NEM SEUS COMPATRIOTAS ESTÃO A SALVO DE OBAMA



Com seus drones (aviões não tripulados), o império estadunidense continua assassinando civis, incluindo mulheres e crianças, pelo mundo afora (Foto: Página/12)
Por Juan Gelman (poeta e jornalista argentino) - reproduzido do jornal argentino Página/12, edição de 17/02/2013

Ele próprio o admitiu: enviou agentes da CIA ao Iémen (ou Iêmen, ou Yêmen) para assassinar um cidadão estadunidense, seu filho adolescente e o filho dum amigo. Ocorreu em 2011 e disse que o havia ordenado porque seu compatriota adulto instava a combater contra os EUA e que os jovens foram apenas “um dano colateral” (www.washingtonpost.com, 14-2-13). Se conhecia o episódio, mas é a primeira vez que o mandatário o aceita abertamente. Acrescentou que faria o mesmo cada vez que estivesse convencido de que matar estadunidenses era necessário para salvaguardar a segurança dos EUA. O adulto do caso não tinha antecedentes nem havia sido processado ou condenado por tribunal algum. Foi executado extrajudicialmente por um drone (avião não tripulado) da CIA.

O ex-juiz da Suprema Corte de Nova Jersey, Andrew P. Napolitano, opinou em The Washington Post que “o direito internacional e o direito em tempos de guerra, aos quais os EUA estão sujeitos por pactos (vinculantes), assim como o direito federal e os valores judeu-cristãos que subjazem na Declaração da Independência (que garante o direito à vida) e a Constituição (que permite a ingerência governamental com o direito (de matar) somente depois duma declaração de guerra do Congresso ou um devido processo individual), todos estabelecem que a certeza da identidade dum alvo humano, a veracidade em que se baseia o desejo de sua morte, a percepção de sua culpabilidade e um perigo iminente são insuficientes para justificar que o governo utilize uma força letal contra ele. O presidente só pode executá-lo legalmente depois do devido processo ou em defesa própria ou declarando a guerra”. Se ignora que perigo iminente as vítimas representavam a milhares de quilômetros de distância dos EUA.

Muitos observadores se perguntavam de que base militar saíam – e saem – os drones que lançam seus mísseis no Iémen, Paquistão e Somália, ceifando a vida de centenas de civis, mulheres e crianças incluídas. Alguns meios de comunicação descobriram que está localizada na Arábia Saudita. Jay Carney, porta-voz da Casa Branca, explicou: “Damos estes golpes porque são necessários para mitigar ameaças reais, para terminar com os complôs, para prevenir ataques futuros e, novamente, para salvar a vida de estadunidenses” (www.telegraph.co.uk, 6-2-13). Não de todos os estadunidenses, pelo visto.

Alguns militares e funcionários dos serviços de inteligência do alto escalão expressaram sua preocupação por este tipo de guerra. O general (reformado) Stanley A. McChrystal, ex-chefe do Comando de Operações Especiais que tem a seu cargo os operativos com drones, disse numa entrevista à agência informativa Reuters que eles “podiam ser úteis, mas despertam ‘um ódio visceral’ nos lugares onde se produzem e contribuem para uma ‘percepção da arrogância estadunidense’” (www.nytimes.com, 5-2-13). E, talvez, para o recrutamento de mais militantes de Al-Qaeda.

Um informe apresentado recentemente à Corte Suprema de Peshawar – centro administrativo das áreas tribais do Paquistão – dá conta de que nos últimos cinco anos 147 ataques de drones em Waziristan Norte, uma pequena zona rural do tamanho de Long Island, causaram a morte de 894 pessoas, entre elas 35 mulheres e 24 crianças (www.thenews.com.pk, 14-2-13). A maioria das vítimas pertencia à tribo local e os juízes expressaram sua insatisfação porque o informe do procurador não distinguia entre militantes e civis não combatentes, dados que eram impossíveis de ser obtidos, de maneira que todos passaram a integrar a extensa lista de “suspeitos de terrorismo”.

Uma pesquisa do Pew Research Center revela que não falta razão ao general McChrystal acerca da opinião externa sobre os ataques com drones (www.people-press.org, 6-2-13). Enquanto nos EUA os apoiam 62%, na Grã-Bretanha os desaprovam  47% e na Alemanha 59%. Nem falar dos países árabes: na Tunísia os condenaram 72% dos entrevistados, no Egito 89%, na Jordânia 85%. Até em países como o Brasil e a Grécia se registraram altos índices de reprovação: 76% e 90% respectivamente.

Cabe, no entanto, matizar a posição dos entrevistados nos EUA: 81% se mostraram muito preocupados ou algo preocupados porque esses ataques põem em perigo a vida de civis (www.people-press.org, 11-2-13), 65% manifestaram muito ou algo de temor de que provoquem a represália dos extremistas e 57% consideraram que estragam a reputação internacional dos EUA. Ao mesmo tempo, 66% opinaram que são perfeitamente ou bastante legais. Ao que parece, nem todos os estadunidenses conhecem a Constituição estadunidense.

Tradução: Jadson Oliveira

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