Chávez: o "tirano" que venceu 16 eleições democráticas e perdeu uma em 14 anos e continua "tirano" na cabeça da grande maioria dos brasileiros (Foto: Internet) |
De
Salvador (Bahia) – “O Maduro parece que vai vencer na
Venezuela, não é?” – disse minha amiga depois dos cumprimentos formais num
encontro casual num shopping da capital baiana. Professora do interior, estava
na capital fazendo exames médicos, como sempre acontece com os “tabaréus”,
observei brincando. (A conversa foi antes das eleições venezuelanas).
- Creio que sim, os chavistas vão ganhar - respondi com a
“autoridade” de quem passou mais de quatro meses em Caracas durante a última
campanha eleitoral de Chávez, mas já de sinal amarelo aceso esperando o que
viria por aí.
- Ele parece que quer ser Chávez...
- Ele é filho de Chávez, vamos dizer assim...
- Ele era vice-presidente, não é? Aliás, vice não sei de
que, porque não se sabe que tipo de regime é aquilo - foi se revelando minha
amiga professora.
- É um tipo de democracia mais avançada do que a nossa,
uma democracia participativa, onde o povo pobre não apenas vota, mas vai também
para as ruas defender suas conquistas – vendi meu peixe.
- Sim... democracia... é como aqui mesmo: vota no pessoal
do Lula pra garantir a esmola da Bolsa Família.
Pronto. Chegou aonde eu esperava: no “tirano”, no
“populista”, como TODOS, aproveitador da ingenuidade do povo. É por aí que
pensam nove de 10 conhecidos que me puxam conversa sobre a Venezuela.
Geralmente eles sabem que sou chavista e já passei duas temporadas por lá, em
2008 e 2012.
Como é que uma pessoa instruída, morando no interior
baiano, sabe das coisas lá da Venezuela? Só pode ser pela TV (a grande
maioria), pelo rádio, alguma revista semanal, algum jornal. Os blogs “limpos”?
As redes sociais? Livros didáticos? As igrejas? Conversa com os vizinhos?
Qual o percentual dos que leriam (incluídos os das grandes
cidades) nossos blogs ditos progressistas (ou “sujos”), em relação à artilharia
das corporações da mídia hegemônica, TV Globo & Cia? Presumo ser um
percentual ínfimo.
Companheiros blogueiros (progressistas, de esquerda, mais
à esquerda, por aí), a situação está difícil, pra não dizer impossível. Não
quero nem falar da coisa financeira, mas das possibilidades de disputar, ou
não, as mentes e os corações dos brasileiros. É o que se pode chamar de
quixotismo (ou voluntarismo, para usar uma palavra muito em voga na nossa
militância esquerdista dos anos 60 e 70 do século passado).
Acabamos de passar por uma paulada monumental: a direita,
através de seu instrumento mais visível e eficiente – a chamada grande imprensa,
a velha mídia -, encostando na parede uma maioria apertada do Supremo Tribunal,
conseguiu incríveis condenações no chamado mensalão, “o maior caso de corrupção
da história do Brasil”, dizem na maior cara de pau. Condenações impensáveis num
típico julgamento de exceção, e – pasmem – acoplado ao calendário eleitoral,
escancaradamente para prejudicar os candidatos do PT.
Agora, mais uma paulada razoável: a sempre poderosa Rede
Globo, dia sim, outro dia também, vai espremendo na Justiça blogueiros que
ousam revelar as “entranhas do monstro” (expressão do prócer cubano José Martí,
certo?). Tanto que um dos maiores e melhores desses blogs – o Vi o Mundo,
criado pelo jornalista Luiz Carlos Azenha – chegou a anunciar sua extinção.
Felizmente, revertida, depois da bela reação solidária.
