Requião: "Boa parte da esquerda tradicional, como a camélia, caiu do galho, depois murchou, depois morreu" (Foto: Internet) |
Do blog Viomundo, postagem de 29/05/2013 (fragmentos de discurso do senador Roberto Requião, do PMDB-Paraná. No blog do Requião o título é: Retrocesso e rendição ao neoliberalismo na privatização de portos e petróleo)
Volto hoje ao meu tema de eleição, o tema que nesses dois anos e meio de mandato trouxe-me com frequência à tribuna. É a economia, senhoras e senhores senadores. Ela é o sal de nossas vidas. E as nossas vidas, a vida nacional têm andado um tanto quanto sensabor nos últimos meses.
Eu não diria que estamos repetindo o prato de feijão-com-arroz de Mailson da Nóbrega, que aquela mediocridade dificilmente alguém seria capaz de duplicar, mil anos vivêssemos. Mas estamos no ritmo da mesma toada, de idêntico cantochão, marcando passos que não atam e nem desatam.
A idéia parece ser esta mesmo: enrolar até a eleição de 2014; empurrar com a barriga e fazer figa para que nada atrapalhe a manobra. Isso de uma banda; de outro lado, aprofundam-se, radicalizam-se as medidas de desnacionalização da economia e de privatização de setores estratégicos, como portos e energia.
Quer dizer, são dois movimentos: a deslocação das encrencas pelo bandulho, para que tudo fique no mesmo lugar, e a aceleração das privatizações, arrancando ciúmes do PSDB, do DEM e do PPS, tal a desfaçatez desse desbaratamento dos bens e das riquezas dos brasileiros.
Na trágica sessão desta Casa do dia 16 de maio, quando foi aprovada a famigerada e pouco cheirosa MP dos Portos, o senador José Agripino, cujas posições em favor das privatizações são claras, transparentes, sem disfarces ou truques, avaliou com acuidade a pantomima:
–Isso parece uma coisa surrealista!”, afirmou.
E emendava:
–Veja bem (…) : qual é a nossa praia, senador Aloísio? A nossa praia são as concessões, as privatizações, o prestígio ao capital privado. Votar uma matéria como essa é a nossa praia!. Está no nosso DNA!
(...)
Fala sobre a aprovação da MP dos Portos e conclui:
A citação que o relatório do Governo faz das duas únicas experiências, nada bem sucedidas, do modelo agora adotado pela MP dos Portos, as experiências Inglaterra e da Nova Zelândia, para mim é paradigmática, é um clássico! Depois de lançar um anátema, depois de excomungar o modelo, depois de abominá-lo e amaldiçoá-lo, o governo adota-o! Desaconselhados pelo Banco Mundial, os modelos portuários inglês e neozelandês têm agora a companhia brasileira. Alvíssaras! Nunca é tarde para aderir ao atraso!
(...)
Fala sobre os leilões da Petrobrás:
Mas aquela infeliz semana reservou aos brasileiros outra grande desgraça: os leilões da Petrobrás. Poucas vezes ouvi e li argumentos tão oportunistas, tão antinacionais, tão frágeis e tão pouco honestos a favor de alguma coisa, como os em defesa dos leilões do dia 14 de maio.
Ao ouvir e ler fiquei triste porque vi mais companheiros abandonando posições na barricada em defesa dos interesses populares e nacionais. Que tantos tenham desertado de antigas defesas, comprova-se todos os dias. Mas não esperava que a desistência ampliasse tanto.
Meu Deus! Como defender, como justificar mais esta rodada de leilões de petróleo?
Na verdade não é só o leilão do petróleo; e nem é fortuita, ocasional a coincidência que a privatização dos portos tenha sido aprovada no dia seguinte ao dos leilões. Como disse o Partido Comunista Brasileiro, o PCB, em uma corajosa e militante nota política: estamos vendo o maior processo de privatizações na história do Brasil.
(...)
Faz um apelo à esquerda: vamos, mais uma vez, recomeçar:
A ANP, talvez das agências reguladoras a mais querida da mídia e do mercado, disse que nos blocos licitados deverão ser descobertos 19 bilhões de barris de petróleo e gás, que serão exportados!
Especialistas de verdade como Fernando Siqueira e Paulo Metri, e não aqueles especialistas de fancaria que frequentam os noticiários globais, peritos como Siqueira e Metri, citados por Benayon, perguntam: “Quem definiu que a exportação desse petróleo é a melhor opção para o Brasil?”.
Enquanto os Estados Unidos proíbem a exportação de petróleo, olhando para frente, nós fechamos os olhos à trágica experiência de países exportadores, que queimaram suas reservas por nada, para nada.
Discute-se muito hoje na Europa, com a falência do modelo neoliberal, junto do qual se enterraram os partidos ditos de esquerda, discute-se muito uma refundação da esquerda. A exaustão dos partidos trabalhistas, socialistas e socialdemocratas, abduzidos pelo neoliberalismo e campeões na aplicação das políticas de austeridade, fez espocarem novos agrupamentos de esquerda por toda a Europa. Na Inglaterra, o cineasta Ken Loach lança apelo por um novo partido, considerando definitiva, irrecuperável, a guinada do Partido Trabalhista para a direita.
Por cinco vezes, não uma ou duas, e sim por cinco vezes acompanhei o PT nas eleições presidenciais. Nas circunstâncias de hoje, fossem esses que se anunciam os candidatos, acompanharia o PT pela sexta vez. No entanto, parece claro que o PT está à deriva, distancia-se da esquerda. Como já não é mais possível classificar como de esquerda os partidos da base, que ainda assim se dizem, em que pese as posições hoje assumidas.
É à esquerda, pela esquerda, que construiremos o país e a sociedade que anelamos há tanto tempo. Não há outra saída. Boa parte da esquerda tradicional, como a camélia, caiu do galho, depois murchou, depois morreu.
Vamos então, mais uma vez, recomeçar.
Clicar aqui para ler o discurso na íntegra e ver/ouvir o vídeo:
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