Venezuela com a Colômbia, que venha ver a situação do paramilitarismo, do narcotráfico, da guerra econômica e que venha dizer a verdade que não quer dizer nem a CNN, nem a Caracol (grupo de comunicação da Colômbia), nem muitos meios internacionais", enfatizou.
Uma grande manifestação de venezuelanos e colombianos que vivem na Venezuela tornou evidente a mentira dos meios de comunicação e das oposições, que têm recebido milhões de dólares das fundações estadunidenses, transformadas em forças especiais de desestabilização em todos os nossos países.
O que é urgente e necessário é que a América Latina e o Caribe implementem as medidas necessárias e respondam à "simultaneidade" operante dos poderes imperiais, com a solidariedade simultânea dos povos nuestroamericanos. "Sim nós podemos".
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