OPOSIÇÃO BANCÁRIA DA BAHIA/1975: PRIMEIRA TENTATIVA DE DERRUBAR A PELEGAGEM NO PÓS-AI-5 (Parte 2)



O núcleo central da "chapa verde" na redação do antigo Jornal da Bahia denunciando as pressões contra a Oposição Bancária (foto que ilustra matéria publicada na edição do JBa de 15/06/75)
De Salvador (Bahia) - Falei na primeira parte deste texto de 1972 e dei uma esticada até 1981. Falta, porém, falar de 1973, 1974 e, muito especialmente, de 1975, período – de 1972 a 1975 - que comporta minha militância sindical bancária. Nosso “trabalho de formiga” foi aos poucos se ampliando e os frutos aparecendo, na medida em que se incorporavam outros companheiros de diversos bancos, em especial dos bancos oficiais (além do Baneb, o Banco do Brasil/BB e o Banco do Nordeste/BNB).

O cume dessa militância, nesse período, foi a tentativa de disputar a direção do sindicato nas eleições de 1975, frustrada, no entanto, pela ação dos pelegos em conluio com a Delegacia Regional do Trabalho (hoje Superintendência - do Ministério do Trabalho) e os denominados “órgãos de segurança”.

Para chegarmos aí, tivemos a grata companhia militante de companheiros valorosos e abnegados. Me arrisco a citar alguns, sabendo que outros ficarão, injustamente, de fora (pecados do esquecimento, pelos quais peço desculpas). Me lembro bem de gente como nosso Lustosa (Valdimiro), do Baneb, que participou desde o início e continuou: fez parte da chapa vencedora de 1981 e, depois de diretor do sindicato, fez um belo trabalho à frente da Casseb, órgão de assistência à saúde dos empregados do banco.

Também de Pedrinho (Pedro Barbosa), pequenininho abusado e combativo, que nos ajudou bastante junto com outros seus colegas do BNB. Foi em seguida liderança de destaque na luta e na diretoria eleita em 1981 (ocupou a secretaria-geral do sindicato). Depois militou no PT e na CUT (Central Única dos Trabalhadores). Outro bravo ativista, desde essa fase, foi Edelson Ferreira dos Santos (alguns mais chegados o chamavam de “Cicatriz”, devido a uma marca na testa). Ele era do antigo Banorte (Banco Nacional do Norte) e teve logo mais na frente um destaque especial na Oposição Bancária, pois encabeçou uma chapa que disputou (e perdeu) a eleição sindical de 1978.

Lembrando com saudades dos companheiros de travessia

Edelson fez parte também das fileiras do PCdoB, antecedendo – assim como Geraldo e eu – outros militantes do partido que se incorporaram depois à Oposição Bancária, a exemplo de Euclides Fagundes, hoje presidente do sindicato, e Álvaro Gomes, ex-presidente e atual deputado estadual.

Na nossa retaguarda – assessorando, empurrando e transmitindo experiência  – se destacava o economista George Sá, do Baneb, que mantinha contatos com companheiros seus da turma que se mobilizou para retomar a luta sindical no pós-golpe de Estado de 1964, mas tomaram um “chega pra lá” após o AI-5. George já tinha nas costas uma larga trajetória de luta: tinha sido “vetado” nas chapas que disputaram eleições sindicais em 1965 e 1968. Outro dos veteranos que nos ajudaram foi Nilton Coutinho, do BB, que fez parte da diretoria do sindicato afastada quando da intervenção decretada pelos golpistas de 64.
Valdimiro Lustosa e Pedro Barbosa num evento literário no Shopping Barra em 1995
Edelson Ferreira, em foto recente, dando depoimento sobre a militância sindical na Assessoria de Comunicação do Sindicato dos Bancários (Foto: Rogério Almeida)
Recordo também de dois irmãos – Paulo e Silas Galvão: o primeiro trabalhava no antigo Banco Econômico, aqui em Salvador, e o outro no Baneb em São Paulo. Através deles, tínhamos informações e material (revistas, jornais, panfletos) sobre o movimento sindical paulista dos bancários, naquela época bem mais avançado do que o nosso, pois já dirigia o sindicato e a federação.

Registro aqui um apoio valioso, vindo de longe, de lá de Porto Alegre/Rio Grande do Sul. Olívio Dutra – veio a ser depois da ditadura dirigente do PT, prefeito de Porto Alegre, governador do estado e ministro do governo Lula – era na época do banco oficial do seu estado e presidente do sindicato dos bancários gaúchos. Veio algumas vezes injetar conhecimentos aos aprendizes da nova militância sindical baiana. Nos tonificava política e ideologicamente. Um homem público realmente admirável por sua dedicação aos interesses populares.

Bem, na faina do dia-a-dia, um trabalho miúdo de conhecer e se enturmar com mais colegas e participar o máximo possível da vida do sindicato, atravessamos 1973 e 1974. Neste último ano, houve uma luta politicamente notável que já estava apagada da parede de minha memória, mas vi registrada no livro de Euclides Fagundes: “Bancos, Bancários e Movimento Sindical” (2ª. edição – revisada e atualizada). Transcrevo da página 299:

“Em 1974, os opositores Geraldo Guedes, Valdimiro Lustosa, Jadson Oliveira, João Iná e Carmerino Prates, todos funcionários do Baneb, organizaram um abaixo-assinado contendo 400 assinaturas e entregaram a José de Oliveira Torres, presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, e Moacyr da Silva Côrtes, presidente da Federação dos Bancários da Bahia e Sergipe, para que fosse pleiteada junto aos banqueiros uma antecipação salarial. Os bancários obtiveram um adiantamento de 15% e, a partir daquele ano, os adiantamentos salariais passaram a ser rotina na luta sindical bancária.”  

