"O FANTASMA DAQUELE HORROR TODO NUNCA SE FOI", DIZ ALDIR BLANC SOBRE A REEDIÇÃO DA "MARCHA DA FAMÍLIA"
"O Brasil precisa punir ou pelo menos desacreditar assassinos e torturadores. Fazer reforma agrária, melhorar a renda dos pobres, dinamizar Educação, Saúde e Transportes. Acabar com a apodrecida 'base de sustentação'”.
POR RODRIGO RODRIGUES, no Terra Magazine, postagem de hoje, dia 22
Compositor e escritor, Aldir Blanc Mendes é um nome que se confunde
com a luta pela Anistia aos exilados e presos políticos brasileiros,
vítimas das perseguições dos militares.
Sem pegar em armas nem fazer parte de nenhum grupo armado,
empunhando apenas violão e voz, esse médico psiquiatra carioca inspirou a
luta por Democracia no Brasil com versos.
Ao lado do amigo João Bosco, compôs aquela que vai ser para sempre
lembrada como a canção da liberdade, o hino da Anistia: “O Bêbado e o
Equilibrista”.
É a canção que narra o desejo de uma nação de tantas “Marias e
Clarisses”, que naquela época tiveram seus companheiros assassinados
pela repressão. (Maria, viúva de Manoel Fiel Filho, e Clarisse Herzog,
viúva de Vladimir Herzog)
36 anos depois de suplicar em poesia corajosa pela “volta do irmão
do Henfil" e de "tanta gente que partiu num rabo de foguete”, Aldir
Blanc assiste o retorno dos arroubos autoritários com a reedição da
“Marcha da Família com Deus, pela Liberdade” sem perplexidade e nem
surpresa:
"Não estamos "revivendo" nada, porque o fantasma de todo aquele
horror nunca se foi. Ninguém foi julgado ou condenado por tortura e
assassinato político. Um palhaço apareceu, durante a construção do
estátua de João Cândido, na Praça XV (Rio de Janeiro), e ameaçou: "Se
essa merda apontar para o Colégio Naval, a gente volta aqui e explode
tudo". "Esses criminosos estão por aí, foram promovidos”, pontua.
Irreverente, direto nas palavras e sem economizar adjetivos e bom
humor, Aldir Blanc lembra que, muito antes de provocação pública da
reedição da “Marcha…”, o Brasil já vinha assistindo diariamente o
despertar do ódio e das forças obscuras da repressão. Até dentro do
próprio Congresso, que deveria ser símbolo da Liberdade pública:
"O deputado Rosconaro (Jair Bolsonaro – sic) declarou que 'nosso
mal foi torturar demais e matar de menos'. É nesse pântano que vivemos.
Gorilas com próstatas do tamanho de melões se reúnem no Clube do Bolinha
para comemorar o golpe. Hoje mesmo, um ex-Coronel admitiu que os presos
da Casa da Morte, em Petrópolis, eram mortos, despedaçados e davam
sumiço nos restos em um rio da região serrana…”, lembra o compositor.
Aos 67 anos, o médico psiquiatra que tratou diversos presos e
familiares de desaparecidos diz que a fórmula para se livrar do que ele
chama de “fantasmas” está na revisão da Lei da Anistia e na retomada da
agenda inclusiva.
"O Brasil precisa punir ou pelo menos desacreditar assassinos e
torturadores. Fazer reforma agrária, melhorar a renda dos pobres,
dinamizar Educação, Saúde e Transportes. Acabar com a apodrecida 'base
de sustentação'”, diz o compositor, em referência ao PMDB e os demais
partidos fisiológicos que estão com os governos desde a retomada do
direito ao voto.
Sobram críticas indiretas de Aldir Blanc até para o PT e a
presidente Dilma Rousseff, por manter a governabilidade a qualquer custo
inventada por Sarney ao chegar ao poder, e repetida por FHC e Lula:
"(O Brasil) precisa parar de aparelhar ministérios com idiotas
burro-cratas do PCdoB – enfim, cumprir minimamente a agenda inicial dos
partidos de esquerda que parecem perdidos e aceitando essas merdas de
Bumbum Garoto ou Rosinha Escrota que apareçam para vencer a qualquer
preço”, analisa Blanc.
O fato de estar eternizado “O Bêbado e o Equilibrista” na história do País não muda nada, segundo Blanc.
A vontade de um Brasil melhor e justo, segundo o compositor, vale mais que qualquer lugar na memória de um povo:
"A eternidade sem chope e xoxota é uma boa merda, mas espero um
País melhor para meus cinco netos e um bisneto (até agora…). Não raro,
sinceramente, olho pra eles e tenho vontade de chorar. O que vem por aí
não é mole…”, conclui o bisavô que não costuma esconder a emoção, mesmo
36 anos depois, ao ouvir e lembrar o significado de “O Bêbado e o
Equilibrista” para o Brasil.
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