FIDEL: “TEMOS QUE CONVENCER OBAMA A EVITAR A GUERRA NUCLEAR” (3ª. parte/final)

(Final da entrevista exclusiva de Fidel Castro ao jornal La Jornada, do México, a primeira concedida a um veículo impresso desde que uma diverticulite o obrigou a afastar-se da liderança do governo cubano, há quatro anos. Foi publicada na edição de 30 de agosto. Aqui no meu blog ela foi dividida em três parte: a 1ª. falou do “calvário” provocado pela doença e da condição de quase-morto a que chegou o entrevistado; a 2ª. parte abordou o imenso poder do uso das novas ferramentas da informática na luta contra os monopólios da comunicação, dominados pelo império e suas empresas transnacionais; e esta última é sobre as crescentes ameaças contra o Irã e o perigo do governo dos Estados Unidos apelar para as armas nucleares. A versão em português que reproduzo é de Carta Maior, com tradução de Katarina Peixoto. O título acima é deste blog e a foto é do jornal mexicano).

Por Carmen Lira Saade – do jornal La Jornada (México)

De Havana (Cuba) - Muitas vezes se acusa Cuba e em particular a você (Fidel Castro) de manter uma posição antiestadunidense rigorosa; chegaram até a acusá-lo de ter ódio dessa nação - digo-lhe.

— Não é nada disso – esclarece: por que odiar os Estados Unidos, se é apenas um produto da história?

Mas, com efeito, há uns 40 dias, apenas, quando ainda não tinha terminado de ressucitar, ocupou-se – para variar -, em suas novas Reflexiones, de seu poderoso vizinho.

“É que comecei a ver muito claramente os problemas da tirania mundial crescente – e se apresentou à luz de toda a informação que tinha, a iminência de um ataque nuclear que desataria a conflagração mundial".

Mas não podia sair a falar, a fazer o que está fazendo agora, indica-me. Apenas podia escrever com certa fluidez, pois não só teve que aprender a caminhar, mas também, em seus 84 anos, teve de voltar a aprender a escrever.

“Saí do hospital, fui para casa, mas caminhei, excedi-me. Depois tive de fazer reabilitação dos pés, para então conseguir começar a escrever de novo. O salto qualitativo se deu quando pude dominar todos os elementos que me permitiam tornar possível tudo o que estou fazendo agora. Mas posso e devo melhorar... Posso chegar a caminhar bem. Hoje, já te disse, caminhei 600 passos só, sem bengala, sem nada; e devo conciliar isso com o que subo e desço, com as horas que durmo, com o trabalho".

"Não quero estar ausente nestes dias. O mundo está numa fase mais interessante e perigosa de sua existência”

- O que há por trás desse frenesi no trabalho? O que mais que, depois de uma reabilitação, pode conduzi-lo a uma recaída?

Fidel se concentra, fecha os olhos como para começar a dormir, mas não... volta à carga: "Não quero estar ausente nestes dias. O mundo está numa fase mais interessante e perigosa de sua existência e eu estou bastante comprometido com o que venha a acontecer. Tenho coisas a fazer, ainda".

- Como o quê?

– Como a conformação de todo um movimento antiguerra nuclear – é ao que vem se dedicando desde a sua reaparição.

Criar uma força de persuasão internacional, para evitar que essa ameaça global se concretize representa um rumo, e Fidel nunca pôde resistir aos rumos.

“No princípio pensei que o ataque nuclear iria se dar sobre a Coréia do Norte, mas logo retifiquei, porque a China vetaria isso no Conselho de Segurança [da ONU]...”

“Mas o do Irã ninguém o fará, porque não há veto nem chinês nem russo. Depois veio a resolução (das Nações Unidas), e embora o Brasil e a Turquia tenham vetado, o Líbano não o fez e então se tomou a decisão”.

Fidel convoca cientistas, economistas, comunicadores, etc, a que deem sua opinião sobre qual pode ser o mecanismo mediante o qual se vai desatar o horror, e a forma que se pode evitá-lo. Até a exercícios de ficção científica os conduziu.

“Pensem, pensem!”, anima as discussões. “Raciocinem, imaginem!”, exclama o entusiasta professor em que se converteu, nestes dias.

Nem todo mundo compreendeu sua inquietude. Não são poucos os que viram catastrofismo e até delírio em sua nova campanha. A tudo isso tinha de acrescentar o temor que assaltava a muitos, de que sua saúde sofra uma recaída.

Fidel não para, e ninguém é capaz de sequer freá-lo. Ele necessita, o mais rápido possível, CONVENCER, para assim DETER a conflagração nuclear que –insiste– ameaça com o desaparecimento de uma boa parte da humanidade. Teremos que mobilizar o mundo para persuadir Barack Obama, presidente dos Estados Unidos, para que ele evite a guerra nuclear. Ele é o único que pode, ou não, impedir o botão de ser apertado.

Esta barbaridade pode se produzir em uma questão de dias; para sermos mais precisos, no próximo 9 de setembro

Com os dados que ele já detém como um expert e os documentos que avalizam o que diz, Fidel questiona e faz uma exposição arrepiante:

– Tu sabes o poder nuclear que alguns países do mundo têm, na atualidade, em comparação com a época de Hiroshima e Nagazaki?

Quatrocentas e setenta mil vezes o poder explosivo que qualquer dessas bombas que os Estados Unidos jogou sobre essas duas cidades japonesas tinha. Quatrocentas e setenta mil vezes mais! Sublinha, escandalizado.

Essa é a potência de cada uma das mais de 20 mil armas nucleares que – se calcula – há hoje em dia no mundo.

Com muito menos do que essa potência – com tão só 100 – já se pode produzir um inverno nuclear que obscureça o mundo em sua totalidade.

Esta barbaridade pode se produzir em uma questão de dias; para sermos mais precisos, no próximo 9 de setembro, que é quando vencem os 90 dias concedidos pelo Conselho de Segurança da ONU para que se comece a inspeção dos barcos do Irã.

– Acredita que os iranianos vão retroceder? O que imagina? Homens valentes, religiosos que veem na morte quase um prêmio...Bem, os iranianos não vão ceder, isso é certo. Vão ceder os ianques? E o que ocorrerá se nem um nem outro ceder? E isto pode ocorrer no próximo 9 de setembro.

Um minuto depois da explosão, mais da metade dos seres humanos terão morrido, a poeira e a fumaça dos continentes em chamas derrotarão a luz solar e as trevas absolutas voltarão a reinar no mundo, escreveu Gabriel García Márquez por ocasião do 41º. aniversário de Hiroshima. Um inverno de chuvas alaranjadas e furacões gelados inverterão o tempo dos oceanos e voltarão o curso dos rios, cujas espécies terão morrido de sede em águas ardentes... A era do rock e dos corações transplantados estará de volta à sua infância glacial...

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