A MILITÂNCIA FORA DO EIXO, O COMUNISMO E A BUSCA DA FELICIDADE




Reunião da casa Fora do Eixo em SP (Foto: www.medium.com, ilustrando texto de André Azevedo)
 De Belo Horizonte (MG) – Sem entrar no mérito do rico e apaixonado debate ora travado no Brasil em redor da experiência dos coletivos culturais Fora do Eixo, quero meter o bedelho num aspecto totalmente fora do eixo da discussão, especialmente se levamos em conta que o tema envolve mais os jovens.


O que teria a ver com isso os sessentões e setentões que viveram a marcante experiência da militância comunista nos anos 60 e 70?


Pois é, me bateu essa questão na cabeça ao ler um dos tantos depoimentos e opiniões sobre o agora famoso Fora do Eixo, liderado pelo agora também famoso Pablo Capilé. Mais particularmente o tocante desabafo de Laís Bellini, detalhando um rosário de críticas e frustrações.


Então, pensei: no fundo, no fundo, independentemente do que seja ou do que se quer que seja, a questão está relacionada com a luta incessante da busca da felicidade pessoal, a coisa central que marca os anseios, os sonhos, as expectativas de cada um neste eterno caminhar da existência humana. É... tudo tem a ver com isso, poderia desarmar o jogo qualquer espírito de porco.


Certo. Mas, perdoem se pareço pretensioso, porque ninguém chega a conclusão alguma num terreno pantanoso desse. Primeiramente, antes de tudo, porque essa tal felicidade não existe. Existem momentos de, dizem os mais sofridos e calejados, em meio a mil versões e mil verdades. O que existe – penso eu – é a expectativa da felicidade, é o que idealizamos como felicidade, que às vezes parece estar aí mesmo à nossa frente, às vezes nem tanto e às vezes não chega nunca.


E veja como o que estou dizendo ganha realce quando você transporta isso para a vida dos jovens, porque é da juventude que se trata. Com seus fascinantes arroubos, com sua temeridade, sua gana de assaltar os céus, sua sensibilidade na busca do novo e do justo, mas também com sua ingenuidade, seus erros e seus medos. Falo de jovens assim, porque os que não são assim já nasceram velhos (desses não falo, não me interessam).


Os velhos militantes comunistas têm muitas dessas histórias de vida como a contada por Laís Bellini – os jovens é que certamente não sabem delas, porque a tendência de cada um é contar sua história como se fosse a primeira, duma certa maneira somos passageiros prisioneiros da nossa própria geração. Nela, na nossa geração, estacionamos nossas mais tocantes referências existenciais, porque o mais real das nossas vidas – ou pelo menos o que mais julgamos compreender – é o que vivemos diretamente, tocamos, cheiramos, sentimos, choramos, apanhamos, sorrimos, amamos, gozamos.


O mundo como é, é uma merda


Não importa se estamos num coletivo do Fora do Eixo em pleno século 21 ou se estamos numa célula dum partido comunista da década de 70. Você pode apontar inúmeras diferenças de época, de personagens, de contexto – ditadura e democracia -, de objetivos, de “lastros” (para usar um termo da moda entre os Fora do Eixo) ou de “táticas e estratégias” (para usar termos tão ao gosto dos comunistas), mas há uma questão comum: o jovem ou a jovem está ali buscando se encontrar, buscando se realizar, buscando, enfim, mudar o mundo. Porque é isso o que conta, porque o mundo como é, é uma merda.


Então, nem sempre a realidade bate com o que esperamos. No tempo dessa militância comunista da qual me lembro, corriam papéis e mais papéis, de mão em mão, clandestinos, com depoimentos, uns apaixonados, outros mais intelectualizados, avaliações, acusações, defesas, o diabo a quatro. O marxismo-leninismo – ou o que julgávamos ser o marxismo-leninismo - era o centro de tudo.


Do mesmo jeito que hoje, só que a céu aberto, tanto na mídia tradicional como na inimaginável – naquela época – blogosfera. E não se trata do marxismo-leninismo, mas sim dos revolucionários coletivos de produção e difusão de eventos culturais atuando sob a chancela do Fora do Eixo – e seu filhote predileto, a também revolucionária forma de comunicação de massa chamada Mídia Ninja.


Mas, repito, o que conta no frigir dos ovos é, no íntimo, nos realizar, e, no geral, mudar o mundo. O que é uma façanha descomunal, mas para o jovem às vezes parece ser uma coisinha que está ali mesmo na próxima esquina.


Comunistas houve que o foram – digo militantes comunistas de partido, “organizados”, como dizíamos – durante pouco tempo, se frustraram rapidamente como é o caso de Laís Bellini; outros ficaram cinco, 10, 15 anos, muitas vezes brigando internamente pra mudar as coisas no próprio partido; outros partiram pra criar outro partido, uma dissidência, outra dissidência (outro dia um velho militante brincou ao saber que sete antigos companheiros de militância haviam passado recentemente um final de semana reunidos numa fazenda: não criaram nenhum partido!!!???).


E outros – a esses devoto uma imensa admiração e apreço – passaram toda a vida na militância comunista, agüentaram as agruras do dia-a-dia da vida de rebeldes que elegeram na juventude, remando contra a maré implacável do capitalismo e às vezes se batendo contra as amarras do seu próprio partido. Gosto de pensar que estes foram felizes. Mas, claro, esta é a idealização que conservo da felicidade.

Comentários

detaalmeida disse…
Gostei da inspiração! Acredito que essa façanha descomunal parecendo que é uma coisinha que está na esquina é que faz acontecer algumas mudanças, mesmo pequenas aos nossos olhos. Ainda bem que existem os jovens!
Unknown disse…
Gostei muito do seu texto. É isso mesmo. Já fomos jovens com nossos erros e acertos e todas as dissidências, argumentos e contra argumentos.Migramos de um partido a outro buscando o caminho da felicidade e em busca de um mundo melhor.Acreditamos em Stálin, rompemos com Stálin e com tantos outros.Acreditamos um dia que trabalhar na mídia tradicional a simples presença nossa dentro das redações mudaria alguma coisa.E nesse meio tempo Herzog foi assassinado pois acreditava que estaria a salvo e não correu para o exílio.
Viva os jovens de hoje e todo o esforço que fazem nas redes sociais, com os erros e acertos.E que continuem protestando e exercendo o seu direito de livre pensar
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Jadson disse…
Salve, "detaalmeida" (belo nome!) e "unknown", toda força aos jovens, se eles não se mobilizarem estaremos "no mato sem cachorro", como se diz no popular.
"Unknown", vc falou em Stálin, militei no PCdoB de 72 a 81, éramos stalinistas, viramos maoístas, depois linha Albânia (Enver Hodja), um sufoco, companheiro.
Mas, como diz o grande Fernando Pessoa, "tudo vale a pena quando a alma não é pequena".