A LUTA NA AMÉRICA LATINA POR UM JORNALISMO COMPROMETIDO COM A REVOLUÇÃO



Mesa da abertura do congresso: os dois do meio (roupa escura) são o argentino Juan Carlos Camaño, mantido presidente da Felap, e Andrés Izarra, ministro da Comunicação e Informação de Chávez (Foto: minci.gob.ve)
De Caracas (Venezuela) – Um jornalismo comprometido com a democracia, com os direitos humanos, com a ética e a verdade, e também anti-capitalista e anti-imperialista, comprometido com o socialismo e apoiando as lutas populares de todo o mundo. É muita coisa boa num só balaio. Por enquanto, é um sonho, uma utopia, levando em conta a realidade da maioria dos países na América Latina e Caribe (e no mundo). Mas é o jornalismo buscado pela Federação Latino-americana de Jornalismo (Felap – o “p” é de periodismo, em espanhol), que fez na capital venezuelana, no último final de semana, dias 1 e 2, seu XI Congresso.

Trata-se da comunicação anti-hegemônica, que já disputa posições em países da região, como Argentina, Bolívia, Equador e, com mais força, na Venezuela. A expressão organizativa desse avanço aqui, no bojo da chamada revolução bolivariana liderada pelo presidente Hugo Chávez, é a Plataforma dos Jornalistas, organização formalizada recentemente que foi recebida pela Felap, durante o congresso, como legítima representante dos “periodistas” venezuelanos.

O representante tradicional da categoria aqui é o Colégio Nacional dos Jornalistas, mas a entidade foi expulsa da Felap em 2003, acusada de apoiar o golpe de abril de 2002 contra Chávez. A entidade foi criada em 1976 por jornalistas, em sua maioria, exilados, ou seja, perseguidos pelas ditaduras militares que grassavam pela América Latina. Daí é mais fácil entender o seu apego radical aos princípios democráticos.
Freddy Fernández no encontro que formalizou a criação da Plataforma dos Jornalistas da Venezuela (Foto: agenciasulan.org)
Está na cara que a direção da Plataforma – e certamente a grande maioria dos associados – é afinada com o chavismo e defende – e em certa medida já pratica – um jornalismo contra-hegemônico. Perguntei a Freddy Fernández, a principal liderança da entidade (ele é presidente da estatal Agência Venezuelana de Notícias – AVN e foi eleito no final do encontro para compor a direção da Felap), como é isso de representar apenas um espectro ideológico e político da categoria, os de esquerda; argumentei que no Brasil, por exemplo, onde a hegemonia da direita (dos monopólios privados) na comunicação é arrasadora, a Federação dos Jornalistas é a única representação da categoria.

Falamos um pouco das centrais sindicais: aqui há a Central Socialista dos Trabalhadores, afinada com o chavismo, e há outras. No Brasil também há várias centrais com as várias nuances políticas e ideológicas. Bem, conclusão, a realidade geralmente é mais complexa do que aparenta. E Freddy observou que os comunicadores venezuelanos – aí ele inclui os milhares sem diploma universitário que militam na comunicação alternativa, comunitária e popular e têm abertas as portas da Plataforma – estão avançando na confrontação ante a hegemonia da mídia privada de direita, golpista e imperialista.

Explicou então que a realidade na Venezuela estava mudando, são situações novas e diferentes que surgem no dia-a-dia. “Estamos num processo revolucionário”, e citou Che Guevara: "Quando o extraordinário se torna cotidiano, é a revolução".

De fato, ao contrário da grande maioria dos países da região, como o Brasil e muitos outros, o governo bolivariano de Chávez já construiu um arsenal razoável de meios de comunicação públicos/estatais e incentivou a criação de centenas de rádios e TVs comunitárias (este blog está colhendo dados sobre isso).
Participaram dos trabalhos cerca de 60 jornalistas de 17 países da América Latina e Caribe (Foto: radiorebelde.cu)
A discussão sobre hegemonia e contra-hegemonia ou “a comunicação em disputa” foi, portanto, um dos dois temas principais do encontro. O outro foram as denúncias sobre ameaças e assassinatos de jornalistas, sendo os casos mais graves os do México, Honduras e Paraguai, os dois últimos depois dos golpes de Estado que derrubaram os presidentes Manuel Zelaya, em 2009, e Fernando Lugo, há pouco mais de dois meses.