A “chapa verde”, para espertalhões, seria a “chapa melancia”

Vamos que vamos, chegamos a 1975 e ao momento tanto esperado de se eleger nova diretoria do sindicato. Torres, matreiramente, arranjou um candidato de fora do seu círculo de pelegagem: Eraldo Paim, do BB, um neo-pelego, com boa imagem, que caiu bem no papel, podendo inclusive usar, pelo menos no discurso, a bandeira da “renovação”.    

Daí que nossa chapa usou na campanha os slogans de “renovação de verdade”, “oposição de verdade”. Naquele tempo, além da numeração da chapa, havia a coisa de se adotar uma cor: a da situação era “azul” e a nossa era “verde” (não faltaram espertalhões, com vocação de dedo-duro, que murmuravam se tratar da chapa “melancia”: verde por fora e vermelha por dentro). Foi muito difícil compor o grupo, já que nosso movimento era fraco na maioria dos bancos privados (na época eram muitos bancos), com exceção do Banorte, por causa da atuação intensa do companheiro Edelson. Tínhamos uma base razoável, como já dei a entender, no Baneb, BB e BNB.

Por isso, tivemos que formar uma chapa com muitos colegas ainda sem preparação sindical e política, parte até desconhecida do núcleo central que veio a se firmar no decorrer da campanha. Três formavam este núcleo, conforme podem ser vistos na foto no alto da matéria:

Corinto Soares Joazeiro, do  Econômico, era o cabeça da chapa. Vinha dos remanescentes da oposição sindical desarticulada após o AI-5, indicado pela turma que era mais visível através do companheiro George Sá;
Vivaldo Ornelas era mais conhecido por sua atuação no antigo MDB, era também advogado e professor; durante a campanha da "chapa verde", nos momentos de tensão, costumava dizer: "A história não fala aos covardes", era seu bordão predileto; comumente se diz "dos covardes", mas ele dizia sempre "aos covardes"; morreu em 2010, aos 80 anos, em sua terra natal Santo Amaro (Foto: Internet)
Jornalista Ney Sá, da Assessoria do Sindicato, entrevista este blogueiro para compor a memória dos 80 anos da entidade (Foto: Rogério Almeida)
Vivaldo Ornellas, do BB, conhecido por sua militância político-partidária através do antigo MDB (que virou PMDB). Vinha de uma candidatura a suplente de senador junto com o candidato titular Clémens Sampaio (Clémens era identificado como do MDB “adesista”, que na época detinha a hegemonia no MDB baiano);

E eu, do Baneb (já trabalhando também como jornalista), o único da chapa – pelo menos que eu saiba - que era “organizado”, como dizíamos, isto é, era militante dum partido clandestino de esquerda (no caso o PCdoB).

Hoje, olhando à distância e friamente, creio que não tínhamos chance de vencer o pleito. Mas, como “seguro morreu de velho”, Torres e seus asseclas - exemplos de aproveitadores civis da vigente tirania militar -, não quiseram correr o risco: nos jogaram pra escanteio, “vetaram” a “chapa verde” e ganharam com chapa única. Aliás, com certa dificuldade, pois tiveram que fazer uma segunda convocação, já que na primeira não houve quorum suficiente. Atribuíram o veto a uma autoridade naquela fase inalcançável: os “órgãos de segurança”, assim no plural, de materialização impossível.

Esta é a segunda das três partes do relato mais amplo que escrevi sobre a experiência da Oposição Bancária da Bahia, relativa ao período de 1972/1975, do qual participei diretamente. Escrevi instigado a partir dum pequenino texto e depoimento pedidos pela direção do Sindicato dos Bancários da Bahia, no bojo dos preparativos da comemoração dos 80 anos da entidade, cujo evento principal está marcado para a sexta-feira, dia 22, às 20 horas, no Bahia Café Hall (Avenida Luis Viana Filho, s/n - Paralela).

A primeira parte foi postada aqui na segunda-feira, dia 18, e a última será publicada na sexta, dia 22.

Comentários

Anônimo disse…
Achei o texto e a história excelentes. as fotos também.

Fabiano
Zé Paraiba disse…
Jadson e Geraldo Guedes produziram crias em suas ações políticas. Sou um desses rebentos. Nos idos de 1978,79, incomodado com a inépcia do Sindicato dos Metalúgicos diante de problemas enfrentados pelos trabalhadores, busquei usufruir do conhecimento destes dois companheiros, para, juntamente com outros operários, tentarmos tomar o nosso sindicato das mãos dos pelegos. Essa primeira tentativa foi frustrada, porém, em 1982, conseguimos derrotar Manoel dos Santos et caterva. Para mim foram fundamentais as lições passadas por Jadson e Geraldo que me tinham como simpatizante do partido que representavam: o PCdoB.
Zeparaiba
Zé Paraiba disse…
Jadson e Geraldo Guedes produziram crias em suas ações políticas. Sou um desses rebentos. Nos idos de 1978,79, incomodado com a inépcia do Sindicato dos Metalúgicos diante de problemas enfrentados pelos trabalhadores, busquei usufruir do conhecimento destes dois companheiros, para, juntamente com outros operários, tentarmos tomar o nosso sindicato das mãos dos pelegos. Essa primeira tentativa foi frustrada, porém, em 1982, conseguimos derrotar Manoel dos Santos et caterva. Para mim foram fundamentais as lições passadas por Jadson e Geraldo que me tinham como simpatizante do partido que representavam: o PCdoB.
Zeparaiba