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Recentemente, Gregory Marra repetiu no New York Times o refrão dos tecnólogos segundo o qual a tecnologia é neutra, porque não faz julgamento editorial sobre o conteúdo postado nas redes sociais. Pois é justamente aí que mora o perigo, diz Emily Bell.
Por Luciano Martins Costa, no site Observatório da Imprensa, de 02/12/2014
As empresas de jornalismo estão perdendo o controle do que é notícia. O
domínio de empresas de tecnologia na produção e distribuição de
conteúdo informativo e opinativo está criando uma nova esfera pública,
cujos controladores não estão especialmente preocupados com
transparência e ética.
Esse é o tema de publicações recentes sobre a maneira como a mídia
tradicional ajuda, por omissão, a consolidar no mundo contemporâneo o
poder quase absoluto dos tecnólogos que inundam o planeta com uma
enxurrada ininterrupta de aplicativos cujas possibilidades as pessoas
desconhecem. Uma das análises mais interessantes é feita por Emily Bell,
diretora do Centro Tow de Jornalismo Digital, instituto de pesquisas da
Escola de Jornalismo da Universidade Columbia, e foi considerada pelo
Fórum Mundial de Editores como o mais importante texto sobre o futuro do
jornalismo divulgado neste ano (ver aqui,
em inglês, a versão editada para o Instituto Reuters, de Oxford,
publicada na terça-feira, 2/12). Sua principal qualidade está em marcar o
esvaziamento do poder do jornalismo em definir sua própria natureza.
Emily Bell observa que as principais decisões que impactam o espaço
público da comunicação estão sendo tomadas por engenheiros que raramente
pensam em jornalismo, em impacto social da informação ou na
responsabilidade sobre como notícias são geradas e disseminadas.
“Jornalismo e liberdade de expressão se agregaram como parte de uma
esfera comercial onde as atividades de notícias e jornalismo se tornaram
marginais”, alerta a pesquisadora.
Apontada como responsável pelo renascimento do grupo britânico Guardian,
do qual foi diretora de conteúdo digital, ela lembra também que nenhuma
das principais iniciativas tecnológicas que dominam o serviço de
relacionamentos e interações entre pessoas foi criado ou pertence a
empresas jornalísticas.
Como as plataformas de mediação social não estão interessadas em
contratar jornalistas ou criar estruturas para a tomada de “decisões
editoriais”, atividade altamente complexa e custosa – conclui –, o
espaço público fica à mercê dos interesses do mercado de tecnologia.
Onde mora o perigo
Emily Bell comenta que o Facebook usa um conjunto de complicadas
fórmulas para decidir como as notícias vão para o alto das páginas
pessoais dos usuários; esses mecanismos não apenas determinam o que o
indivíduo vai ver, mas também definem, pela constância do uso, o modelo
de negócio das plataformas sociais. Esses algoritmos são secretos, não
são alcançados pelas regulações que asseguram as liberdades básicas
inerentes ao direito à livre informação e à privacidade e, pior, podem
ser alterados sem aviso prévio.
A diretora do Centro Tow lembra que nenhuma outra plataforma na
história do jornalismo criou tal concentração de poder, o que faz do
jovem Gregory Marra um dos mais poderosos executivos do mundo. Ele é
diretor de produto do sistema de notícias do Facebook e tem apenas 26
anos de idade. Recentemente, Marra repetiu no New York Times o
refrão dos tecnólogos segundo o qual a tecnologia é neutra, porque não
faz julgamento editorial sobre o conteúdo postado nas redes sociais.
Pois é justamente aí que mora o perigo, diz Emily Bell.
Ainda que os engenheiros acreditem que não estão tomando decisões
editoriais, é isso que fazem suas fórmulas matemáticas. Por exemplo, ela
lembra, em junho deste ano pesquisadores registraram que o Facebook
manipulou as fontes de notícias de 700 mil usuários para observar como
diferentes tipos de informação poderiam afetar o humor das pessoas. A
resposta: boas notícias deixam as pessoas mais felizes. A questão dos
pesquisadores: como o Facebook ousa brincar, literalmente, com as
emoções das pessoas?
Em 2010, a rede social fez outra experiência, para verificar como a
inserção de notícias sobre eleição estimula pessoas a votar no sistema
americano de voto facultativo. Um professor de Harvard pondera que o
mesmo recurso pode convencer milhões de eleitores, por exemplo, a
escolher determinado candidato.
Emily Bell conclui o artigo alertando que o Facebook não tem obrigação de revelar como manipula o sistema de notícias. Ela afirma também que a imprensa tradicional deveria parar de se deslumbrar com as filas para comprar o novo iPhone e olhar mais para a tecnologia como um novo sistema de poder sem controle social.
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