DESCRIMINALIZAÇÃO DO ABORTO: CONQUISTA DA MULHER CUBANA DESDE A VITÓRIA DA REVOLUÇÃO



Xiomara González: importância da capacitação da população e os cuidados com a saúde da mãe (Foto: Jadson Oliveira)

De Havana (Cuba) – A descriminalização do aborto, um direito pelo qual lutam as mulheres da América Latina e que acabou de ser reconhecido no Uruguai, é uma já velha conquista das cubanas, desde o início da década de 60 do século passado, com a institucionalização da revolução socialista após a vitória dos guerrilheiros comandados por Fidel Castro em 1º. de janeiro de 1959. Pode-se dizer que foi um “parto natural” no bojo dos avanços sociais garantidos em conseqüência do triunfo revolucionário, em benefício especialmente das camadas mais pobres da população, ou seja, da grande maioria.

 

Xiomara González, engenheira com mestrado em Comunicação Social, que é delegada da Federação das Mulheres Cubana (FMC), no bairro de Príncipe, em Havana, informa que se trata de uma questão inserida na política de saúde pública, cuja assistência em Cuba, como se sabe, é totalmente gratuita. É um item no capítulo da emancipação da mulher, como vários outros itens assegurando a educação dos filhos, a incorporação ao trabalho em igualdade de condições com os homens, com destaque aí para as mulheres camponesas, etc, etc.

 

“É um direito da mulher decidir e planejar sua descendência”, diz a representante da FMC ao lembrar a regulamentação contida no Código da Família. As mulheres grávidas são atendidas na rede de hospitais maternos e, nos casos de solteiras e de menores de idade, merecem um tratamento especial das assistentes sociais. Ela frisou a importância da capacitação da população e os cuidados com a saúde da mãe ao se decidir pela interrupção da gravidez.

 

No Brasil predomina o império da hipocrisia

 

Apesar de ser uma conquista já antiga em Cuba, a descriminalização do aborto na América Latina é um sonho ainda bem distante de se tornar realidade. Conforme noticiou o jornal argentino Página/12, edição de 18 de outubro último, o Uruguai veio se juntar a um pequenino grupo de países que reconhece o direito – racionalmente elementar – da mulher decidir o que fazer do seu próprio corpo. Além dos dois, apenas mais dois “latino-americanos”: a Guiana (antiga colônia inglesa, tem portanto o inglês como idioma) e o Porto Rico, que fala espanhol, mas é uma “colônia” dos Estados Unidos.

 

Países como o Brasil e a Argentina, mais desenvolvidos pelo menos do ponto de vista da economia capitalista, continuam atrasados nessa questão, sendo que as entidades feministas argentinas têm avançado mais nos debates e mobilizações. No Brasil não se vê qualquer avanço: ao contrário, na última eleição presidencial (2010) houve uma tenebrosa discussão do assunto, com a prevalência de posições medievais de setores religiosos, na busca de vantagens eleitorais para o candidato mais à direita (no caso, José Serra, do PSDB, que incorporou bandeiras ultra-direitistas na tentativa desesperada de vencer o pleito).

 

(Atente para o absurdo: as entidades que defendem a descriminalização não pedem uma legislação que mande fazer aborto ou obrigue a fazer aborto. Não. Defendem simplesmente que possa fazer aborto quem optar pelo aborto, uma decisão pessoal, sem criminalização. E com assistência médica do serviço público de saúde – uma questão de saúde pública -, para evitar que as mulheres pobres, ou seja, a grande maioria, morram ou sejam estropiadas em lugares clandestinos e precários. Na verdade, predomina o império da hipocrisia, próprio do capitalismo: quem tem dinheiro faz aborto sem qualquer risco, quem não tem se fode).

 

Chile ainda sob a legislação de Pinochet

 

Ainda sobre a América Latina e de acordo com a matéria do Página/12, o México tem uma situação peculiar: cada estado conta com seu Código Penal e todos permitem o aborto em casos de violação. Já no Distrito Federal (Cidade do México), desde 2007 foi autorizado o aborto até a 12ª. semana de gestação, com acesso ao serviço público de saúde. Segundo dados difundidos em abril último, na capital mexicana mais de 77 mil mulheres solicitaram abortar sob o amparo da lei.

 

Na Colômbia, a Corte Suprema sentenciou em 2006 como não puníveis os abortos nos casos de gravidez por violação, má formação do feto e risco de vida da mãe, mas o Congresso colombiano está dividido diante da decisão judicial.


Chile e Surinam – ainda conforme o jornal argentino – são os únicos países sul-americanos que punem a interrupção da gravidez em todos os casos. Em 2012, o Senado chileno rejeitou três projetos de lei que propunham restabelecer o aborto terapêutico, suprimido em 1989 pelo ditador Augusto Pinochet. El Salvador, Haiti, Honduras, Nicarágua e República Dominicana completam o grupo de sete países onde o aborto está totalmente proibido.

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