Sem
mobilização popular não há democracia verdadeira
Os blogueiros se articularam, como sempre ao redor do
Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé, presidido pelo nosso
Altamiro Borges, do Blog do Miro. Foi dado o grito e bem ecoado: “uni-vos”. Mas
pra mim está claro que nosso sucesso está ligado a muitas variáveis e todas
elas passam pelo grau de avanço ou de atraso do movimento democrático e popular
no Brasil. Aí é que está o x do problema. Fatores como:
Vai ou não vai avançar a luta pela democratização da
mídia? Pelo que sei, partidos como o PT e o PCdoB já estão decididos (depois de
muita demora), através de resoluções das respectivas cúpulas dirigentes, a se
engajar nessa luta, reforçando posicionamentos de movimentos sociais
importantes, como o super-criminalizado MST, centrais sindicais, entidades
estudantis, etc. Agora mesmo – uma boa novidade – as comemorações do 1º. de Maio
terão como mote a campanha “Quero falar também”.
E o PDT do grande combatente Leonel Brizola, cujo
correligionário deputado Miro Teixeira atua a serviço dos monopólios da mídia?
E o PSB, e a Rede da Marina Silva? Trata-se de uma luta há muito tocada pelo
Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), por blogueiros, por
professores/intelectuais que atuam na área, por publicações como Carta Capital,
Caros Amigos e Fórum.
Afinal, a liberdade de expressão seqüestrada por meia
dúzia de famílias é ou não é o assassinato de qualquer democracia? Lembremos
que a principal dessas corporações da mídia – as Organizações Globo – foi a
mesma que se fez na ditadura, a mesma que ajudou a sustentar a ditadura, a
mesma ditadura que censurou, que torturou, que matou patriotas.
Um líder fundamental como Lula vai participar dessa luta?
Ou prefere ir levando assim e assado, afinal, assim e assado, vem ganhando
eleições? Até quando? E a presidenta Dilma vai ficar repetindo aquela frase
ridícula “Prefiro os excessos da imprensa...”? E o seu ministro das
Comunicações, Paulo Bernardo, que vexame!? É uma questão de coragem/covardia,
como fala todo dia a maioria dos blogueiros “sujos”, ou uma questão de cálculo
político, de oportunismo?
Alguns parlamentares têm avançado em seu posicionamento
diante da ditadura da mídia, dentre eles: destaco primeiro o senador Roberto
Requião, do PMDB, sempre nacionalista, especialmente pelas inúmeras brigas como
governador do Paraná; a deputada Luíza Erundina (PSB-SP), na frente parlamentar
contra o “terrorismo midiático”, como dizem na Venezuela; nosso baiano (nascido
paulista) Emiliano José, suplente do PT (mesmo quando não está deputado, está
na luta como jornalista); ultimamente tenho visto o engajamento do deputado
Paulo Pimenta (PT-RS); quem mais?
Os governos da era PT na presidência vão continuar
financiando TV Globo, Veja, jornais Folha, Estadão e O Globo & Cia, e
minimizando o papel dos meios de comunicação alternativos, pagando aos grandes
para seguir apanhando todo santo dia?
Como entender que os governos Lula/Dilma conviveram e
convivem com a perseguição às rádios e TVs comunitárias? Melhor não seria dizer
patrocinaram e patrocinam tal processo de criminalização, através da Polícia
Federal, da Anatel e do Ministério das Comunicações?
E os partidos mais à esquerda, chamados pejorativamente
de “radicais”, de “extremistas”, não afinados com os governos Lula/Dilma,
engrossariam essa luta? São os casos do PSOL, PSTU, do atual PCB (antigo
Partidão), PCO, etc. (Na verdade, esses nem sequer são escutados).
Pretendo ampliar estas reflexões quiçá pretensiosas dum Quixote moderno, assim meio
desorganizadas, soltando as muitas dúvidas e as poucas certezas que circulam
pelo juízo. Este é o capítulo 1. Até
mais.
Comentários
Considerar o julgamento do mensalão com de exceção é ter pouco apresso às instituições democráticas.
Agora, tomar a Venezuela como exemplo de democracia avançada, já é deboche com qualquer um que tenha um cérebro.