Oposição venezuelana comemorando a vitória (Foto: Internet/Dia e Noite no Ar) |
O chavismo viverá uma experiência inédita: Maduro terá que compartilhar a governança com o Congresso, agora com maioria opositora: a coalizão da chamada MUD (Mesa da Unidade Democrática) conseguiu inclusive a tão almejada “maioria qualificada”.
Por Jadson Oliveira - reproduzido do site Dia e Noite no Ar, de 08/12/2015
“É a economia, estúpido!”, diria o velho amigo José Crisóstomo, companheiro de lutas contra a ditadura. Professor de Filosofia que andou ultimamente pelos Estados Unidos estudando as complicadas – para mim – ciências econômicas, ele me disse há poucos dias: governo nenhum, seja de direita ou de esquerda, consegue se manter eleitoralmente se a economia está mal.
Teria sido isso o caso da Venezuela chavista? Parece que sim. É só lembrar a sua total dependência da renda do petróleo para se ter uma ideia das dificuldades. Ontem mesmo a cotação baixou mais um pouco, batendo os 40 dólares o barril. Me lembro que na minha primeira temporada por lá, ainda com o comandante Chávez a todo vapor, em 2008, o petróleo estava na casa dos 80 dólares e a inflação, que sempre esteve em patamares altos, caía pouco a pouco, ano após ano.
Nos últimos anos, ao contrário, a inflação se mostrava sem controle e a cotação do dólar no chamado “mercado negro” nas alturas. E mais, um fator fundamental: o desabastecimento de gêneros de primeira necessidade, gerado, segundo muitos analistas, pela nunca engatada cadeia produtiva – apesar de sempre anunciada pelos porta-vozes governamentais – e incrementado pela sabotagem e contrabando na chamada “guerra econômica”, como diz o governo.
Claro que este último aspecto nunca é nem será mencionado na imprensa hegemônica internacional. Na Globo do Brasil, no Clarín da Argentina ou na Televisa do México isso nunca será arrolado como agravante do desabastecimento. Esta arma surtiu muito efeito também – daí o exemplo sempre recordado – na conspiração do início dos anos 70 no Chile para a derrubada de Allende.
Para fechar o quadro da precária economia venezuelana é preciso dizer que ela está inserida na crise econômica mundial, não só na Venezuela (como não só no Brasil, como querem os noticiários e comentários da imprensa hegemônica). A crise está também, e sobretudo, nos países chamados centrais, inclusive na China, hoje a primeira economia do mundo e a principal parceira comercial de vários países da América Latina, inclusive, disparadamente, a Venezuela.
E por último, mas não o menos importante, quero realçar o papel do cerco midiático a partir das fórmulas disseminadas pelos laboratórios da CIA, a “inteligência” dos Estados Unidos. É o que os chavistas chamam de “terrorismo midiático”, gerador das “matrizes de opinião” (que poderia se chamar também “fabricador de consensos” ou “fabricador de consentimento”).
Tudo se molda num só discurso, numa única narrativa que produz a mágica de fazer com que um governo democrático seja considerado, por grandes parcelas da população mundial, uma ditadura. Democrático sim, porque promoveu 20 eleições em 17 anos, perdeu duas e reconheceu as duas derrotas sem qualquer hesitação: como fez o presidente Nicolás Maduro na madrugada da segunda-feira, dia 7, logo após ser anunciada a vitória da oposição nas eleições para a Assembleia Nacional, o Congresso Nacional de lá.
(Como fez também, por exemplo, a presidenta Cristina Kirchner, diante do anúncio da vitória de Mauricio Macri, da direita, na Argentina; e como não fizeram, por exemplo, o senador Aécio Neves no Brasil, que um ano depois da derrota ainda luta para derrubar, por um “golpe democrático”, a presidenta Dilma Rousseff; e a própria oposição venezuelana, que escancara sua face de golpista toda vez que perde uma eleição).
Bem, seja assim, seja assado, seja pela economia ou não, é a segunda derrota expressiva dos governos chamados progressistas na América Latina, desde que Hugo Chávez foi eleito pela primeira vez em 1998. A primeira foi na Argentina no mês passado. Parece configurar-se a tal “restauração conservadora”, segundo o alerta feito pelo presidente equatoriano Rafael Correa.
O chavismo viverá uma experiência inédita: Maduro terá que compartilhar a governança com o Congresso, agora com maioria opositora: a coalizão da chamada MUD (Mesa da Unidade Democrática) conseguiu inclusive a tão almejada “maioria qualificada”, ou seja, de 3/5 dos 167 deputados, conforme foi anunciado nesta terça, dia 8 (lá não existe Senado).
(Para maior ilustração: na Argentina, o kirchnerismo perdeu a presidência, mas mantém “maioria própria” no Senado – quer dizer, sua coalizão Frente para a Vitória tem a maioria diante de todas as outras bancadas somadas; e tem o que eles chamam a “primeira minoria” na Câmara dos Deputados – quer dizer, tem a maior bancada, comparando todas as bancadas separadamente).
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