ATILIO BORON: ESTADOS UNIDOS, LONGE DA INDEPENDÊNCIA ENERGÉTICA



Atilio A. Boron (Foto: Internet)
A dependência energética dos Estados Unidos continuará sendo muito elevada, e talvez crescente em função da evolução da demanda doméstica, e isto reforçará as tendências belicistas do império.

(Tal situação indica que) a Casa Branca redobrará sua ofensiva sediciosa e destituinte sobre a Venezuela bolivariana, potencializando seu apoio logístico, financeiro, organizativo e midiático a seus peões no país.

Por Atilio A. Boron (*), sociólogo argentino, no jornal Página/12, edição de ontem, dia 29

Tal como vários na América Latina temos dito no decorrer de pelo menos dois anos, uma matéria do jornalista especializado Louis Sahagun, publicada em 20 de maio no Los Angeles Times (http://www.latimes.com/business-/ la0-fi-oil-20140521-story.html), afirma que “em 2011 uma empresa independente contratada por Washington (se trata da consultora de engenharia Intek, com sede em Virgínia) fez uma errônea estimativa do petróleo tecnicamente recuperável da maior jazida de xisto betuminoso do país, localizada em Monterrey, Califórnia, que contém ao redor de dois terços das reservas de petróleo de xisto da nação. Segundo aquela estimativa, se poderiam obter uns 13,7 bilhões de barris de petróleo. No entanto, um recente informe assegura que a quantidade não será maior do que 600 milhões de barris, quer dizer, uma quantidade 96% menor do que o esperado” (e que, como assinala a publicação especializada Business Insider, equivale às reservas totais de petróleo da Bolívia). “Essa errônea estimativa de 2011 – prossegue o jornal – havia sido qualificada como a esperança para reduzir a necessidade do país de importar petróleo”.

A quantidade que agora reporta a EIA (a Agência de Informação de Energia dos Estados Unidos, vinculada ao Departamento de Energia do governo federal) é insignificante se se leva em conta que “somente poderia cobrir as necessidades energéticas nos EUA correspondentes a 33 dias”. Falando com benevolência: toda esta história foi uma fantasia estatística, produto tanto do desespero de Washington por lograr sua tão ansiada independência energética como da fenomenal inaptidão dos que elaboraram as estimativas iniciais e, por que não?, dos corruptos interesses de alguns grandes consórcios da indústria – em conluio com a consultora –, desejosos de facilitar a realização de operações especulativas no mercado petroleiro mundial. A independência energética dos Estados Unidos, que muitos acreditaram estar ali ao dobrar a esquina, atuou como um freio sobre o preço do petróleo, possibilitou aquisições baratas de ativos petroleiros no exterior, desvalorizados ante as perspectivas abertas pelo citado informe, e se prestou a todo tipo de especulações. Mas agora a festa terminou. Tal como declara J. David Hughes, um geólogo representante do Post Carbon Institute, o xisto de Monterrey “foi sempre ‘una mítica veta madre’ (NT: expressão duma letra de música que dá o sentido de sonho/miragem), cuja importância foi inflada pela indústria petroleira; nunca existiu”.

A íntima relação que o capitalismo atual estabeleceu entre petróleo, política e guerra permite extrair quatro conclusões preliminares.

Primeiro, que a dependência energética dos Estados Unidos continuará sendo muito elevada, e talvez crescente em função da evolução da demanda doméstica, e que isto reforçará as tendências belicistas do império para tratar de assegurar a obtenção do petróleo que necessita através de qualquer meio, de qualquer preço e em qualquer lugar. Não esquecer que desde o começo do século 20 as intervenções militares dos Estados Unidos em outros países tiveram como causas fundamentais o petróleo e as supostas ameaças à “segurança nacional” partidas de governos que não estavam dispostos a sacrificar sua autodeterminação nacional.

Segundo, que os planos para destruir a OPEP – um objetivo longamente acariciado por Washington desde 1973 – a partir do autoabastecimento petroleiro, terão que ser arquivados por muito tempo, talvez definitivamente, o que constitui um duríssimo revés para a política exterior dos Estados Unidos. A destruição da OPEP não era só um projeto econômico, mas também político, destinado a disciplinar os dissidentes produtores de petróleo e muito especialmente a Venezuela, cujo protagonismo no relançamento da OPEP foi decisivo no início deste século.

Terceiro, que de acordo com o dado anterior, a Casa Branca redobrará sua ofensiva sediciosa e destituinte sobre a Venezuela bolivariana, potencializando seu apoio logístico, financeiro, organizativo e midiático a seus peões no país, os quais são apresentados pela imprensa do império como uma “oposição pacífica”, quando na realidade são mercenários cuja missão é semear o caos, debilitar a ordem constitucional e provocar a queda do governo bolivariano. Dado significativo: das várias centenas de vândalos detidos pelas autoridades, os estudantes constituem apenas 20% e uma proporção igual está formada por estrangeiros, alguns dos quais nem falam espanhol. Diante das novidades publicadas por Los Angeles Times, é previsível um aumento da pressão desestabilizadora orquestrada por Washington.

Quarto, que as altissonantes declarações de Obama e Kerry no sentido de que forneceriam petróleo e gás à Ucrânia para facilitar que esse país seja incorporado pela OTAN e a União Europeia ficaram reduzidas a meras bravatas sem nenhum efeito prático. Desgraçadamente para Washington, o petróleo e o gás são encontrados cada vez com maior frequência em países que não estão dispostos a se porem de joelhos ante os ditames da Casa Branca. Portanto, seus suportes econômicos para operar na Ucrânia são frágeis e distantes, enquanto que o petróleo e o gás continuam sendo próximos e abundantes na Rússia.

* Diretor do PLED, Centro de Cultura da Cooperação.

Tradução: Jadson Oliveira

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