SALVADOR-BAHIA: ORDEP SERRA VIRA IMORTAL E BRADA CONTRA INJUSTIÇAS

Ordep com o povo de santo (Foto: Pilha Pura)
O novo membro da Academia de Letras da Bahia, como bom antropólogo que é, bateu e bateu muito no genocídio da juventude negra suburbana, no desprezo dos brancos e dos governos para com a riqueza cultural e patrimonial da população negra, nas agressões aos terreiros e às comunidades indígena e quilombola...

Por Sinval Soares, jornalista baiano - reproduzido do blog Pilha Pura, de 05/09/2014


Um comovente discurso, feito sob retórica impecável e repleto de protestos em nome da sociedade, especialmente da população negra, do povo de santo e comunidades indígenas, mas também citando casos que marcaram sua vida, marcou o início da “imortalidade” do antropólogo, professor e escritor Ordep Serra ao tomar posse na Academia de Letras da Bahia na noite da última quinta-feira (dia 4). Agora é dele a cadeira de número 27, antes ocupada pelo também escritor James Amado e que tem como patrono Francisco Rodrigues da Silva.

Ordep recebeu o manto de imortal por pura obra e arte manifestadas em suas múltiplas facetas de atuação na vida cultural, mas especialmente pela sua produção literária. Não por acaso, recebeu dois prêmios da própria Academia, com os livros “Sete Portas” (contos, 2008), e “Ronda: Oratório Malungo” (romance africano, 2010), mas não são os únicos da sua coleção. Também se aventurou no cordel (uma de suas produções se transformou em peça teatral), na música, na tradução de textos clássicos etc. Foi citado como o mais brilhante intelectual baiano de sua geração pelo acadêmico Luiz Antônio Cajazeira Ramos, que fez o discurso de recepção.

No seu pontuado discurso, Ordep Serra reverenciou os diversos mestres que o conduziram na vida, seus pais, sua eterna musa inspiradora e mulher/namorada Regina, contou causos, como uma bebedeira comemorativa de um dos seus feitos estudantis na longínqua Brasília e que o levou a recitar versos em grego para um grupo de candangos que o aplaudiu fervorosamente, mesmo sem entendê-lo, enfim... Falou de suas vivências na linda e natal Cachoeira e no sertão baiano, citou aprendizados com intelectuais e artistas, a sua prática antropológica em comunidades indígenas, citou filósofos com grande intimidade do saber, do seu convívio com estudantes com os quais sempre aprende muito, e lembrou do enorme sacrifício para, junto com o irmão e também antropólogo Olímpio Serra, e outros abnegados da causa, iniciar o tombamento de  importantes patrimônios erguidos em nossa terra pelos negros.

Mas esse novo acadêmico, como bom antropólogo que é, bateu e bateu muito no genocídio da juventude negra suburbana, no desprezo dos brancos e dos governos para com a riqueza cultural e patrimonial da população negra, nas agressões aos terreiros e às comunidades indígena e quilombola, no encobrimento dos rios soteropolitanos, bem como na degradação de Salvador, submetida aos interesses políticos e imobiliários, escusos e privados, tudo em detrimento do interesse público. Mostrou, assim, o seu ativismo social, ele que integra diversos movimentos sociais e culturais em Salvador.

Graduado em Letras pela Universidade de Brasília (UNB), mestre e doutor em Antropologia, Ordep Serra é também membro da Associação Brasileira de Antropologia e da Sociedade Brasileira de Etnobiologia e Etnoecologia. Foi presidente do Instituto do Patrimônio Artístico e Histórico da Bahia. Atua como presidente da Câmara de Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Natural do Conselho Estadual de Cultura, onde elabora pareceres sobre o tombamento de patrimônios materiais e imateriais da Bahia. Tem ainda pesquisas nas áreas de antropologia da religião, antropologia das sociedades clássicas e etnobotânica.

A posse dele na ALB foi saudada por vários representantes do candomblé, intelectuais, artistas amigos e familiares, além de contar com as presenças do presidente da própria Academia, Aramis Ribeiro, o professor Albino Rubim, secretário de Cultura do Estado, o professor João Carlos Sales, reitor da UFBA, o vereador e ex-governador Waldir Pires e Consuelo Pondé de Sena, presidente do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia.

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