LÍBIA, OBAMA, DILMA E O EXEMPLO DE TANCREDO


Por Beto Almeida – Presidente da TV Cidade Livre/Brasília (Reproduzido de Carta Maior, de 21/03/2011)


Foi um ultraje, um abuso, um desrespeito total ao povo brasileiro o fato de Obama ter usado o território brasileiro, e mais precisamente as dependências do Palácio do Planalto, durante audiência com a presidenta Dilma, para dar as ordens de ataque com mísseis à Líbia!

Não merece, em absoluto, o Prêmio Nobel da Paz, mas o da guerra!

Mas, o episódio, mais um para a coleção de atitudes desrespeitosas com o povo brasileiro que dirigentes dos EUA praticaram - a mais grave de todas foi o Golpe de 1964, organizado a partir da Casa Branca que o pop star não mencionou -, nos faz reviver um outro episódio.

Eleito pelo Colégio Eleitoral, Tancredo Neves fez um giro por diversos países para comunicar a nova fase da política no Brasil a partir de 1985. O primeiro visitado foi os Estados Unidos. Recebido por Ronald Reagan, que na época sustentava criminosa agressão contra a Nicarágua por meio de sabotagens e de apoio a grupos terroristas chamados de “contras”, Tancredo ouve com paciência o presidente estadunidense discorrer sobre América Latina e, praticamente, solicitar ou assediar apoio brasileiro contra a Nicarágua Sandinista, por ele chamada de “expansão comunista-terrorista na região”.

Mineirice e soberania

Reagan só mais tarde foi compreender qual é a manha dos mineiros. Aparentemente, pelo comportamento de Tancredo na reunião privada, Reagan foi iludido acreditando que o mineiro estaria de acordo com os absurdos intervencionistas e criminosos que os EUA estavam lançando contra a Nicarágua. E por desdobramento, desrespeitando o povo brasileiro também convocando o Brasil para uma guerra contra um país irmão, a Pátria de Sandino.

Pois Tancredo deixou a Casa Branca sem dizer palavra e dirigiu-se ao Congresso. Aí sim, estava a caixa de ressonância de que precisava. Ao ser sabatinado por senadores e deputados, em meio a indagações protocolares, genéricas e as imbecilizantes de sempre, sem que ninguém lhe perguntasse, Tancredo declara alto e bom som para surpresa de todos, inclusive de sua assessoria que sequer fora avisada: “o Brasil não vai admitir uma intervenção militar estrangeira na Nicarágua Sandinista!!!”

O embaixador norte-americano no Brasil, um afrodescendente, ficou pálido com o que ouviu, segundo relato do experimentado jornalista José Augusto Ribeiro, assessor de imprensa de Tancredo, que também só naquele instante tomava conhecimento da postura do presidente brasileiro recém-eleito em defesa da autodeterminação dos povos, e, concretamente, em defesa do direito da Nicarágua de escolher seu modelo político soberanamente, reconhecendo seu sagrado exercício de independência.

Fidel e Tancredo

Imediatamente a declaração corajosa e soberana de Tancredo Neves, no Congresso dos EUA, minutos após ter se reunido com o presidente Ronald Reagan que lhe fez a proposta indecente, ecoava mundo afora pelas agências de notícias. Minutos depois um despacho das agências noticiosas chegava às mãos de Fidel Castro que estava à tribuna num Congresso Internacional Contra o Pagamento da Dívida Externa, em Havana, quando também havia acabado de advertir para o risco de uma intervenção militar norte-americana na Nicarágua. Fidel pára seu discurso, lê o telegrama com as declarações de Tancredo Neves e fulmina da tribuna: “invadir a Nicarágua é relativamente fácil, quero ver invadir o Brasil de Tancredo Neves!”

Sabe-se que, quando Obama foi interrompido por seu secretário à mesa de reunião com Dilma, ele deu a ordem de ataque que pode levar à morte milhares de civis líbios e destruir tudo o que foi construído pelo processo de transformações da Líbia. E, ato contínuo, teria comunicado sua decisão à presidenta Dilma, como a querer apoio ou adesão ao ataque. Dilma, segundo os relatos, teria recusado e declarado: “o Brasil é um país pacífico e não concordamos que a ação militar vá produzir os efeitos esperados”. Não aderiu. Mas não declarou publicamente.

Desrespeito ao povo brasileiro

Teria sido importante que Dilma, a exemplo do também mineiro Tancredo Neves, ecoasse esta declaração em cadeia de tv e rádio, enquanto Obama estivesse em território brasileiro. Era uma maneira de reprovar publicamente a abusiva atitude de Obama de usar o território brasileiro, em visita oficial, para determinar um ataque mortal contra um país com o qual o Brasil tem relações normais, incluindo a participação de empresas, técnicos e produtos no processo de transformação que levou a Líbia a ter o mais elevado Índice de Desenvolvimento Humano da África.

Aliás, envolto em profundo simbolismo e em sintonia histórica com as declarações de Tancredo Neves, está a recusa de Lula a comparecer ao almoço com Obama. Talvez esteja no gesto de Lula o que verdadeiramente Dilma e o Itamaraty queriam ou deviam dizer.

Sabemos que os primeiros mísseis lançados contra Trípoli destruíram um hospital e mataram 48 pessoas, inclusive crianças. As agências de notícias, controladas pela indústria bélica e pelo poder petroleiro com sanguinária voracidade pelo óleo negro líbio, continuam a mentir, agora dizendo que nenhum alvo civil foi atingido. (...)


(O artigo completo está em Carta Maior - www.cartamaior.com.br )


Comentários

"Foi um ultraje, um abuso, um desrespeito total ao povo brasileiro"

Absurdo é falar contra a guerra e ser um apologista da violência a partir de teorias abstradas da conspiração. Comentários como este, afirmando que uma pessoa (o representante de um Estado) é culpado diretamente pelo que acontece no âmbito militar do mundo. Errado é o Totalitarismo de países Africanos e Árabes e as pessoas que pensam que a cultura violenta e prejudicial aos direitos humanos deve ser preservada e contra a qual nós, ocidentais, não devemos nos insurgir.

"...a mais grave de todas foi o Golpe de 1964, organizado a partir da Casa Branca que o pop star não mencionou..."
Essa é a influencia do materialismo historico que vê em tudo uma justificativa para o movimento da historia. Como se tudo se repetice, bastando para tanto portar a bandeira norte americana. ideias como uma vez errado sempre errado. Mesmo se não existir nexo, os comunistas encontrarão algum.
Será que uma transição civil seria possível sem qualquer intervenção militar?
Será que algo assim (como uma transição pacifica) é possível numa cultura de ódio e violência? Ou somos ingenuos porque moramos no Brasil, um país tropical, onde as pessoas não morrerm na guerra contra outros países, mas nas mãos dos traficantes?
É quase certo que se os misseis não matarem, foices e martelos matarão nas guerras civis revolucionárias que duram muito mais tempo.

"...postura do presidente brasileiro recém-eleito em defesa da autodeterminação dos povos..."
A autodeterminação dos povos é uma maneira de compactuar com a violência e a injustiça. Foi isso que levou o alastramento do nazismo na Europa nos anos de 1940. É isso que permite mulheres serem apedrejadas no mundo árabe. Existe uma objetividade que faz falta no mundo: ninguém deveria sofrer ou morrer apenas para defender sua cultura.