“Marchas” e “bloqueos”

De La Paz (Bolívia) – Com quantas “marchas” e “bloqueos” (protestos, passeatas, fechamento de ruas) se faz uma democracia participativa? Me faço sempre esta pergunta ao topar, nas ruas centrais de La Paz, com mais uma manifestação. O protagonismo popular – sem qualquer indício de repressão policial – é uma marca notável no “proceso de cambio” (mudança) boliviano.


A última a que assisti, com minha maquininha digital a postos, foi promovida pelos vendedores ambulantes de produtos do Natal. Eles estão numa queda-de-braço, há mais de duas semanas, com o prefeito (“alcalde”) da cidade, de nome Juan del Granado, que este ano quer colocá-los num Campo Ferial (de feira). Os vendedores insistem em continuar em ruas centrais, especialmente numa chamada Figueroa.





Enquanto não se chega a um acordo – cada um dos lados se mostra até agora irredutível -, tome passeata, protesto e ruas “trancadas” (usa-se muito este termo) pela área central da cidade, principalmente a frente da sede da prefeitura (“alcaldía”), com muito barulho e gritos de palavras de ordem. A polícia se limita a controlar, dentro do possível, o trânsito de veículos, e a proteger a entrada do prédio da prefeitura.


Cruzada contra o voto cruzado

Já a penúltima manifestação que acompanhei por aqui – defronte do prédio do Correio, também no centro, saindo em seguida pelo Paseo El Prado – foi de partidários do presidente Evo Morales, dentro da campanha para as eleições do próximo dia 6. É a cruzada que os governistas (chamados aqui oficialistas) vêm empreendendo contra o denominado “voto cruzado”.

O que é isso? Como a força (a popularidade, o carisma, o mito) do Evo é avassaladora, a oposição está fazendo a campanha em favor do voto cruzado, ou seja, você vota no Evo Morales, tudo bem, mas para senador e deputado, você pode votar nos candidatos de outros partidos.

Evo Morales está jogando todo o peso de sua popularidade para alertar contra isso, chega a dizer nos comícios que o voto cruzado é traição ao “proceso de cambio”, mesmo porque, já com sua reeleição garantida, seu objetivo maior parece ser a obtenção da maioria de 2/3 do congresso.

Então, seus partidários saem às ruas brandindo cartazes (é pena que eu estava sem a máquina fotográfica) e gritando “Evo presidente, Zavaleta deputado” (o nome do candidato a deputado depende da circunscrição, no caso Zavaleta é da circunscrição 8 de La Paz); “Fora voto cruzado, carajo!”; “Pátria ou morte, Venceremos, carajo!” (Este “carajo” é muito usado aqui nas palavras de ordem, não tem nenhuma conotação pejorativa, condenável, o próprio Evo usa em discursos quando fala aos movimentos sociais).



Comentários

Anônimo disse…
Beleza de texto mais uma vez. Sentimos saudades, mas adoro ler seus textos de fora do país.

Quanto ao negócio do voto cruzado, me parece que é bom para uma democracia mais radical e agonística ter oposição forte. Mas se ela realmente é picareta e o povo realmente decide, então que seja.

Fabiano
oi jadson..
muito interessante el processo de cambio!
abraço!!
Anônimo disse…
Porra, companheiro!

Até Twitter você tem...
Realmente, o programa de inserção digital do "compi" Lula está dando certo.

Estive em Salvador e todos perguntam: quando será a sua volta... você faz falta!

Grande abraço,

Júnior (Filho de João Mago e D. Julia)
Jadson disse…
Fabiano, entre os candidatos de oposição (sete de oposição, oito ao todo), parece haver algumas diferenças (tem um inclusive que tem suas origens entre o movimento indígena/camponês, não sei bem qual é a sua divergência com o Evo), mas, pelo menos os que aparecem em segundo e terceiro lugares, parecem só ter compromisso com o passado sujo do neoliberalismo, das ditaduras, do entreguismo.
Jonas, Zoclinho, o tal do "proceso de cambio" aqui é uma bandeira de luta, é sinônimo da revolução boliviana, com o povo nas ruas, uma beleza, companheiro.
Grande Júnior, o xodó das "meninas" Almeida, não me "condene" pelo Twitter, a "culpada" é a minha editora, Joaninha, que vive me metendo nessas molequeiras, fico meio sem jeito pois não sei nem entrar na coisa.
No mais, um abraço, tô chegando no verãozão baiano, logo, logo, pronto, pronto, exibindo meu portunhol.