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ENTREVISTA COM ATILIO BORON
(parte 4/final)
“A liderança não significa
atropelar os demais países, mas criar um consenso para articular conjuntamente
um projeto, que dirige de forma coletiva, sem estabelecer relações sub-imperialistas”.
“Oxalá o Brasil assuma a
liderança do processo da unidade latino-americana, e assim o futuro da América
Latina será muito promissor. Porém, se não se der conta de quem é seu
verdadeiro inimigo, de quem está aí para impedir que o Brasil seja uma
verdadeira potência, então o futuro será muito duro para todos nós”.
Por Diego Diehl, de Buenos Aires (Argentina) – reproduzida do sítio do
jornal Brasil de Fato, com o título
“Nos falta um Brasil com visão continental”, postada em 10/01/2014. (Vai aqui
dividida em quatro partes; a primeira, que contém a introdução, foi publicada
no sábado, dia 11; a segunda, na segunda, dia 13; e a terceira, na quarta, dia
15; o título acima é deste blog).
Brasil de
Fato - Essa liderança brasileira não poderia ofuscar o papel que cumpre a
Venezuela no continente hoje?
Atilio
Boron - Certamente que não, pelo contrário. Chávez tinha isso muito claro, e a
imagem do “irmão maior” é do próprio Chávez. A liderança não significa
atropelar os demais países, mas criar um consenso para articular conjuntamente
um projeto, que dirige de forma coletiva, sem estabelecer relações sub-imperialistas.
Mas isso
depende de dirigentes competentes, esclarecidos e de esquerda, e com esta gente
não se pode fazer, pois os atuais estão a serviço do capital transnacional, e
nem mesmo do capital brasileiro. Mas outra classe de dirigentes poderia fazer.
Claro que há setores nacionalistas reacionários em outros países que podem se
ressentir, mas a maioria da população não vê isso como um problema.
As
eventuais rivalidades que possam ocorrer têm mais a ver com o fato de que a
Venezuela não trata de falar, mas de praticar a solidariedade internacional,
como no caso da Petrocaribe, que fornece petróleo a diversos países a preços
abaixo dos praticados no mercado. Enquanto isso, a Petrobras é uma empresa
tradicional, como a Shell, Exxon, etc. Portanto, que não tenham rivalidade com
a Venezuela, mas que tratem de aprender com essa generosidade venezuelana, e
também com a generosidade cubana. Os dirigentes brasileiros não têm sido
generosos: como entender a imposição de bloqueios pelos brasileiros ao arroz do
Uruguai? Quanto arroz o Uruguai poderia exportar para o Brasil? É um absurdo!
Se alguém almeja o papel de liderança, deve saber fazer concessões. Senão se
assume uma postura coercitiva.
Nossa
esperança, portanto, é que o Brasil compreenda este papel, e reconheça em
primeiro lugar que foi enganado de forma escandalosa pelos EUA. O Itamaraty
acreditou na promessa de um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU,
mas os estadunidenses não têm como garantir isso, já que os demais membros
também terão que aceitar a proposta. Ademais, esse assento não é algo
artificial, mas reflete as condições reais de força na política internacional,
e hoje, o Brasil não tem peso na política internacional. Todos estes países são
potências atômicas, têm grande grau de autodeterminação. A Índia e a China são
potências atômicas, fazem o que querem. O Brasil não faz o que quer. Oxalá o
Brasil assuma a liderança do processo da unidade latino-americana, e assim o
futuro da América Latina será muito promissor. Porém, se não se der conta de
quem é seu verdadeiro inimigo, de quem está aí para impedir que o Brasil seja
uma verdadeira potência, então o futuro será muito duro para todos nós.
A luta
brasileira é portanto uma luta latino-americana...
Sem
dúvida. Nós necessitamos disso. Imagine: temos a maior reserva petroleira do
mundo na Venezuela, e agora também no Brasil. Um continente com quase metade da
água doce de todo o planeta. Apenas na região entre o Brasil e a Argentina é
possível produzir alimentos para um bilhão de pessoas. Ou seja, todas as
condições estão dadas para isso, e para passar por cima da crise capitalista.
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