Durante voo entre Havana e
Caracas, Gabriel García Márquez conversa com Hugo Chávez, recém-eleito
presidente
[Reportagem de García Márquez, morto aos 87 anos, foi originalmente reproduzida na edição nº 9 da Revista Samuel, em maio de 2013]
Reproduzida da Revista Samuel, via o portal Opera Mundi, de 17/04/2014
Ao entardecer, Carlos Andrés Pérez desceu do avião que o trazia de Davos, na Suíça, e se surpreendeu ao ver na plataforma o general Fernando Ochoa Antich, seu ministro da Defesa. "O que est acontecendo?", perguntou-lhe intrigado. O ministro o tranquilizou, com argumentos tão confiáveis que o presidente não foi para o Palácio de Miraflores, e sim para a sua residência oficial, La Casona.
Começava a dormir quando o mesmo ministro da Defesa o despertou por telefone para informá-lo de um levante militar em Maracay. Mal havia chegado a Miraflores quando explodiram as primeiras descargas de artilharia.
Era o dia 4 de fevereiro de 1992. O coronel Hugo Chávez Frías, com seu culto litúrgico pelas datas históricas, comandava o assalto de seu posto improvisado no museu histórico La Planicie. Pérez compreendeu então que seu único recurso era o apoio popular e se dirigiu aos estúdios da Venevisión para falar ao país. Duas horas depois o golpe militar tinha fracassado. Chávez se rendeu, com a condição de que também permitissem a ele dirigir-se ao povo pela televisão.
García Márquez com o líder cubano Fidel Castro (Foto: Arquivo/EFE/Revista Samuel) |
Cumpriu dois anos de prisão até ser anistiado pelo presidente Rafael Caldera. Entretanto, muitos partidários — e inimigos políticos — compreenderam que seu discurso da derrota foi o primeiro da campanha eleitoral que o levou à Presidência da República menos de nove anos depois.
O presidente Hugo Chávez Frías me contava essa história no avião da Força Aérea venezuelana que nos levava de Havana a Caracas, há algumas semanas. Havíamos nos conhecido três dias antes em Havana, durante sua reunião com os presidentes Castro e Pastrana, e a primeira coisa que me impressionou foi o poder que emanava de seu corpo de granito. Tinha a cordialidade espontânea e a graça mestiça de um autêntico venezuelano. Ambos tentamos nos ver outra vez, mas isso não fora possível devido aos compromissos; foi, portanto, no avião para Caracas que conversamos sobre sua vida e seus projetos.
Foi uma experiência enriquecedora para um repórter de folga. À medida que me contava sua vida, eu ia descobrindo uma personalidade que não correspondia em nada à imagem de déspota que tínhamos formado através dos meios de comunicação. Era outro Chávez. Qual dos dois seria o real?
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