Fórum Social até debaixo d'água



Fotos:Manoel Porto

A chuva – previsível nas tardes de Belém do Pará nesta época – não conseguiu estragar a animação das milhares de pessoas que abriram com um desfile carnavalizado o nono Fórum Social Mundial (FSM), nesta terça-feira, dia 27. Dança-se até debaixo d'água em busca de "um outro mundo possível", ou seja, em busca de alguma alternativa que supere o neoliberalismo ou mesmo o capitalismo.
Uma variedade espantosa de temas e "fantasias", marca já registrada de tais eventos, tomou conta de ruas centrais da capital paraense, dando o tom do que está por acontecer até primeiro de fevereiro. Os números divulgados pelos organizadores são eloquentes: participação de 100 mil pessoas e 5.680 organizações de mais de 150 países, em torno de 2.400 atividades programadas.
No início da marcha (na praça ao lado da Estação das Docas) houve exibição de rituais da cultura negra, como candomblé e capoeira. E no final (Praça do Operário, bairro de São Brás) foi a vez das delegações indígenas apresentarem denúncias, reivindicações e conquistas que vêm marcando seus 500 anos de resistência.


O jeito de ser
Quem ficasse de lado observando a passagem dos "blocos", ao som de marchas de carnaval e muita batucada, com chuva e sem chuva, gente de caras e idiomas diversos, poderia até se perguntar se tem como sair alguma coisa séria de tanta balbúrdia. Mas sempre sai, é o jeito do FSM. E os gritos de guerra?
"Ei, ei, ei, Jesus é nosso Rei", ouve-se o bordão dos evangélicos; "Não somos só bunda e peito", gritam as componentes da Marcha Mundial das Mulheres defendendo o direito ao aborto, enquanto os da luta pela moradia recitam "ocupar, resistir prá morar" e outros anunciam: "Te liga, oh estrangeiro, a Amazônia é do povo brasileiro".
Um desfile de irreverência, exotismo e variedade nas palavras de ordem e nas indumentárias। Operários da construção civil vêm ostentando as bandeiras do PSTU e da Conlutas (central sindical), "contra a crise capitalista a solução é o mundo socialista". A turma do PC do B segue, com caro de som, divulgando suas lutas e a CTB (outra central sendical). O PT também está presente com grande delegação, assim como o Psol.

"Eles matam e desmatam"
Agora são bandeiras de Cuba que tomam a avenida e a faixa é "contra o bloqueio americano a Cuba"। Seguem a Frente Nacional dos Petroleiros, a Força Sindical e a CUT. Depois um ônibus com a "Caravana dos DJ'S", a "Aldeia da Paz" brigando contra a guerra e a pobreza e um grupo de teatro de Recife formado só de mulheres, com pouca roupa, fantasiadas de onça - "Loucas de Pedra Lilás" - com refrões como "eles matam e desmatam".

Aparece ainda a Liga Brasileira de Lésbicas, faixas condenam a redução da maioridade penal e saúdam a Lei Maria da Penha e a "saúde pública universal". Presente a luta dos povos de Rondônia contra barragens no Rio Madeira. Um grupo animadíssimo, com orquestra e tudo mais, exalta "beber e cair".
E o desfile continua (um oficial da PM calculou que havia mais de 50 mil pessoas): "Povo do Iraque e Palestina, sua luta continua na América Latina", um cartaz mostrava uns terroristas, pingando sangue, no centro a cara do ex-presidente dos Estados Unidos, George Bush. Seguiam as feministas "contra o machismo, contra o capital, contra o terrorismo neoliberal".
Um "bloco" fazia muito barulho e sucesso: "Chega de Sarney, xô Sarney, ninguém aguenta mais", dizendo falar em nome de várias entidades do Maranhão e Amapá। Um boneco com aquele bigode inconfundível e outro representando a filha Roseana ilustravam o espetáculo. E mais: "Economia solidária, sociedade igualitária".

Guerreiros indígenas em
marcha



E enquanto guerreiros indígenas ensaiavam marchas e cantos de guerra, sob o assédio de fotógrafos e cinegrafistas, o Greenpeace exibia um enorme boneco de um boi, pregadas no corpo bandeiras de países que consomem carne bovina. Era a denúncia do processo de desmatamento da Amazônia para o cultivo de pastagens.
Nesta quarta-feira, dia 28, será iniciada a maratona de plenárias, conferências, palestras, oficinas e eventos culturais e esportivos. A programação dedica o dia ao Pan-Amazônia - "500 anos de resistência, conquistas e perspectivas afro-indígena e popular"-, com muitos assuntos regionais, mas também gerais, a exemplo de direitos humanos e luta contra a criminalização dos movimentos sociais.Os coordenadores do FSM acreditam que três temas vão predominar: crise financeira internacional, mudanças climáticas e alternativas aos modelos de desenvolvimento. Os trabalhos se dão nos campi da Universidade Federal do Pará (UFPA) e da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA).Lula e Chávez no FSMEspera-se a presença de cinco presidentes da América Latina: Lula, Hugo Chávez (Venezuela), Evo Morales (Balívia), Fernando Lugo (Paraguai) e Rafael Correa (Equador). Está previsto o encontro dos cinco na quinta-feira, dia 29, numa atividade paralela ao Fórum, no hangar do Centro de Convenções.

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