Confecom: tocar no poder intocável

João Brant falou sobre propriedade e concentração dos meios de comunicação



De Curitiba(PR) – O poder das grandes redes de comunicação no Brasil é intocável? Esta indagação me veio à mente ao assistir na quarta-feira, dia 22, palestra seguida de debate de João Brant (do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social) sobre propriedade e concentração dos meios de comunicação.

Pouco mais de 20 pessoas se dispuseram a desafiar a noite fria e chuvosa do inverno curitibano e foram à sede do Sindicato dos Trabalhadores da Educação (APP-Sindicato) participar do evento, parte da II Jornada pela Democratização da Mídia, organizada pela Comissão Paranaense Pró-Conferência de Comunicação (CPC/PR).

Mas o desafio é bem maior do que uma noite fria e chuvosa. Os ativistas dos movimentos sociais do Paraná se preparam para - nada mais nada menos – enfrentar o colosso chamado grandes corporações da mídia privada, no bojo da I Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), prevista para 1 a 3 de dezembro.

CONCESSÕES SÃO CAPITANIAS HEREDITÁRIAS - João Brant, que demonstrou grande domínio do assunto, expôs, com riqueza de conceitos e detalhes, o que podemos considerar um vazio de leis e forças capazes de fazer o antagonismo ao rolo compressor dos veículos de comunicação, especialmente as maiores redes de TV – Globo, a maior disparado com 50% da audiência, Record, Band e SBT.

Ele lembrou a movimentação de entidades da sociedade civil, como o Intervozes, para tentar estabelecer alguns critérios para renovação das concessões da Globo, Band e Record, vencidas em outubro de 2007. No caso da TV Globo, cuja concessão já foi renovada, o máximo que se conseguiu foi uma audiência pública na Câmara dos Deputados, à qual os representantes da emissora nem se abalaram para comparecer.

João Brant, do Intervozes, e Carmelita Berthier, do Projeto Casa Brasil
Em 2011 vencem as concessões das redes SBT e Rede TV e espera-se que os movimentos sociais – vítimas da criminalização imposta pela grande imprensa – possam ter uma atuação mais firme, levando em conta inclusive avanços pretendidos na primeira Confecom. As concessões de TV são de 15 anos (as de rádio, batizadas de outorgas, são de 10 anos). Isto, formalmente, porque na prática, no Brasil, podem ser encaradas como eternas, feudos, capitanias hereditárias.

Como quase nenhuma autoridade ou órgão público demonstra coragem de peitar o poderio ideológico, político e econômico das corporações da mídia, tais concessões são, na prática, renovadas automaticamente. João Brant, revelou, por exemplo, que 36 das 39 rádios FM de São Paulo operam atualmente com outorga vencida, autorizadas através da chamada licença precária.

OUVINTES E TELESPECTADORES INDEFESOS - O Ministério das Comunicações é dirigido pelo ex-empregado da Globo, Hélio Costa, aliado incondicional dos empresários da mídia, cujo núcleo central é dominado por meia dúzia de famílias, os fazedores da cabeça da grande massa dos brasileiros, os verdadeiros donos da chamada liberdade de expressão.

Os acanhados avanços incluídos na Constituição de 1988 estão até hoje sem regulamentação, não há mecanismos de controle do conteúdo da programação, não há qualquer órgão de defesa dos ouvintes e telespectadores.

As rádios e TVs comunitárias, que poderiam ser incentivadas como contrapeso à influência avassaladora dos veículos privados, são perseguidas e seus dirigentes tratados muitas vezes como bandidos. O tratamento dado pelo governo federal às rádios e TVs comunitárias pode ser visto como um termômetro da fragilidade da nossa suposta democracia।


PROPRIEDADES CRUZADAS NA MÍDIA - O palestrante falou também do escandaloso cruzamento de propriedades dos meios de comunicação no Brasil – um mesmo grupo empresarial pode ter, simultaneamente, uma rede de TV, emissoras de rádio e jornais impressos. Tal absurdo é proibido ou tem limitações em países capitalistas como Estados Unidos, Inglaterra e França, onde há leis que limitam também outras formas de concentração, consideradas danosas à democracia.

Aliás, graças ao nosso incansável guerreiro cibernético, Heitor Reis, de Belo Horizonte, li matéria e vi o vídeo da pancadaria, ocorrida nesta quarta-feira, dia 22, no parlamento da Coréia do Sul, onde a maioria governista conseguiu aprovar emenda que autoriza a tal propriedade cruzada. Os filhos de Roberto Marinho, que são donos da Rede Globo, jornal O Globo e não sei mais o quê, poderiam comentar risonhos: “Ah, isso é coisa normal na democracia brasileira!”

João Brant falou muito mais e, ao final, respondeu várias perguntas e comentários, sob a mediação de Carmelita Berthier, do Projeto Casa Brasil, um projeto de inclusão digital do governo federal. (Um palpite pessoal deste repórter: creio que sem mobilização popular, sem o povo nas ruas, os movimentos sociais vão sair da Confecom de mãos vazias).

Quem quiser conhecer mais sobre o tema é só acessar http://www.intervozes.org.br/ e http://www.direitoacomunicacao.org.br/ .

SISTEMA PÚBLICO DE COMUNICAÇÃO – A II Jornada pela Democratização da Mídia continua no próximo dia 8, um sábado, a partir das 9 horas, sempre na APP-Sindicato. Será sobre Desafios do sistema público: a complementaridade necessária, com palestra de Jonas Valente, também do Intervozes - Coletivo Brasil de Comunicação Social. A programação, iniciada em 11 de julho, se estende até 5 de setembro, com mais dois debates: Digitalização e convergência das mídias e Universalização da banda larga, inclusão digital e Internet. A CPC/PR realizou a primeira jornada no mês de abril.

Comentários

Dyener Fracaro disse…
Companheiro Jadson:
Mais uma boa reportagem sobre o poder da mídia em nosso país. À quem relmente serve os grandes monopólios da comunicação no brasil? À serviço de que interesses está a imprensa marrom?
Qual é o papel do Estado nesta luta ideológica e no enfrentamento ao monopólio da comunicação exercido por alguns pequenos grupos vinculados a interesses estranhos ao povo brasileiro?
É pra se pensar. É pra se enfrentar e combater!
Saudações Revolucionárias!

Dyener Fracaro

"Há homens Que Lutam Um Dia, E São Bons; Há Outros Que Lutam Um Ano, E São Melhores; Há aqueles Que Lutam Muitos Anos, E São Muito Bons; Porém Há Os Que Lutam Toda A Vida. Estes São Os Imprescindíveis."
Bertold Brecht
Jadson disse…
Certo, companheiro Dyener, podemos estar seguros de que os monopólios da mídia podem estar servindo a tais ou quais senhores, nunca ao povo brasileiro.
A raiz dessa mazela,creio, está na falta do povo nas ruas.
Abraços.
parabens... como o Dyener disse: grande reportagem...
e ai companheiro. agora que voltei as aulas tenho acesso a internet e poderei acompanhar com mais freguencia seu blog... que como sempre muito bem escrito!!!
eu fico me perguntando: como seria possivel acabar com essa dominação? deve ter um jeito, não é mesmo?
um forte abraço!!
Anônimo disse…
Esse blog é realmente uma beleza. Como profissional de comunicação fico triste em reconhecer tudo isso como verdade. Mas como filho fico feliz por estes textos serem tão bons e esclarecedores. Espalhem a palavra!
Fabiano