Jorge Félix, jornalista e pesquisador acadêmico: o grande problema que a categoria enfrenta é a precarização (Foto: Jadson Oliveira) |
Jorge Félix, jornalista experiente e estudioso das mudanças na área de comunicação social, autor de trabalhos acadêmicos, acredita que o pior mesmo é a precarização, argumentando, por exemplo, que as demissões são feitas em função dela. Ou seja, os demitidos, regra geral, são substituídos por outros profissionais, mas admitidos em piores condições, com salários mais baixos, jornadas mais extensas, extinção de benefícios, etc. Sem esquecer que as relações precárias de trabalho vêm sendo institucionalizadas desde as décadas de 80 e 90, com a hegemonia do “pensamento único”, o auge do neoliberalismo.
Então, no bojo de tal quadro, está a “pejotização” (PJ, o trabalhador passa a ser pessoa jurídica), com todas as distorções daí conseqüentes, como o abandono das conquistas da legislação trabalhista e o não pagamento da contribuição previdenciária (como estudioso do aumento do número de idosos na sociedade moderna, Félix considera importantíssimo este último aspecto. Ele se alarma com a existência de colegas de até 30 anos de idade que nunca pagaram a Previdência, “uma geração inteira totalmente desprotegida”, disse); está também o uso abusivo dos estagiários, que passaram a substituir profissionais das redações, em prejuízo dos que perderam a vaga, em prejuízo dos próprios estagiários, que têm sua formação deturpada, e em prejuízo dos leitores (receptores) das notícias, porque passam a receber informações de péssima qualidade.
(O tema foi objeto de abordagens entre os integrantes do movimento de oposição sindical. Pedro Pomar, por exemplo, foi enfático ao condenar “práticas ilegais” como o estágio, que serve como “docilização da mão-de-obra”, enquanto seu xará Pedro Malavolta defendeu “o valor pedagógico do estágio”, que seria útil desde que adotado sem as distorções vigentes).
Questão de fundo: a financeirização da economia
Voltando ao pesquisador da realidade atual das redações: Félix lembrou ainda o boom do que chamou revistas “customizadas” (semelhantes às “house organs”, mas dirigidas a um público externo), publicações de empresas e/ou grupos empresariais, cujas relações de trabalho transformam profissionais da imprensa em mão-de-obra precaríssima. Isso está ligado também à situação dos que trabalham como free-lancer (conhecido como “frila”) , relegados ao abandono do ponto de vista das garantias trabalhistas (CLT).
Para ele, na verdade, toda essa situação está assentada numa questão de fundo: as mudanças na economia mundial, os avanços tecnológicos, etc, etc. e, especialmente, a financeirização da economia – com a entrada em cena da dinheirama dos Fundos de Pensão -, que chegou também às empresas de comunicação e passou a afetar o trabalho dos jornalistas. Quer dizer, há um patamar de lucratividade que as empresas têm que atingir, regulado a partir da rentabilidade do mercado financeiro. O resto, dane-se.
Uma ideia que ele lançou para ajudar a enfrentar tal situação é a sociedade brasileira começar a lutar por uma legislação que puna severamente a sonegação das contribuições à Previdência. Ou seja: sonegar a Previdência num país como o Brasil, cuja população aumenta a cada ano seu tempo de vida, passa a ser crime inafiançável. “Dentro de uns 20 anos, quem sabe não chegamos lá?”, estimou.
Marilu Cabañas, Jorge Félix, Lúcia Rodrigues e Wladimir Aguiar durante debate no Espaço Cultural Latino-Americano (Ecla) (Foto: Jadson Oliveira) |
Apelo a uma maior participação para disputar a direção do sindicato
Apesar do pequeno número de participantes, as discussões se alongaram até passar da meia-noite (eram quase 21 horas quando se iniciaram). Comentaram também outras recentes demissões, como a de 22 colegas das redações do jornal e do portal Estadão, apesar da direção do Grupo Estado ter anunciado em janeiro o crescimento de 11% na venda de exemplares digitais e impressos do diário; mais 32 foram dispensados em março pela Editora Abril, que edita a revista Veja; o jornal Meia-Hora, do grupo Ejesa, foi extinto, o que resultou na demissão de 10 jornalistas; e ainda em março foram demitidos 22 do portal da Rede TV.
E criticaram acidamente os patrões e os chefes que se assumem como patrões, super-zelosos de suas carreiras, seus salários e seu poder, bem como os dirigentes atuais do Sindicato dos Jornalistas, os quais, segundo eles, têm uma atuação marcada pela conciliação com as empresas, tendo mesmo se antecipado ao pacto social que atualmente está na agenda do sindicalismo paulista. Manifestaram também uma visão crítica dos pendores individualistas dos colegas, que resistem bastante em participar de ações coletivas.
À guisa de conclusão, se é que se pode chamar assim, uma somente se impôs: intensificar o trabalho de esclarecimento e mobilização entre os colegas para que o Movimento Sindicato é Pra Lutar possa ganhar a direção da entidade representativa da categoria e passar a enfrentar os patrões de forma efetiva. “No ano que vem tem eleição”, lembraram.
DEMOCRACIA À MODA BRASILEIRA
Quando do anúncio esta semana da privatização de três aeroportos (Brasília, Guarulhos/SP e Viracopos/Campinas-SP), nosso destacado direitista Boris Casoy, da TV Band, não perdeu a oportunidade de tirar um sarro do governo. Comentou que a campanha presidencial de Dilma Rousseff demonizou as privatizações e os tucanos de José Serra não souberam defender a “excelência” da privatização das telecomunicações. E agora o governo de Dilma privatiza.
Daqui da minha tribuna, digo eu, que não sou nenhum direitista (muito pelo contrário, espero): durante a campanha eleitoral, o pessoal de dona Dilma e do nosso querido Lula pegou nosso voto alardeando uma coisa e hoje, no governo, faz outra. E não acontece nada. A gente fica com cara de idiota.
Um chato de plantão diria: isso não é democracia, isso é capitalismo, estúpido!
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