O ANTISSEMITISMO DE HITLER E O ANTIPETISMO DE MORO


Fabiano Viana Oliveira (Foto: da Internet)
Ressalvadas as proporções quanto à relevância histórica, o ódio aos judeus, que seriam culpados por tudo de ruim sofrido pela Alemanha, pode ser comparado à campanha contra o PT encetada a partir da Lava Jato.



Por Fabiano Viana Oliveira – professor na área de Ciências Sociais – trechos do livro ‘Em busca da verdade II – Bioética, hipocrisia e antipetismo’, páginas 77/78 e 86/87/88 (título e destaque acima são da edição deste blog)



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Em um paralelo histórico, que trago aqui mais por ser assustador que por ser acurado, o antipetismo pode ser identificado com o movimento antissemita dos anos 1920-1930. Note que a história do antissemitismo era (ou é) bem mais antiga e profunda, pois suas origens remontam ao Império Romano, mas o interessante como paralelo é o ódio gerado por conta de certos aspectos, em geral não justificáveis. Por exemplo, considerar os judeus como invasores recai na hipocrisia de negar que historicamente todos os povos foram ou são também invasores.

No caso específico da época em análise, a prática antissemita levou ao extremo do ódio e desumanização com os campos de concentração, de trabalhos forçados e de extermínio. Os judeus foram responsabilizados pelo discurso nazista por tudo de ruim que acontecera com a Alemanha, especialmente a crise econômica e a derrota na Primeira Guerra Mundial. Por mais que houvesse judeus ricos, banqueiros e financistas, que com certeza tinham se beneficiado dos processos sócio-econômicos correntes na época, não quer dizer que todos os judeus fossem automaticamente os responsáveis pelas mazelas da Alemanha no período entre guerras. Lembra um pouco também as expressões de Xenofobia que têm ocorrido no mundo de hoje (2018): sírios sendo hostilizados na Europa; mexicanos e árabes sendo hostilizados nos Estados Unidos; e venezuelanos e haitianos sendo hostilizados no Brasil.

Então, seguindo nosso paralelo, do mesmo modo foi sendo construído ao longo dos anos, especialmente dos últimos seis anos (2012-2018), a ideia de que tudo de errado que existe no Brasil é por culpa do PT: crime, violência, corrupção, inflação. Seria inclusive uma inviabilidade prática todos os males serem de responsabilidade de um único grupo, já que devido até à complexidade da sociedade brasileira, muitos são os grupos políticos que estão no poder ao mesmo tempo. Tentar reduzir tudo a só um grupo também causa a cegueira ou miopia em ver que outros grupos praticam as mesmas ações, já que grande parte dessas ações são integrantes de uma cultura político-administrativa tão intricadamente presentes na via institucional brasileira quanto a própria burocracia.

Pode-se hipocritamente também generalizar e culpar toda classe política, como é muito comum nestes tempos de desencantamento com a política e com os políticos e partidos. Mas já sabemos a essa altura que isso não resolve o problema, apenas o varre para debaixo do tapete. Pois estamos todos nós envolvidos com as práticas e costumes da política e da corrupção institucional no Brasil. Duvida? Essa declaração lhe ofende? Vamos então tentar analisar alguns exemplos históricos e trazer a antropologia e a literatura brasileira para por em questão a veracidade ou não do que afirmei.

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Quando Adorno e Horkheimer apontam a manutenção do pensamento mítico-religioso mesmo num ambiente de discurso científico predominante, isso faz lembrar o quão pouco realmente civilizados somos. Falando especificamente do Brasil, só uma argumentação nessa linha para se conseguir lidar com o comportamento coletivo dos brasileiros nos últimos 5 ou 6 anos (2012 – 2018), pois há uma similaridade muito incômoda entre este status vivente e o período de ascensão e supremacia do Nazismo na Alemanha entre os anos 1930 e 1940. Como já comparamos antes o antipetismo e o antissemitismo, talvez não seja preciso repetir os argumentos.


O discurso mítico embutido nos dois movimentos históricos em comparação mostra que há uma grande carência civilizacional em ambos os momentos. E note que são povos de características extremas de desenvolvimento técnico socialmente partilhado. Enquanto a Alemanha estava no topo ou auge de sua expressão técnica, à frente de todos os demais países em vários aspectos; o Brasil sempre foi e continua sendo a expressão do atraso grandioso, isto é, uma eterna promessa de grandiosidade reduzida à mediocridade por uma série de fatores históricos e culturais. Para saber mais sobre esses aspectos gerais da civilização brasileira, como expressão do atraso e da submissão a outros povos, sugiro a leitura de ‘O Povo Brasileiro’, de Darcy Ribeiro, e do mais recente ‘A Elite do Atraso’, de Jessé Souza.

A carência dos alemães naquele momento advinha da sua derrota na 1ª Guerra Mundial, mesmo estando em vantagem tecnológica, e, pior ainda, a imposição das nações vencedoras de uma indenização que determinaria a queda da autoestima de todo um povo, por questões geopolíticas anteriores à própria guerra, e que expunha muito mais a mesquinharia dos vencedores que a fragilidade dos perdedores. O discurso mítico nazista trazia um alento ao sofrimento e, sem dúvida, a convincente ideia de que havia um culpado: o outro. E de todos os outros, o mais fácil de ser responsabilizado: o povo judeu, mas mesmo que de fato banqueiros judeus tivessem lucrado com a derrota na guerra, não fazia sentido culpar todos os judeus pela crise e miséria do povo alemão.

Do mesmo modo que tão facilmente se convenceu que o PT e os petistas são os responsáveis por tudo de ruim no Brasil. Um discurso mítico tão injusto e falacioso quanto o do antissemitismo ou xenofóbico. Pois, por mais que existam petistas corruptos, não são somente estes, pois todo sistema burocrático brasileiro se mostra frágil à corrupção, desde muito antes de existirem o PT e os petistas. Só que diferente dos alemães, a nossa carência por lideranças parece advir de uma falha de projeto democrático, o qual foi sempre realizado de cima para baixo. Consultar e confiar nas escolhas populares sempre resvala no medo elitista de se perder o controle da máquina estatal para entes estranhos a essas próprias elites. Em parte, o antipetismo como expressão desse ódio de classe pode também ser identificado como ódio mais amplo à democracia.

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