Chávez na sua última campanha presidencial em 2012 (Foto: Nodal) |
Por Aram Aharonian (jornalista e professor uruguaio-venezuelano), no portal Nodal (Notícias da América Latina e Caribe), de 01/08/2013
Alguns analistas assinalam que a Revolução Bolivariana – pacífica, democrática (observação abaixo) - atravessa a crise do fim do ciclo reformista. Para Toby Valderrama (1), ainda que se conquistou o governo, as leis, as relações sociais, econômicas e políticas, a cultura, continuam sendo burguesas, e para transformá-las se necessita dum segundo esforço.
Hoje ao que parece o presidente Nicolás Maduro impõe seu próprio estilo na condução da coisa pública – superada a etapa “afrancesada” que lhe fez perder 800 mil votos - e vai se fortalecendo ante um Henrique Capriles que no momento se desvanece, ao menos como líder da suposta “unidade” opositora e busca fôlego político na direita latino-americana e mundial.
Maduro parece ter uma leitura pragmática da conjuntura que o levou a criar pontes com setores produtivos e midiáticos, atacar com o governo de rua (“el gobierno de calle”), enfatizar na corrupção, convocar o Grande Polo Patriótico (a coalizão bolivariana) e fazer as pazes com seu homólogo colombiano, Juan Manuel Santos. Enquanto isso, esfriava o processo de normalização das relações com os Estados Unidos, após declarações da aspirante a embaixadora de Washington na ONU.
Não resta a menor dúvida de que a morte de Hugo Chávez deixou órfãos todos os venezuelanos, uns por amor, outros por ódio. Mas ambas as forças, bolivarianos e antichavistas, mais do que se dedicarem a apostar pelo triunfo de cada um, parece ser mais importante garantir o fracasso do outro.
A socióloga Maryclén Stelling assinala que a oposição observa, quase com inveja, os massivos protestos no Brasil e reclama do candidato antichavista sua incapacidade de conduzir o país às ruas e cobrar, dali, o respeito ao que acredita terem sido os resultados eleitorais.
Hoje a Venezuela vive outro processo pré-eleitoral, rumo às eleições municipais de 8 de dezembro. As expectativas das bases do PSUV (Partido Socialista Unido da Venezuela) sobre a realização de eleições primárias se viram novamente frustradas, ainda que inicialmente se havia aberto um processo de seleção bastante democrático. Agora a direção optou novamente pela “dedocracia” e a frustração cresce.
Por certo, a estratégia duma “primavera árabe” na Venezuela desinflou logo após o 14 de abril e seu rastro de mortos e feridos. Mas o perigo principal para o governo são agora os votos, que continuam - de acordo com as pesquisas - em franca fuga, diante do descontentamento pela ineficiência, a ineficácia e o burocratismo.
Enquanto isso, Capriles parece ter caído na sua própria armadilha sobre a “ilegitimidade” de Maduro, numa postura que o isola de muitos setores opositores e deixa seu partido, Primeiro Justiça, jogando na beira do abismo “primaverista”. Assim, o Movimento ao Socialismo anunciou que debaterá se vai com a MUD (Mesa da Unidade Democrática, a articulação opositora) nas eleições municipais ou com seus próprios candidatos.
E mais: é incompreensível que Capriles tenha felicitado os dirigentes do Paraguai, que continuam em sua posição contra o ingresso da Venezuela no Mercosul. Não é apropriado a um aspirante à presidência atuar contra um interesse nacional, que está acima da luta partidária, frisa o cientista político opositor Leopoldo Puchi.
Em meio à campanha pré-eleitoral, a Mesa da Unidade Democrática anunciou que espera 7.500.000 votos em 8 de dezembro, 168 prefeitos (50% do total) e 1.100 vereadores, o que daria à oposição uma vantagem de 12% sobre os governistas (o “oficialismo”).
A partir de espaços acadêmicos, midiáticos e de ONGs nacionais e estrangeiras se insiste na possibilidade do reencontro, reconciliação e “reconstrução dos venezuelanos”, e abundam os auto-proclamados “mediadores”. E, assim, se organizam eventos que repetem e consagram a polarização.
Entre a construção do socialismo e a corrupção
Retomando as últimas instruções de Chávez no seu último conselho de ministros, em outubro passado (2), Maduro reconheceu que tem uma dívida com a comuna (se supõe que o poder comunal seria a base da construção do socialismo) e com o programa de governo de Chávez.
O diretor do diário Últimas Noticias (é o jornal - privado - de maior circulação do país, 300 mil exemplares/dia), Eleazar Díaz Rangel, se perguntou: O que se fez com a comuna? Se avançou na sua constituição? Quantas se formaram nestes 100 dias de governo? Quantas estão em formação? Em algum estado se cumpriu a cota correspondente? Como marcha o processo de criação de conselhos comunais? Qual é o balanço da continuação que o Ministério das Comunas faz de um e do outro processo, o das comunas e o dos conselhos comunais?
O plano de Chávez considerava um crescimento anual aproximado de 450 comunas, como parte “…da transformação do sistema econômico, para a transição ao socialismo bolivariano, superando o modelo rentista petroleiro capitalista rumo ao modelo econômico produtivo socialista, baseado no desenvolvimento das forças produtivas”.
Nem sequer o combate à corrupção parece fácil, apesar da decisão presidencial, que tem levado alguns poucos funcionários e empresários beneficiados à prisão. Maduro precisou sair a expressar publicamente seu respaldo absoluto ao presidente do Indepabis (organismo controlador de preços e de defesa do consumidor), Eduardo Saman, a quem pediu manter-se firme na sua luta contra as máfias que provocam o desabastecimento.
A declaração do mandatário ocorreu um dia depois de se publicar no Diário Oficial (“Gaceta Oficial”) uma resolução do ministro do Comércio que deixava sem efeitos atribuições especiais para designar e destituir diretores e pessoal de confiança dessa instituição.
Tradução: Jadson Oliveira
Notas:
1) Toby Valderrama, ¿Es posible la vía pacífica?, Punto Final de Chile, edición 785 del 12 de julio de 2013
2) Aram Aharonian, Las últimas instrucciones de Chávez, http://questiondigital.com/?p=12958
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