AMÉRICA LATINA: O SONHO HISTÓRICO DA INTEGRAÇÃO SOBERANA




Por Theotonio dos Santos (parte final de artigo reproduzido por Carta Maior e Vi o Mundo. O título acima é deste blog)

Abre-se pois um contexto cada vez mais favorável para a integração regional. Falta, contudo, que as nossas Universidades e o nosso ensino em geral tomem a sério o seu papel na criação de uma consciência regional.

Da grande imprensa podemos esperar pouco. Ela é propriedade das mais retrógradas oligarquias regionais que se opõem radicalmente à integração regional e a um avanço da integração regional a qualquer custo.

A oligarquia tradicional e a oligarquia financeira que tem especial interesse na dispersão dos interesses regionais a favor dos centros de poder financeiro mundial, se parecem muito claramente às oligarquias regionais que, nas portas da independência da região, continuavam prisioneiras da submissão aos impérios ibéricos.

Estes setores econômicos estão cada vez mais ausentes das necessidades da população de seus países e tendem a perder liderança diante de um enfrentamento sério com ela.

Está na hora das forças progressistas da região se unirem para promover um novo estilo de desenvolvimento sócio-econômico, ecologicamente sustentável, com profundo sentido social e humano.

Para isto, além dos avanços políticos e econômicos, tem que criar e articular uma imprensa escrita, falada e virtual que cuide dos interesses da região e dos seus povos.

O exemplo da Telesur tem demonstrado a utilidade desta proposta, apesar do pouco apoio que recebeu de governos como o brasileiro.

As tarefas são cada vez mais complexas, mas isto é uma consequência dos avanços que tivemos. Pois, enquanto avançamos moderadamente na integração das zonas de predomínio de políticas de altas concessões ao nosso passado colonial e à decadente ofensiva neoliberal, vemos a própria CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) reconhecer os resultados positivos alcançados pela ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América).

A união dos países de orientação socialista na região, inspirados sobretudo na cooperação e solidariedade, apresenta uma vantagem derivada da unidade política dos mesmos e do peso de suas políticas públicas em todos os campos.

Para espanto dos economicistas “realistas”, apoiados no individualismo possessivo do século XVIII, são os “idealistas” e românticos coletivistas os que apresentam melhores resultados.

Eles não aprenderam nada com a vitória do Socialismo sobre o Nazismo na Segunda Guerra Mundial, que afetou tão intensamente as políticas econômicas do pós-guerra e o Movimento de Libertação Nacional anticolonial e antiimperialista.

Voltaram nos anos 70 do século passado com sua carga reacionária a favor do “livre” mercado e do chamado “estado mínimo” e com o canto de sereia do “equilíbrio” dos fundamentos do mercado como o grande objetivo econômico.

Depois de reinarem por 30 anos entraram numa crise definitiva: o legado de suas políticas foi um estado devedor máximo, submergido numa crise fiscal colossal para defender a sobrevivência de uma esfera financeira especulativa que vive às custas da transferência de recursos públicos; nos entregaram um mundo de crises econômicas e de déficits comerciais, fiscais e anarquia monetária.

Se não deixarmos que nos tomem as reservas financeiras que acumulamos nos últimos anos e aplicarmos nossos recursos na criação de um poderoso mercado regional, sustentado por umas políticas industriais que reestruturem nossa participação na divisão internacional do trabalho, ao lado das zonas emergentes no mundo, estaremos prontos para dar um salto civilizatório que nos coloque na frente da articulação de uma nova economia mundial.

Esta afirmação teria que ser complementada com novos estudos sobre as mudanças civilizatórias que se impõem no mundo contemporâneo.

Eles criaram, portanto, as condições para estabelecer uma grande frente – similar à que se criou a partir de 1935 contra o fascismo e pela participação de um Estado de base popular na atenção das necessidades humanas.

As interações regionais são uma parte essencial desta mudança política ao espalhar por todo o mundo uma nova fase de desenvolvimento científico e tecnológico na qual as novas nações poderão exercer um papel cada vez mais ativo. A promessa dos BRICAS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) de se converterem em pólos econômicos cada vez mais importantes se torna realidade a cada dia.

A crescente incorporação do Brasil nesta frente mundial e latino-americana, tão desprezada historicamente pela nossa oligarquia, é um fator decisivo para viabilizar este projeto histórico.

E uma América Latina unida poderá muitas vezes mais. Se as oligarquias não estão dispostas a cumprir este papel, os setores populares não duvidarão um só instante em assumi-lo. Esta é a tarefa fundamental para transformar em realidade o sonho histórico de nossos antepassados. 

(Para  ler todo o artigo, clique: Theotonio dos Santos: Doutrina Monroe vs. Bolivarismo)

*O texto completo foi publicado em espanhol no número 480-481 da revista da Alai: América Latina em Movimento, Quito, novembro-dezembro 2012.

Theotonio dos Santos é professor emérito da Universidade Federal Fluminense e presidente da Cátedra Unesco sobre Economia Global e Desenvolvimento Sustentável. Mais informações em theotoniodossantos.blogspot.com.br

Comentários