Esta é a parte 3 (divisão feita por este blog) dum
artigo intitulado “Defender os médicos cubanos; denunciar as políticas de
saúde no Brasil! (uma contribuição ao
debate” (datado de
11/05/2013), enviado pelo jornalista Otto Filgueiras, baiano há muito radicado
em São Paulo. O título original desta parte é “Os atores neste projeto e suas máscaras”. O título acima é deste blog.
Por
Otávio Dutra -
estudante da Escola Latino Americana de Medicina em Cuba, militante do Partido
Comunista Brasileiro (PCB) e membro da Coordenação Nacional da União da
Juventude Comunista (UJC).
Eis que surge uma noticia bombástica
anunciada pelo governo brasileiro: nos próximos meses está para chegar ao
Brasil o primeiro contingente dos mais de 6 mil médicos e médicas de Cuba
previstos até 2015. O fato está gerando um intenso debate na sociedade
brasileira, permitindo que na polarização criada identifiquemos os atores
principais da polêmica, assim como suas intenções de fundo. No bojo deste
debate aparece um tema coadjuvante, intrinsecamente ligado a ele, e não menos
gerador de polêmicas e divergências na sociedade brasileira, a revalidação dos
diplomas médicos expedidos no exterior.
Os
atores neste projeto e suas máscaras
De um lado está o governo brasileiro,
presidido por Dilma Roussef (PT). Por outro um dos setores mais conservadores
da sociedade brasileira, capitaneados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) e
a Associação Médica Brasileira (AMB), entre outros porta-vozes do status quo
e do atual modelo hegemônico de saúde no Brasil, em que a saúde não é mais que
uma mercadoria. Existe ainda um terceiro ponto de vista, que trataremos de
enfatizar neste texto.
O Governo anunciou neste 6 de maio o
convênio realizado em parceria com Cuba, que prevê a vinda de milhares de
profissionais da medicina desse país para trabalhar fundamentalmente em 3 áreas
do Brasil: sertão nordestino e Amazônia brasileira; Vale do Jequitinhonha;
periferia das grandes cidades. O convênio faz parte do programa do governo
federal “Brasil mais Médicos”, que tem como objetivo “interiorizar” o acesso à
saúde no país. Desse programa faz parte também o Programa de Valorização dos
Profissionais na Atenção Básica (PROVAB). Em paralelo, o governo federal tem
reduzido anualmente os gastos do orçamento nacional destinado à área da saúde
(somente em 2012 ocorreu um corte de mais de 5 bilhões de reais), assim como
uma progressiva entrega dos serviços e da infraestrutura pública da saúde à
iniciativa privada, através de parcerias público privadas como as Organizações
Sociais (OS), as Fundações Estatais de Direito Privado (FEDPs), as Organizações
da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs) e a Empresa Brasileira de
Serviços Hospitalares (EBSERH). Tais medidas vêm - em síntese - no sentido de
precarizar o acesso à saúde de grande parte da população, permitir a
apropriação privada dos serviços, pesquisas e da infraestrutura pública para
gerar lucro e retirar direitos trabalhistas dos profissionais da saúde. Como se
não bastasse, a presidenta Dilma aprovou nesse ano uma série de subsídios
estatais para os planos privados de saúde. Tudo isso, quando pensamos em
atenção integral em saúde, afunila o já estreito gargalo entre a atenção
primária e os demais níveis de atenção em saúde: aos trabalhadores, saúde
básica e precária; atenção especializada cada vez mais concentrada nos setores
privados.
Com esse conjunto de medidas, o
projeto de “interiorização” da saúde no país - com a vinda dos 6 mil médicos de
Cuba e o PROVAB - atuaria apenas na ponta do Iceberg, levando
profissionais de forma efêmera e precária para o interior, e deixando intacta
sua profunda estrutura baseada no controle do complexo médico-industrial e
farmacêutico da saúde, em que a existência do setor público serve como alicerce
para a acumulação privada de capitais na área, potencializada por uma profunda
cisão entre a atenção básica de saúde e os demais níveis de especialização.
Enquanto isso, em se tratando da formação de recursos humanos em saúde, dos
anos de 2000 a 2013 foram criadas 94 escolas médicas, sendo 26 públicas e 68
particulares, números que apenas confirmam os caminhos do sistema nacional de
saúde, em que a formação dos profissionais da saúde é hegemonicamente voltada
para o mercado da saúde e para os interesses do complexo médico-industrial e
farmacêutico e das grandes empresas da educação superior. E pior, até mesmo nas
universidade públicas esse modelo é hegemônico. Com esses elementos, não resta
dúvidas de que o projeto de levar médicos para o interior do país não tem
qualquer relação com uma política substancial que modifique o modelo de saúde
do país e permita uma atenção integral a toda população brasileira.
No entanto, com a divulgação da vinda
dos médicos cubanos ao Brasil, os setores mais conservadores da nossa sociedade
começam a mostrar seus dentes gananciosos e elitistas. Utilizam como porta
vozes o CFM e a AMB, entre outros. Por trás de um falso discurso que preza pela
qualidade da atenção à saúde, esses setores corporativistas estão mais
interessados em manter o poder e o mercado da categoria médica, fundamentados
na medicina privada, defendendo em última instância o controle pelo complexo
médico-industrial e farmacêutico do sistema nacional de saúde, inclusive
alimentando-se da falta de qualidade da atenção pública para reverter
exorbitantes recursos públicos ao privado. Este setores são xenófobos e
anti-populares em sua essência, defendem o status quo da sociedade
brasileira e, com o medo característico das elites nacionais (em permanente
contra-revolução preventiva), direcionam toda sua munição de mentiras e
manipulações para atacar a política de contratação dos médicos cubanos,
contestando sua capacidade técnico-científica, assim como soltando todo seu
veneno e falácias contra a realidade de Cuba e seu sistema socialista. (A parte 2 foi publicada no dia 20/maio).
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