LEI DE MEIOS, DEMOCRATIZAÇÃO DA PUBLICIDADE E VISITA DE JOÃO ROBERTO MARINHO A DILMA




A indignação da presidenta, pelo menos em público, durou apenas até o anúncio da apertada vitória (Foto: Internet)
Nesta quarta-feira (03) Dilma recebe no Palácio do Planalto um dos presidentes do Grupo Globo.

Por Fábio Lau - do Rio de Janeiro - reproduzido do jornal digital Correio do Brasil, de 03/12/201

Dilma Rousseff encheu-se de arroubos e indignação quando a Veja quase a derrubou do trono de presidenta. Disse, entre outras coisas, que o país corria perigo na sua ordem democrática enquanto a mídia partidária se arvorasse detentora do poder de mentir e interferir no processo eleitoral. Por sorte, naquele momento, véspera das eleições no seu segundo turno, outras empresas e concessionárias não fizeram coro com a Veja.

A presidenta disse que tudo mudaria a partir de então. Tudo? Que o Brasil faria valer a sua Constituição, promulgada em 1988, e que garante a pluralidade da Comunicação e a proibição da propriedade cruzada – aquela que permite a um concessionário possuir TV, rádio, jornal, revista e etc.

Dilma, indignada que estava, pareceu finalmente disposta a legislar, neste campo, para todos. Não apenas para os meios tradicionais e corporativos que abocanham sozinhos a verba publicitária da União enquanto reduzem o quadro de funcionários a números jamais vistos. Só no Rio de Janeiro foram demitidos mais de 2 mil jornalistas em dois anos, segundo dados do Sindicato dos Jornalistas do Rio e do Sindicato dos Radialistas.

Eles atuavam em empresas consolidadas – como a TV Globo, Folha de São Paulo e o próprio grupo Abril, por exemplo – que anunciam lucros estratosféricos a cada ano – para a felicidade dos acionistas. Os lucros vêm da publicidade privada, que chega depois de estimulada pelo pagamento antecipado de bônus de valor, além de verba que desembarca dos governos municipal, estadual e federal.

Estes recursos chegam através de publicidade e também do pagamento de assinaturas de revistas, jornais e TVs a cabo. Pelo menos 40% da revista Veja são comprados via assinaturas pagas pelo governo do Estado de São Paulo – razão pela qual problemas administrativos e escândalos são solenemente ignorados pelas publicações.

Para se ter uma ideia, só no primeiro semestre de 2011, a Globo Comunicação e Participações S.A., responsável pela TV Globo, rádios, revistas, jornais e sites ligados à emissora, abocanhou quase um terço da verba aplicada pela Presidência da República entre janeiro e julho daquele ano: R$ 52 milhões. É importante frisar que o valor da publicidade aumenta na proporção inversa do número de sua audiência ou leitores. Enquanto a Internet cresce e reduz a audiência da TV aberta, por exemplo, o custo da publicidade nas plataformas decadentes só faz crescer. E o país inteiro paga a conta.

Este valor aumenta ano a ano e neste período estima-se que tenha chegado perto de R$ 600 milhões. Nesta quarta-feira (03) Dilma recebe no Palácio do Planalto um dos presidentes do Grupo Globo. Em pauta? Um pedido de desculpas pelas manchetes negativas contra a presidenta, outro para que ela não insista na Lei de Meios e que não interrompa, reduza ou mesmo pulverize recursos da publicidade oficial. Esta agenda, claro, não foi divulgada. É apenas o livre pensar de um jornalista acostumado com o tempero empregado pela velha mídia nas suas relações com o poder.

No Rio, por iniciativa do vereador Reimont Otoni, do PT, a Câmara Municipal se abriu para que parte da verba publicitária chegue também às mídias alternativas. Embora não contemple ainda diretamente a mídia digital, ela é um respiro para um setor que vive sua maior asfixia. A Assembleia Legislativa do Rio também caminha nesta direção e haverá reunião na próxima semana para tratar do tema. Os executivos do Rio, na sua prefeitura da capital e governo do estado, permanecem reféns do Grupo Globo e não acenam com nenhuma mudança.

Dilma, por conta do ataque que sofreu e o risco impingido contra a democracia, perpetrado por Veja, teria todas as razões para iniciar o processo em Brasília. Ainda não o fez ou mesmo acenou para isso. Afastou do seu círculo o jornalista Franklin Martins, que tem projeto nesta área, e ameaça convocar para o Ministério das Comunicações o governador da Bahia, Jacques Wagner – que, pelo perfil moderado, não comprará briga com as grandes corporações da mídia. E o vereador Reimont Otoni falou com muita precisão sobre isso em entrevista esta semana em Conexão Jornalismo – não será possível mexer nesta estrutura viciada sem se ferir no espinho.

E assim, caso se confirme a batida que assistimos daqui, jornalistas continuarão sendo enxotados das grandes empresas, não conseguirão ser absorvidos pelas novas mídias (carentes de recursos por conta de um preconceito ainda presente que parte dos governos e mesmo das agências privadas), e especialmente leitores e internautas continuarão reféns de um modelo de mídia e informação viciada que resiste em dar pluralidade de opinião à população – em completo descompasso com o mundo moderno e evidente desprezo à inteligência nacional.

Fábio Lau é jornalista, diretor do site de notícias Conexão Jornalismo.

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