O Netflix opera no país sem nenhum tipo de regulação (Foto: Correio do Brasil) |
Se há um lugar onde o conceito de revolução
permanente pode ser aplicado plenamente é o do desenvolvimento da tecnologia da
informação.
Por Theófilo
Rodrigues – do Rio de Janeiro – reproduzido do jornal digital Correio do Brasil, de 30/08/2015
Mal a
sociedade brasileira teve tempo de comemorar a aprovação do Marco Civil da
Internet em 2014 – legislação pioneira em todo mundo e elogiada até pela ONU –
um novo desafio se impôs: a regulação do mercado Over-The-Top (OTT) e seus
vídeos sob demanda (on demand).
Para quem
não está acostumado com a gramática digital, o mercado OTT é aquele que oferece
a entrega de conteúdo audiovisual pela internet como Whatsapp, Skype, Youtube e
Netflix entre tantos outros.
Os
maiores interessados em pressionar por alguma regulação nesse setor são as empresas de telecomunicações. Essas empresas já perceberam
que com a expansão da banda larga de qualidade não demorará muito para seus
clientes migrarem de vez para essa nova forma de comunicação.
O
argumento central das telefônicas é o de que essa concorrência com Whatsapp e
Skype reduzirá a quantidade dos empregos existentes no setor no Brasil. O
debate é certamente relevante, contudo, é certo também que as operadoras de
telefonia precisarão se adequar a essa nova realidade.
A questão
regulatória que urge não é exatamente essa, mas sim a que diz respeito ao
conteúdo dos serviços sob demanda. Serviços como o Netflix oferecem conteúdos
que não passam por nenhum tipo de controle do Estado brasileiro.
Por
óbvio, não se trata de falarmos em controle do conteúdo por parte do Estado
como se fosse censura. A questão é outra.
Basta
lembrarmos o controle já existente nos dias de hoje sobre o conteúdo das TVs
por Assinatura. Formulada e estimulada pela ANCINE – sob forte protagonismo de
seu presidente Manoel Rangel – a Lei 12.485 de 2011 passou a obrigar todos os
canais das TVs por Assinatura a terem uma cota de conteúdos nacionais em sua
grade semanal. Com isso a ANCINE conseguiu estimular toda uma rede de produção
independente do audiovisual brasileiro, além de propagandear nossa própria
cultura que antes não encontrava seu espaço. Há cinco anos atrás era dificílimo
encontrar um filme brasileiro na televisão por assinatura. Graças à Lei 12.485
hoje podemos assistir a qualquer momento algum canal que esteja passando um
filme nacional.
Agora é
chegada a hora da ANCINE propor e estimular o debate sobre uma nova legislação.
Dessa vez impondo a cota nacional em determinados serviços de audiovisual on
demand do mercado OTT. Em outras palavras, obrigar o Netflix, por
exemplo, a ter uma determinada quantidade de filmes ou seriados brasileiros em
sua programação.
Uma
legislação desse tipo não seria nenhuma jabuticaba. Pelo contrário, já existe
em países da Europa como Espanha e França. Agora é a vez do Brasil também
mostrar que seu braço regulatório é soberano e não mera marionete do mercado.
Claro, as
críticas certamente virão. A última edição da revista Veja já
deu alguns sinais dos ataques que virão. De acordo com Veja “o
ranço nacionalista da Agência Nacional de Cinema volta-se para os
serviços on demand”. Ainda segundo Veja, esse ranço
nacionalista “não deixa de ser uma prova de coerência ideológica” por Manoel
Rangel ser filiado ao PCdoB.
O bom
combate vai começar. Assim como já ocorreu com a Lei 12.485 a sociedade civil
brasileira e o Congresso novamente saberão reconhecer a importância da
soberania nacional sobre os meios de comunicação. Para o desgosto de alguns
poucos liberais que gostariam de morar em Miami.
Theófilo
Rodrigues é
cientista político.
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