HUGO MULEIRO: A LUTA PELA COMUNICAÇÃO NA ARGENTINA

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(Foto: Carta Maior)

Os veículos do Grupo Clarín serviram-se do atroz ataque terrorista de Paris para manter a intensidade de sua campanha política em um ano eleitoral.

Por Hugo Muleiro (escritor e jornalista, presidente do coletivo Comunicadores da Argentina), no portal Carta Maior, de 18/01/2015

Os meios de comunicação argentinos com posição dominante, que constituem a força opositora principal ao governo da presidenta Cristina Fernández de Kirchner, serviram-se do atroz ataque terrorista de Paris para manter a intensidade de sua campanha política em um ano eleitoral.

O conglomerado de quase trezentos meios encabeçado pelo grupo Clarín, contando com canais de TV, estações de rádio, agência de notícia e portais de internet, e mais outros grupos aliados, tentou convencer seu público de que o governo de Buenos Aires simpatiza com o ato terrorista, e para isso recorreu a técnicas de descrição e interpretação repudiados pela ética jornalística.

Não se trata de uma confrontação pontual sobre este fato que comoveu o mundo. É nada mais do que um novo capítulo de uma luta que se intensificou quando o governo impulsionou, em 2009, uma lei para democratizar a comunicação, um objetivo atrasado desde que a ditadura cívico-militar chegou ao fim, em 1983.

Essa lei, que abarca somente os serviços audiovisuais – e não a imprensa escrita – propõe um processo de multiplicação de meios mediante dispositivos antimonopolistas, com a óbvia afetação dos interesses econômicos, mas também da posição privilegiada de controlar a agenda jornalística do país – bem como de ter o poder de manipular as tendências culturais, as linguagens, as estéticas, e resolver, em definitivo, quem tem possibilidade de ser visto no país.

O Clarín construiu seu poder sujando suas mãos de sangue. Entrou em acordo com o ditador Jorge Rafael Videla para a obtenção de uma empresa de maioria estatal, a Papel Prensa, única processadora de papel para jornais no país. Para obtê-la, foram cometidos, segundo denúncias que estão nas mãos da justiça, crimes aviltantes contra um grupo de empresários que detinha ações da empresa, e que tiveram de se desfazer delas a preço vil, sob mil pressões do aparato repressivo. Com o manejo do papel, dominar ou esmagar os competidores foi uma tarefa fácil.

A expansão do grupo Clarín se aprofundou com o presidente neoliberal Carlos Menem, que em uma das suas primeiras medidas ao assumir, em 1989, entregou à empresa o Canal 13 de televisão, que era estatal.

Apoiado por universidades, organismos de direitos humanos, cooperativas e sindicatos, organizações sociais de base e meios cooperativos e comunitários, o governo de Fernández de Krichner colocou em discussão esse modelo e se propôs a desarmá-lo, um objetivo até agora não cumprido, já que a lei aprovada em 2009 não é aplicada integralmente: com a ajuda de juízes de vários pontos do país, o Clarín obteve sucessivos amparos legais para não vender uma parte dos meios de comunicação com os quais domina o mercado.


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