(Foto: Presidência do Equador) |
Houve um empate de 33 X 2, diz o
articulista ao comentar que a VII Cúpula das Américas ficou sem um documento
final. Entre os motivos da falta de consenso entre os 33 países e os 2 do norte
(Estados Unidos e Canadá), um se destaca pela aberração desumana parida do
ventre do capitalismo: os 2 do norte se opuseram que a saúde fosse considerada
um direito humano.
Por Aram Aharonian (jornalista uruguaio que vive na Venezuela) –
colunista do portal Nodal – Notícias da
América Latina e Caribe, de 13/04/2015
Os mandatários
latino-americanos aproveitaram a presença de seu par estadunidense Barack
Obama, para criticá-lo com dureza pela política que seu governo exerce sobre os
países da região. O presidente boliviano responsabilizou Washington pelo fato
da sétima Cúpula das Américas, no Panamá, ter concluído sem um documento final.
“Lamento muito denunciar ao mundo inteiro que não é possível que o governo dos
Estados Unidos, com algum país, deixe este encontro sem um documento, sem uma
resolução”, esclareceu Evo Morales.
O certo é
que houve um empate de 33 X 2. Os chanceleres dos 33 países da América Latina e
do Caribe, com a prévia aprovação de seus chefes de Estado, estiveram de acordo
com a aprovação do documento, mas os dois do norte, EUA e Canadá, disseram que
não, pois opinavam que a saúde não é um direito humano, tinham reservas com a
transferência tecnológica (cobram por isso a nossos países) e que não se devia
exigir a revogação das sanções dos EUA contra a Venezuela. Não se pode aprovar
porque segundo as normas da OEA devia haver consenso. Por isso foi um empate de 33
X 2.
O
presidente venezuelano, Nicolás Maduro, Evo Morales e seu par equatoriano
Rafael Correa fizeram finca-pé nas sanções econômicas impostas à Venezuela e na
ingerência que os Estados Unidos exercem sobre os países da região. A
presidenta argentina Cristina Kirchner também criticou o decreto estadunidense
que declara a Venezuela como uma ameaça para a primeira potência mundial, ao
que chamou “uma insensatez e uma pena”.
Pouco
antes de se iniciar o encontro, os Estados Unidos procuraram “aliviar” a tensão
existente pelo decreto firmado por Obama dizendo que “a Venezuela constituía um
perigo para a segurança dos Estados Unidos”. Thomas Shannon, delegado de Obama,
se reuniu com o presidente da Venezuela para lhe dizer que “os Estados Unidos não
acreditam que a Venezuela represente uma ameaça à nossa segurança nacional”,
negando o substancial do mencionado decreto.
A firmeza
com que responderam os povos e vários governos da região e as 11 milhões de assinaturas
de venezuelanos pedindo a anulação do dito decreto motivaram esse “retrocesso
tático” – possivelmente circunstancial - da diplomacia estadunidense.
Para a imprensa
hegemônica, o mais importante foi a foto da “conversa informal” de Raúl Castro e
Barak Obama, após 56 anos de “divórcio” entre ambos os países. O futuro o
anunciava assim o mandatário cubano: Estamos dispostos a discutir tudo. Mas
para avançar vamos necessitar de paciência, muita paciência. De algumas coisas
poderemos nos persuadir. De outras não.
O chanceler
cubano Bruno Rodríguez analisa que ambos os países entendem o processo de
normalização plena da relação em duas etapas. A primeira compreende a exclusão
de Cuba da lista de organizações terroristas, segundo a visão do governo de
Washington, e a normalização dos serviços bancários do escritório de interesses
de Cuba nos EUA, bloqueados desde o ano passado.
A segunda
etapa terá que abordar a suspensão do bloqueio comercial, a abertura de embaixadas
nas duas capitais, o fechamento da base militar de Guantânamo, e medidas
concretas para que os EUA deixem de promover mudanças internas na vida política
de Cuba. O chanceler afirmou que haverá uma segunda rodada presidencial de
negociações… “breve, muito breve”. O demais, são fogos de artifício.
“Não
queremos mais doutrinas Bush. Deixe de lado os discursos de dupla moral para o
passado. Deixe de lado as ameaças, as chantagens, as pressões que se disparam a
partir do Capitólio ou da Casa Branca sobre nossos governos”, pediu Morales a
Obama ao finalizar seu discurso.
