Chargistas
de todo o mundo expressaram o repúdio ao atentado nas redes sociais (Página/12)
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Resulta repugnante narrar tanta
imoralidade e hipocrisia. Sobretudo se se recorda a cumplicidade dos que agora arrancam
os cabelos e não fizeram absolutamente nada para deter o genocídio perpetrado há
poucos meses em (Faixa de) Gaza.
Por Atilio A. Boron (*), cientista político argentino – no jornal Página/12, edição impressa de hoje, dia
8 (os parágrafos estão dispostos por conveniência de edição deste blog)
O atentado terrorista perpetrado na redação do semanário francês Charlie Hebdo deve ser condenado sem atenuantes. É um ato brutal, criminoso, que não tem justificativa alguma. É a expressão contemporânea de um fanatismo religioso que – desde tempos imemoriais e em quase todas as religiões conhecidas – tem infestado a humanidade com mortes e sofrimentos indizíveis.
Os
políticos e governantes europeus e estadunidenses se apressaram a manifestar seu
repúdio ante a barbárie perpetrada em Paris. Mas parafraseando um grande
intelectual judeu do século 17, Baruch Spinoza, diante de tragédias como esta não
temos que chorar e sim compreender. Como dar conta do acontecido? A resposta não
é simples porque são múltiplos os fatores que a precipitaram.
Não foi a
obra de um grupo de fanáticos que, num inexplicável rompante de loucura
religiosa, decidiram aplicar um castigo exemplar a um semanário que se permitia
criticar certas manifestações do Islã. Esta conduta deve ser interpretada num
contexto mais amplo: o impulso que a Casa Branca deu ao radicalismo islâmico
desde o momento em que, produzida a invasão soviética no Afeganistão, a CIA
determinou que a melhor maneira de rechaçá-la era estigmatizando os soviéticos
por seu ateísmo e potencializando os valores religiosos do Islã. A Agência (de
Inteligência dos EUA) era nesse momento dirigida por William Casey, um
fundamentalista católico, e sob a administração (Ronald) Reagan teve a seu
cargo a promoção, treinamento e financiamento da Al Qaida, sob a liderança de
Osama bin Laden.
Quando em
2011 se consumou o fracasso da ocupação norte-americana no Iraque, Washington
intensificou seus esforços para estimular as guerras sectárias dentro do país,
com o objetivo de debilitar os xiitas, aliados do Irã, e que controlavam o governo
iraquiano. O resto é história conhecida: recrutados, armados e apoiados
diplomática e financeiramente pelos Estados Unidos e seus aliados, os radicais
sunitas terminaram se tornando independentes de seus promotores, como antes o
havia feito Bin Laden, e deram nascimento ao Estado Islâmico e suas gangues de
criminosos que degolam e assassinam infiéis a torto e a direito. Em seu afã por
desarticular os países do Oriente Médio, o Ocidente aviva as chamas do
sectarismo religioso.
Por isso
a gênese deste crime é evidente, e os que promoveram o radicalismo sectário não
podem agora proclamar sua inocência diante da tragédia de Paris. Horrorizados pela
monstruosidade do gênio que lhes escapou da garrafa o 11-S (11 de setembro de
2001 – atentado das Torres Gêmeas), em sua criminosa estupidez declararam uma
guerra silenciosa contra o Islã em seu conjunto.
E seus
pupilos respondem com as armas e os argumentos que lhes foram dados desde os anos
de Reagan. Aprenderam depois com os horrores perpetrados em Abu Ghraib (prisão
estadunidense em Guantânamo) e os cárceres secretos da CIA; com as matanças
perpetradas na Líbia e o linchamento de Khadafi, recebido com uma gargalhada
por Hillary Clinton, e pagam com a mesma moeda. Resulta
repugnante narrar tanta imoralidade e hipocrisia. Sobretudo se se recorda a cumplicidade
dos que agora arrancam os cabelos e não fizeram absolutamente nada para deter o
genocídio perpetrado há poucos meses em (Faixa de) Gaza. Claro, dois mil
palestinos, várias centenas deles crianças, são nada em comparação com 12
franceses.
* Diretor do Centro Cultural da Cooperação
Floreal Gorini.
Tradução: Jadson Oliveira
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