GABRIEL GARCÍA MÁRQUEZ: O ENIGMÁTICO HUGO CHÁVEZ



Considerado um dos escritores mais importantes do século 20, o colombiano Gabriel García Márquez nasceu em Arataca, em 1927, e teve destacada atuação como jornalista. O artigo que reproduz sua conversa com Hugo Chávez foi originalmente publicado na revista Cambio, em fevereiro de 1999, publicação da qual foi um dos proprietários. O autor de Cem Anos de Solidão, uma das obras mais lidas e traduzidas em todo o mundo, recebeu o Nobel em 1982 (Foto: Arquivo/EFE/Revista Samuel)
Durante voo entre Havana e Caracas, Gabriel García Márquez conversa com Hugo Chávez, recém-eleito presidente

[Reportagem de García Márquez, morto aos 87 anos, foi originalmente reproduzida na edição nº 9 da Revista Samuel, em maio de 2013]


Reproduzida da Revista Samuel, via o portal Opera Mundi, de 17/04/2014

Ao entardecer, Carlos Andrés Pérez desceu do avião que o trazia de Davos, na Suíça, e se surpreendeu ao ver na plataforma o general Fernando Ochoa Antich, seu ministro da Defesa. "O que est acontecendo?", perguntou-lhe intrigado. O ministro o tranquilizou, com argumentos tão confiáveis que o presidente não foi para o Palácio de Miraflores, e sim para a sua residência oficial, La Casona. 

Começava a dormir quando o mesmo ministro da Defesa o despertou por telefone para informá-lo de um levante militar em Maracay. Mal havia chegado a Miraflores quando explodiram as primeiras descargas de artilharia.


Era o dia 4 de fevereiro de 1992. O coronel Hugo Chávez Frías, com seu culto litúrgico pelas datas históricas, comandava o assalto de seu posto improvisado no museu histórico La Planicie. Pérez compreendeu então que seu único recurso era o apoio popular e se dirigiu aos estúdios da Venevisión para falar ao país. Duas horas depois o golpe militar tinha fracassado. Chávez se rendeu, com a condição de que também permitissem a ele dirigir-se ao povo pela televisão.
García Márquez com o líder cubano Fidel Castro (Foto: Arquivo/EFE/Revista Samuel)
O jovem coronel mestiço, com sua boina de paraquedista e seu admirável talento de orador, assumiu a responsabilidade pelo movimento. E seu discurso foi um triunfo político.


Cumpriu dois anos de prisão até ser anistiado pelo presidente Rafael Caldera. Entretanto, muitos partidários — e inimigos políticos — compreenderam que seu discurso da derrota foi o primeiro da campanha eleitoral que o levou à Presidência da República menos de nove anos depois.


O presidente Hugo Chávez Frías me contava essa história no avião da Força Aérea venezuelana que nos levava de Havana a Caracas, há algumas semanas. Havíamos nos conhecido três dias antes em Havana, durante sua reunião com os presidentes Castro e Pastrana, e a primeira coisa que me impressionou foi o poder que emanava de seu corpo de granito. Tinha a cordialidade espontânea e a graça mestiça de um autêntico venezuelano. Ambos tentamos nos ver outra vez, mas isso não fora possível devido aos compromissos; foi, portanto, no avião para Caracas que conversamos sobre sua vida e seus projetos.


Foi uma experiência enriquecedora para um repórter de folga. À medida que me contava sua vida, eu ia descobrindo uma personalidade que não correspondia em nada à imagem de déspota que tínhamos formado através dos meios de comunicação. Era outro Chávez. Qual dos dois seria o real?

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