Correa
também celebrou a presença de Cuba no foro e as negociações de aproximação
diplomática com os Estados Unidos. No entanto, também reparou que “ainda está
pendente o desumano bloqueio comercial e a devolução do território de Guantânamo”,
enfatizou.
Estados Unidos perderam o controle
Como remate, fica claro que Washington já não é quem define a agenda latino-americana e caribenha, mesmo que ainda possa condicioná-la. Na verdade já não somos os mesmos de 21 anos atrás, quando em dezembro de 1994, o lindinho Bill Clinton anunciava na primeira Cúpula das Américas, em Miami, que todos os países do continente (e para nosso bem) devíamos fazer parte da ALCA…
Como remate, fica claro que Washington já não é quem define a agenda latino-americana e caribenha, mesmo que ainda possa condicioná-la. Na verdade já não somos os mesmos de 21 anos atrás, quando em dezembro de 1994, o lindinho Bill Clinton anunciava na primeira Cúpula das Américas, em Miami, que todos os países do continente (e para nosso bem) devíamos fazer parte da ALCA…
Faz duas
décadas, aproveitando o colapso do modelo soviético, começou a impor a hegemonia
do livre mercado – sob sua única liderança -, como único modelo possível para seu
quintal, num caminho irreversível. O modelo incluía a submissão econômica,
política e também militar. Nesse 1994, Clinton ordenou uma revisão dos centros
de Inteligência, controle e comando envolvidos em operações anti-narcotráfico e
estabeleceu três Forças de Tarefa Conjunta entre Agências: Oeste, Leste e Sul.
Porém
começaram as mudanças latino-americanas, com Hugo Chávez como locomotiva. Em
2001, ele deixava claro na declaração final da Cúpula de Quebec que se opunha à
ALCA. E nas ruas de todo o mundo ocidental começavam a crescer as manifestações
anti-globalização. Em 2005, em Mar del Plata, foi o surpreendente? NÃO à ALCA, pelas
mãos de Chávez, Lula, Kirchner.
Talvez depois
desta cúpula de 2015 se poderá medir o quanto se avançou na integração política
dos países latino-americanos e do Caribe, e em que medida a região se safou da
subordinação ao polo de poder representado pelos EUA, na perspectiva de um
esquema novo de cooperação baseado na independência, na soberania nacional e
regional e na multipolaridade.
A guerra por todos os meios de comunicação
A cúpula foi expressão da nova dinâmica geopolítica regional, e também os meios de comunicação convertidos numa espécie de outro cenário de guerra, em ferramentas da guerra cultural e política. Nestas batalhas, os blocos políticos em pugna se polarizam e definem os movimentos do exército de veículos de imprensa que cada um dispõe.
A cúpula foi expressão da nova dinâmica geopolítica regional, e também os meios de comunicação convertidos numa espécie de outro cenário de guerra, em ferramentas da guerra cultural e política. Nestas batalhas, os blocos políticos em pugna se polarizam e definem os movimentos do exército de veículos de imprensa que cada um dispõe.
Assim
apareceu o bloco “progressista” silenciado e diminuído midiaticamente, por um
lado, e pelo outro, a overdose informativa proveniente do bloco hegemônico do
“oficialismo” da cúpula, acoplado às razões dos EUA, o que ficou evidente sobretudo
nas escaramuças prévias à cúpula em si.
A
cobertura das chamadas cúpulas Empresarial e dos Povos respondeu a esta batalha.
A Empresarial gozou do favoritismo e atenção do bloco midiático hegemônico, com
a ativa participação do aparato oficial espanhol (incluindo a agência Efe), gerando
na opinião pública essa sensação de não estar informada apesar de tantos meios
de comunicação.
A “Cúpula
dos Povos, Sindical e dos Movimentos Sociais de Nossa América” foi submetida a
uma descarada desinformação que é expressão aberta do desprezo pelos povos,
analisa a socióloga Maryclén Stelling. Ante tal desproporção informativa, tal
como afirmara Dominique Wolton quando da primeira Guerra do Golfo (1991), “Nunca
houve numa guerra tantos meios de comunicação implicados e nunca a opinião
pública teve tanta sensação de não estar informada… Nunca tanta demanda de
informação… Nunca tantos ruídos de desinformação…”.
Tradução: Jadson Oliveira
Comentários