PAULO KLIASS: O FINANCISMO É O ÚNICO SETOR QUE TEME A AUDITORIA DA DÍVIDA PÚBLICA

(Foto: José Cruz/Agência Brasil)
É urgente que essa verdadeira caixa preta, em que se transformaram as relações econômicas e financeiras envolvendo recursos públicos, seja aberta a todos.

Por Paulo Kliass (*) – Parte de artigo reproduzida do portal Carta Maior, de 20/01/2016 (o título acima é da edição deste blog)

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Quem tem medo da auditoria da dívida? Na verdade, só consigo imaginar a resistência tendo origem nos setores mais umbilicalmente vinculados ao financismo e aos seus mecanismos de apropriação dos rendimentos associados à armadilha da dívida pública. Eles são os únicos que teriam, eventualmente, alguma coisa perder com a transparência e o debate público. Não haveria razões para ter receio de compartilhar informações detalhadas a respeito de processos de formação de dívida pública, uma vez que são títulos que impactam de forma significativa as finanças públicas de qualquer país.

A simples existência de tal montante de dívida significa um mecanismo potencial de estímulo à concentração de renda e portador de desigualdades. Trata-se de uma reorientação de recursos orçamentários para o pagamento de juros e serviços financeiros, retirando-os das funções governamentais associadas às despesas sociais e aos investimentos. Os beneficiários da drenagem de tais gastos do Estado são muito reduzidos, ainda mais quando comparados às dezenas de milhões de famílias que são atingidas pelos gastos de natureza social universal. Esse fato revela-se ainda mais grave em conjunturas como a atual, quando o país chegou a direcionar mais de R$ 510 bilhões anuais para esse fim, valor próximo a 8,7% do PIB.

Dentre os argumentos apresentados por aqueles que manifestam algum temor quanto aos efeitos de eventual auditoria, encontramos os que consideram arriscado um caminho que pode levar a um “calote” da dívida ou a um resultado pífio, em razão das inegáveis dificuldades envolvidas no tratamento da matéria. Outros argumentam que o foco central deve ser apenas a redução dos juros e nem tanto a avaliação do estoque da dívida.

Impacto do volume da dívida e do nível da taxa de juros.

Excetuando-se as opiniões expressamente interesseiras dos diretores de instituições financeiras e dos consultores de mercado de capitais, pode-se até compreender as razões daqueles mais céticos quanto aos resultados de uma eventual auditoria. No entanto, o fato é que o tratamento da questão do impacto financeiro da evolução da dívida sobre a macroeconomia ocorre por duas vias. De um lado, pelo inacreditável patamar das taxas oficiais de juros tupiniquins e seu impacto sobre o serviço da dívida. É bem verdade que se a SELIC estivesse em níveis considerados “civilizados”, a quantidade de recursos públicos sugados para esse fim seria bem menor. No entanto, é inegável que o estoque atual da dívida é também fator essencial para essa disfunção das políticas públicas.

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(*) Paulo Kliass é doutor em Economia pela Universidade de Paris 10 e Especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, carreira do governo federal.


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