BRASIL: A DISPUTA ENTRE DAVI E GOLIAS PELA NARRATIVA DA CRISE


Agência Brasil
(Foto: Carta Maior)

A revolta da varanda gourmet, que foi um festival de xingamentos machistas contra a presidenta, foi apresentada pela TV Globo como intensa e massiva.

Por Najla Passos, no portal Carta Maior, de 10/03/2015

Às vésperas do protesto convocado para o próximo domingo (15) por grupos diversos de oposição, a popularidade da presidenta Dilma Rousseff continua a revelar sinais de desgaste, que a imprensa tradicional teima em tentar transformar em crise irreversível. Na manhã desta terça (10), ela foi vaiada ao chegar ao Salão Internacional da Construção, em São Paulo (SP), tradicional reduto conservador do país. Antes dela chegar ao local da abertura do evento, o fato já era manchete nos principais sites comerciais.
 
Mais sintomática, porém, foi a cobertura da chamada ‘revolta da varanda gourmet’ que, na noite do domingo (8), se espalhou por bairros chiques das principais capitais brasileiras em um rompante de ódio contra a presidenta e seu partido. Enquanto Dilma fazia seu pronunciamento pelo Dia Internacional da Mulher, em cadeia nacional de rádio e televisão, a elite batia panelas das suas sacadas e lhe dirigia ‘palavras de ordens’ carregadas de machismo e preconceito, como “vaca”, “vagabunda” e “prostituta”.
 
Embora isolados, os episódios foram apresentados ao país, via o Fantástico da TV Globo, como intensos e massivos. Um movimento contrário àquele que marcou a não cobertura do Movimento Direitas Já, quando a emissora minimizava a força das ruas e transformava grandes manifestações populares em festejos localizados por motivos banais. Nos jornais do dia seguinte, a oposição e os colunistas que a servem criticavam a presidenta por fazer uso de 15 minutos das concessões públicas de rádio e TV para apresentar a sua versão dos fatos, enquanto nos meses em que ela andou em silêncio, a mídia se esmerou impune para construir uma visão apocalíptica da crise.
 
É fato que Dilma demorou a falar à nação. Só agora se dispôs a explicar o porquê das impopulares medidas de ajuste fiscal que baixou desde o final do ano passado e que atingem em cheio o bolso dos trabalhadores, especialmente dos mais pobres, que dependem de pensão do INSS, seguro desemprego ou seguro defeso. Justamente aqueles que votaram nela para fugir do projeto político tucano que, todos acreditavam, era muito parecido com o que hoje segue em curso.
 
A presidenta também não foi a público esclarecer as medidas que chegaram a triscar no “andar de cima”, mais recentemente, com a desoneração da folha e pagamento de 56 setores da economia premiados com descontos bilionários durante seu primeiro mandado. Muito menos, explicou ao país porque não optou por adotar medidas que façam com que os ricos paguem a conta da crise, como a taxação das grandes fortunas, prevista na constituição, mas jamais regulamentada.
 
O curioso é que, neste contexto, os protestos não explodiram nas periferias ou nas filas do INSS, mas sim nos bairros da elite que lê a revista Veja. E não veio em palavras de ordem contra a redução de direitos dos trabalhadores, mas sim na forma de xingamentos ceifados de preconceito e ódio. O estilo raivoso do protesto, tal como ocorreu na Copa do Mundo, virou assunto nacional e reacendeu a necessidade de todos encararem aquela tarefa hercúlea de entender o Brasil.

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