(Foto: Reprodução) |
Uma recente pesquisa revelou que 87% das pessoas que são atendidas pelos
médicos cubanos elogiaram a atenção e a qualidade do atendimento; Na média, a
nota recebida pelos profissionais estrangeiros foi 9.
Por Erikson Walla, de Salvador-Bahia – reproduzido do Portal Vermelho, de 04/09/2015
Unidade de Saúde da Família de Cajazeiras XI, manhã da última
segunda-feira de agosto. Uma escada estreita leva ao pouco iluminado 1º andar,
onde está um dos cômodos mais procurados no local: o consultório de número 5. A
porta branca da sala, fechada até 2013, é aberta, desde então, muitas vezes ao
dia. Observa-se, porém, um intervalo de tempo significativo entre um girar de
maçaneta e outro. Neste ínterim de abre-fecha-abre-fecha, com quase nenhuma
variação, a cena se repete: após a saída de um paciente, um homem pardo e de
meia idade surge, sorridente, de prontuário na mão, para um sonoro anúncio de
quem é que será o próximo a entrar. O nome de quem anuncia está em uma placa
fixada na frente da porta: “Dr. Rafael – Médico”.
A fila, do lado de fora da sala, é grande. À espera está a vendedora Eurides Silva, de 26 anos, que soube da boa fama do médico e resolveu tentar uma consulta com ele. Queria falar do seu problema na tireoide. Como não havia marcado previamente, esperou todos terminarem para ir pedir um atendimento extra a Rafael. E conseguiu. O médico parecia não se importar com os poucos minutos que faltavam para a hora do almoço. Com o mesmo sorriso, abriu a porta para Eurides e para, pelo menos, mais três outras pessoas que, certamente, não arredariam dali sem conseguir falar com ele. “Normalmente, eu tenho que ‘brecar’ e pedir às pessoas pra voltar depois”, afirma Elzanete Mangueira, gerente da unidade de saúde.
Elza, como é mais conhecida, não diz com um tom autoritário. A intromissão nos atendimentos do médico é cordial e é uma maneira de tentar poupá-lo de uma excessiva carga de trabalho, até porque, na unidade, há mais outros três médicos. “Aqui, temos uma cota para determinados atendimentos. Dr. Rafael, por exemplo, deveria atender por dia 14 pacientes e mais três ou quatro emergências, mas, se deixar, ele atende muito mais. Ele não atende pela agenda, mas pela necessidade do paciente. Ele não quer deixar voltar, mas a gente sabe que isso nem sempre é possível porque é humanamente impossível um médico atender a 20 ou 30 pessoas em um dia. Se deixar, ele atende”, completa a gerente.
O que justifica a fama e a grande procura pelo médico não são os atendimentos extras, mas o que acontece lá dentro da sala, quando a porta se fecha. Com a cadeira do paciente posta ao lado da mesa, Rafael cria um clima favorável à proximidade e à intimidade com quem o procura. Durante a consulta, ouve mais do que fala. Quer saber dos pacientes como é a alimentação, qual o histórico médico da família, qual o modo de vida que leva. Pega na mão, toca o rosto, examina minuciosamente. Na vez de Eurides, pegou um bloco de papel e uma caneta e desenhou a glândula da tireoide para mostrar à vendedora. Ele queria que ela entendesse o funcionamento do sistema endócrino e como o problema na tireoide se desenvolveu. Eurides entendeu direitinho e saiu encantada. “Os outros [médicos] nunca fizeram como ele”, declarou.
Dr. Rafael, de sobrenome Villa, é cubano. Chegou ao Brasil em 2013, junto à primeira turma que partiu de Cuba para a missão de integrar a etapa inicial do programa ‘Mais Médicos’, do Governo Federal brasileiro. A iniciativa surgiu diante do grande déficit de profissionais de medicina no país, com o objetivo de ampliar emergencialmente o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), principalmente nos rincões do Brasil, e investir na formação de novos profissionais. Naquele período, o Ministério da Saúde (MS) revelou que faltavam 54 mil médicos no Brasil. A média era de 1,8 profissionais para cada grupo de mil habitantes. Para efeitos comparativos, a média da Inglaterra era de 2,7 para mil, segundo o MS.
A recepção não foi boa. Rafael e os conterrâneos chegaram sob vaias e protestos, principalmente vindos de colegas, médicos brasileiros. Um dos episódios mais tensos aconteceu na chegada a Fortaleza (CE), quando um grupo dos profissionais locais chamou os cubanos de ‘escravos’ e ‘traidores’. Em Salvador (BA), onde Rafael desembarcou, a recepção foi calorosa, houve até um grupo de apoio, mas as notícias do que acontecia em outras cidades chegavam aos ouvidos de todos. “Foi algo muito ruim. Somos tão médicos como eles e não viemos aqui para tomar postos de trabalho. Viemos ajudar a todos, em função da precariedade da saúde brasileira, que está muito necessitada”, contou o cubano, ao lembrar da chegada.
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