Participaram cerca de 60 jornalistas de duas dezenas de organizações da América Latina e Caribe. Havia delegados de 15 países: Cuba, Brasil, República Dominicana, Porto Rico, Argentina, México, Bolívia, Equador, Panamá, Peru, Guatemala, Nicarágua, Chile, Uruguai e Venezuela. Participaram também jornalistas de Honduras e Paraguai, dois países que ainda não estão formalmente incorporados à Felap. Do Brasil participou Ayoub Ayoub, professor de Comunicação da Universidade Estadual de Londrina (estado do Paraná), representando a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj).

A seguir, a declaração oficial do encontro:

“Contra o terrorismo de Estado, o terrorismo de mercado e o terrorismo midiático”

(Esta é a Declaração de Caracas, divulgada sob a consigna: “Nossa comunicação jamais será censurada”. O título acima é deste blog. Como não encontrei na blogosfera uma versão em português, tive que traduzir)

“Reunidos nos dias 1 e 2 de setembro de 2012, em Caracas, República Bolivariana da Venezuela, as delegadas e delegados ao XI Congresso da Federação Latino-americana dos Jornalistas (FELAP, o “P” é de Periodistas, em espanhol), inspirados em seus princípios fundacionais, em suas experiências de resistência de quatro décadas e no rumo que marca o processo de integração dos povos da América Latina e do Caribe neste presente histórico, se expressaram em defesa da vida e contra o terrorismo de Estado, o terrorismo de mercado e o terrorismo midiático.

Nesse marco, de claro compromisso de luta pela verdade, contra a mentira organizada, se produziu - entre outras decisões de conteúdo estratégico - o ingresso da Plataforma dos Jornalistas da Venezuela às fileiras da FELAP, sublinhando-se de tal forma o reconhecimento não só às e aos jornalistas venezuelanos, como também ao processo de mudanças profundas de caráter econômico, social, político e cultural que produz e impulsiona - também na América Latina e no Caribe -, a Revolução Bolivariana.
Nelson del Castillo, de Porto Rico, quando dava os últimos retoques na redação da "declaração" (Foto: Jadson Oliveira)
O XI Congresso fixou especial atenção nas graves ocorrências de ameaças, assassinatos e desaparecimentos forçados de que padecem os jornalistas, jornalistas comunitários, trabalhadores da imprensa e comunicadores sociais, em países como México, Honduras e Paraguai, onde se recria, num círculo perverso, o crime e a impunidade: em mãos das multifacéticas expressões do crime organizado. Neste aspecto se concordou que existe o silêncio cúmplice dos fatores de poder, somados às distorções que a grande imprensa faz acerca das origens da violência institucionalizada.

Frente a essa realidade, o XI Congresso destacou o importante trabalho desempenhado pela Comissão Investigadora de Atentados a Jornalistas (CIAP-FELAP), a qual será reforçada com a designação dum maior número de correspondentes por país.

A respeito do papel da grande imprensa - monopólios nacionais e transnacionais -, o XI Congresso pôs ênfase em denunciar as políticas que, por ordem dos interesses dominantes, manipulam de maneira massiva a informação e a comunicação com o propósito de criar condições objetivas e subjetivas que preservem os interesses de setores privilegiados da sociedade. E muito especialmente nesta época com a finalidade de desestabilizar os processos de libertação dos povos da América Latina e do Caribe.

O XI Congresso ratificou decisões tomadas nos congressos de Pátzcuaro, México 2003, e Villa Gesell, Argentina 2007, em favor dum maior desenvolvimento dos meios contra-hegemônicos, criando plataformas tecnológicas de maior alcance e superiores níveis de capacitação e formação, assumindo o desafio de crescer em termos de conteúdos e agendas informativas próprias.

Ao ratificar neste XI Congresso seu histórico compromisso de luta, a FELAP se propõe a somar forças mediante sua participação em todas as instâncias de integração regional, como a ALBA (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América), UNASUL (União das Nações Sul-americanas), Mercosul (Mercado Comum do Sul) e CELAC (Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos). Com tal determinação convocamos todos os jornalistas da América Latina e do Caribe a fazer realidade o sonho dos nossos libertadores e nossos povos.

Caracas, República Bolivariana da Venezuela
2 de setembro de 2012”

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