Martinelli, um dos dirigentes da CGT quando do golpe de 64 (Fotos: Jadson Oliveira) |
De
São Paulo (SP) – Na terça-feira, dia 1º., o Grupo de
Trabalho da Comissão Nacional da Verdade (CNV) fez um encontro, na capital
paulista, com dirigentes sindicais da época do golpe militar de 1964 dentro do
objetivo de apurar o massacre que representou a ditadura no sindicalismo
brasileiro. O auditório do Sindicato dos Engenheiros estava lotado de gente de
cabelos brancos, alguns na faixa de idade dos 80 e 90 anos.
É o caso, por exemplo, dos dois principais depoentes do
dia: Rafael Martinelli, 89 anos, e Clodismith Riani, 93 anos. Ambos foram da
direção do Comando Geral dos Trabalhadores, a famosa CGT, desmontada em 1964 pelos
golpistas militares, mancomunados com os empresários e latifundiários, com a cúpula
da Igreja Católica e, de modo geral, com as forças políticas da direita,
especialmente com a mídia hegemônica, além do império estadunidense.
A CGT e toda a estrutura sindical – confederações,
federações e sindicatos –, afinadas com o derrubado presidente João Goulart e
ligadas, em sua grande maioria, ao Partido Comunista Brasileiro (o PCB, chamado
o “partidão”, dirigido por Luiz Carlos Prestes), foram desmanchadas pela
repressão. Dirigentes sindicais foram presos, perseguidos, torturados, desaparecidos,
condenados e exilados.
Mesa com representantes das atuais centrais sindicais brasileiras |
Auditório do Sindicato dos Engenheiros estava lotado, a maioria gente de cabelos brancos |
Algumas das histórias desse massacre foram contadas ali,
envoltas em muita emoção e muitas lembranças. E fato memorável: muitos desses “velhinhos”
lutadores, resistentes contra a ditadura, continuam ainda hoje, 49 anos depois,
no front contra a direita, pela democracia, pelo socialismo.
Martinelli, apesar da idade, demonstrou grande vitalidade
e lucidez. Tocou em vários pontos, mas vou destacar apenas dois:
1 – Lamentou a falta de resistência ao golpe, do esperado
“dispositivo militar” de Jango que se revelou uma ilusão. (Acrescento eu:
ilusão que ajudou a disseminar o então “partidão”);
2 – Falou da sua descrença inicial na Comissão da
Verdade, por omitir a necessidade de punir os torturadores. Atualmente, porém,
ele acredita que a conscientização e mobilização em torno do trabalho da CNV levarão
a pressionar no sentido de que os repressores da ditadura respondam na Justiça
por seus delitos de lesa humanidade, como ocorre hoje, por exemplo, na vizinha
Argentina.
Falta
uma mobilização nacional
A tarefa da comissão, no entanto, parece ser gigantesca, muito
acima da viabilidade previsível diante da nossa realidade política e social. Requereria
muitos recursos e tempo: ouvir as vítimas e/ou testemunhas, investigar, ouvir o
lado dos verdugos. A advogada Rosa Cardoso, que compõe a CNV e presidiu a
reunião, falou em um ano para cumprir a tarefa e na ajuda fundamental das
atuais centrais sindicais – todas representadas na mesa do encontro.
Riani, presidente da CGT em 64, e Rosa Cardoso, da Comissão Nacional da Verdade |
Está sendo distribuído um questionário, que poderá ser
respondido também através da Internet, para que toda pessoa que tenha algum
caso relacionado com a repressão no sindicalismo possa transmiti-lo à CNV.
Falta, porém – comento eu -, uma mobilização nacional
para formar uma cultura de massa que empurre um trabalho desse tipo. A chamada
grande imprensa (os monopólios da mídia hegemônica, cuja maioria apoiou o golpe
e a ditadura) está ocupada com o entretenimento desenfreado e com bandeiras
políticas de direita, como a criminalização dos movimentos sociais e da
política.
Restam neste campo alguns órgãos de imprensa, alguns
veículos da mídia alternativa e a blogosfera democrática, popular, de esquerda
(chamada progressista, os “blogs sujos”), os quais já constituem uma força
ponderável, mas ainda bem minoritária.
Um dado fundamental: não havia jovens no auditório do
Sindicato dos Engenheiros. A maioria da juventude brasileira parece não saber o
que foi o terrorismo de Estado durante a ditadura, mesmo levando em conta a sua
promissora participação nas jornadas de rua de junho último e a atuação recente
de grupos militantes como o Levante Popular da Juventude (LPJ).
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