“IMPUNIDADE” NA COLÔMBIA


De Buenos Aires (Argentina) – Acabei de assistir a dois documentários: “Bahía Portete reparación comunidades indígenas”, de F. Urrego Lozano (produção colombiana), e “Impunity” (Impunidade), de Juan José Lozano (produção Suíça/França/Colômbia). Ambos compõem a extensa programação do XIII Festival Internacional de Cinema de Direitos Humanos, que está acontecendo aqui (de 19 a 25 de maio), com ênfase na Mãe Terra. O lema: “Si la Madre Tierra nos grita... escuchémosla!”. Bonito, não?


Ambos têm como foco a extrema violência política na Colômbia, violência detonada desde 1948 quando foi assassinado o líder político muito popular na época Jorge Gaitán. Um cenário que perdura até hoje e que foi exacerbado nos oito anos do governo de Álvaro Uribe, pau mandado do império estadunidense: assassinatos de opositores, de sindicalistas, de camponeses (estes últimos sempre anunciados como “guerrilheiros, terroristas”), milhares de famílias refugiadas, expulsas de suas terras, de suas comunidades, tudo misturado com políticos, empresários e autoridades governamentais e com a atuação de grupos guerrilheiros, paramilitares e narcotraficantes.


Uma mistura infernal. Numa palavra: terrorismo de Estado em plena vigência da “democracia”, sem necessidade de golpe militar, de ditadura, como foi moda nos países da América do Sul nas décadas de 60 e 70.


“Bahía Portete” é sobre a comunidade com este nome de descendência indígena, que foi vítima de um massacre em 18/04/2004, executado por paramilitares. Perdeu suas casas e terras e o restante sobrevive na vizinha Venezuela (estado de Carabobo). Luta agora para retornar com a ajuda da Comissão Nacional de Reparação e Reconciliação (CNRR).


Faixa exibida em recente manifestação de rua em Buenos Aires
(Foto: Jadson Oliveira)
“Impunity” faz uma abordagem mais geral da violência e da impunidade, pegando o processo de “desarmamento” dos grupos paramilitares durante o governo de Uribe. O filme fala de 48.000 desaparecidos (assassinados) e de quase 1.000 corpos identificados, isto até 2008. Os cartazes mostrados durante o debate que se seguiu à exibição dos documentários (vídeo acima) falam de 7.500 presos políticos e 250.000 desaparecidos.


Efervescência cultural e política


Falo sempre aqui no Evidentemente da agitação política na charmosa capital portenha. Mas a área que chamamos comumente de cultural (cinema, teatro, música, livros/livrarias/cafés, museus, etc) parece ser também muito rica. Pena que eu não acompanhe um pouco mais esta tal área cultural (uma amiga me disse: “Isso é uma deficiência dos militantes de esquerda da década de 60”. Acho que ela tem razão).


E tome festival! Só de cinema, além deste que falo acima, houve outros dois recentemente, tudo internacional. Um de cinema em geral, uma coisa escandalosa de grande e variado (não me dignei a ver uma só “película”), e outro de “cine político”. Neste vi dois filmes, cheguei a comentar no blog sobre o principal premiado (“Balibó”/Timor Leste, em 31/03/11).


Também recentemente (até 9/maio) houve o imenso Festival Internacional do Livro, 37ª. edição, um evento realmente gigantesco, bate longe a Bienal de São Paulo. Foi visitado, durante 19 dias, por 1.250.000 pessoas, segundo os organizadores. Foi aquele que deu a enorme polêmica política devido à participação do escritor peruano Vargas Llosa. Foi aqui pertinho de minha casa, em Palermo, na sede da Sociedade Rural Argentina (SRA). Estive lá uma vez, me admirei da dimensão das instalações e do burburinho de gente. Fiquei 25 minutos tentando localizar o salão de uma das dezenas de conferências (e lançamentos), quando finalmente localizei, estava superlotado, não me deixaram entrar (eu e outros).


A "Torre de Babel" argentina (Foto: Reprodução)
Buenos Aires até foi declarada pela Unesco como “capital mundial do livro 2011”. Nesta área apareceu inclusive a mostra de uma obra curiosa, da artista plástica argentina Marta Minujín: a chamada “Torre de Babel”, uma armação circular com 30.000 livros de variadas línguas (daí o nome) de 52 países, doados por embaixadas e outras entidades. Tinha 25 metros de altura, ficou armada até domingo, dia 22, na Praça San Martín. No dia em que estive lá, havia também, juntinho na mesma praça, um festival de tango. E tome festival! Me voy! (aliás, não, continuo aí embaixo, hoje tô que tô).




Matamos (1)


No Peru a campanha eleitoral está quente entre Keiko, a filha de Fujimori, condenado por assassinatos, seqüestros e torturas, e o centro-esquerdista Ollanta Humala. Em um debate televisivo, Keiko se negou a assumir o lema dos direitos humanos. Seu porta-voz explicou a razão: “Na luta contra o Sendero Luminoso (grupo guerrilheiro derrotado durante o governo de Fujimori) os maiores excessos foram cometidos nos anos 80, nos governos de Fernando Belaúnde e Alan Garcia. Nós matamos menos do que os dois governos que nos antecederam”.


(Notinha da capa do jornal argentino Página/12, da última sexta-feira, dia 20).




Matamos (2)


Nós - o Estado brasileiro, através das Polícias Militares - também matamos um bocado. Um bocado, não, muito. Principalmente jovens pobres e negros nas periferias das grandes cidades. Se é que “essa gente” conta. Na verdade, não conta. A chamada grande imprensa – ultimamente apelidada pelos “blogueiros progressistas” de velha mídia ou PIG (Partido da Imprensa Golpista), como gosta Paulo Henrique Amorim, do Conversa Afiada – nem se importa, às vezes dá uma notinha dizendo que “morreu numa troca de tiros ao resistir à prisão”.


Uma amiga, baiana morando em Salvador/Bahia, me contou que esteve uma noite numa delegacia de polícia para fazer a ocorrência de um carro roubado. Pra variar foi atendida mal, mas vamos ao que interessa. Lá pras tantas, chegaram uns policiais que estavam em diligência. Um deles entrou comentando: “Matamos três hoje”.




Tergiversando


1 - Filosofia do solitário:


Nada há a compartilhar. Cada qual é prisioneiro das suas próprias rotinas.


2 - Filosofia do aprendiz de cozinheiro:


Se não tivesse começado a aprender a cozinhar, ia morrer sem saber a utilidade de uma colher de pau.


3 - Filosofia do senso comum:


Não é o amor. É o sexo, estúpido!


4 - Filosofia do portunhol:


Falar o espanhol é falar o português destorcido. Hablar el portugués es hablar el español distorsionado.


5 - Filosofia do mortal:


Está apodrecendo um pouquinho mais a cada dia. É a inominada batendo à sua porta.

Comentários

Nil disse…
Olá

Conhecer este blog e rever o grande companheiro Jadson foi extremamente gratificante. A partir de hoje serei uma visitante assídua. O mínimo que podemos fazer é agradecer a esse companheiro pelo belo trabalho jornalístico que tem realizado e pelas grandes contribuições que tem prestado aos movimentos sociais dos tantos lugares por onde tem visitado. Bom demais!