UM PANORAMA COM AS PERSPECTIVAS PARA O CONTINENTE


A vitória de Humala no Peru interrompe uma escalada de sucessivos governos aliados dos Estados Unidos


Por Joaquín Piñero (Reproduzido do sítio do jornal Brasil de Fato, de 15/07/2011)


O cenário político latino-americano apresentou algumas alterações nesse último período com a vitória de Ollanta Humala ao governo do Peru; o retorno do presidente Manuel Zelaya a Honduras e mais recentemente a confirmação de que o presidente venezuelano Hugo Chávez está se tratando de um câncer.


Aparentemente essas notícias não teriam muita importância se as analisarmos de forma desconexa. Mas quando as inserimos em um ambiente onde há intensas disputas políticas permanentes vamos perceber o grau de relação que cada uma tem com a outra e com o todo.


A vitória do nacionalista Ollanta Humala no Peru em 5 de junho de 2011, derrotando no segundo turno Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori que se encontra preso condenado a 25 anos de prisão por violação dos direitos humanos, entre outros crimes, interrompe uma escalada de sucessivos governos aliados dos Estados Unidos.


Também foi um “banho de água fria” na criação da AIP (Área de Integração Profunda) ou Bloco do Pacífico, formado pelo Chile, Colômbia, México e Peru, que são países que têm Tratados de Livre Comércio com os Estados Unidos, exceto a Colômbia que ainda está aguardando a aprovação pelo Congresso estadunidense. Após eleito, o presidente Humala escolheu o Brasil para anunciar que suas prioridades na política externa serão a CAN (Comunidade Andina de Nações) e a UNASUL (União das Nações Sul-americanas), deixando assim a AIP de lado.


O outro episódio importante na conjuntura da região foi o retorno no mês passado do presidente Manuel Zelaya a Honduras após ficar 16 meses no exílio na República Dominicana. Vítima de um golpe de estado, perpetrado com o apoio dos Estados Unidos, esse episódio foi amplamente divulgado aqui no Brasil, pois em sua segunda tentativa de retorno, Zelaya foi abrigado na embaixada brasileira em Tegucigalpa, além de provocar a expulsão de Honduras da OEA (Organização dos Estados Americanos).


O retorno de Zelaya e o processo de reincorporação de Honduras à OEA se deram a partir da assinatura do Acordo de Reconciliação Nacional. O documento que contou com o apoio e a articulação da Venezuela é composto de 10 eixos, entre eles está a garantia de segurança e os direitos de Zelaya, além de anular o veto a consultas e referendos populares.


O outro fato mais recente, dentro desse cenário que estamos descrevendo, foi a confirmação pelo próprio presidente Chávez que está se tratando de um câncer na região pélvica. Esse anúncio deixou em polvorosa tanto a oposição venezuelana quanto os apoiadores de seu governo. O anúncio de dita enfermidade veio em um momento onde a Venezuela iniciava seus festejos pela comemoração de seu Bicentenário da Independência e se preparava para assumir a secretaria rotativa da recém-criada Comunidade dos Estados Latino-americanos e Caribenhos (CELAC), evento importantíssimo, pois se trata de um espaço de articulação política no continente onde não estão presentes os Estados Unidos nem o Canadá e que sua inauguração foi postergada para data ainda não sabida.


Também pode-se creditar os impactos do pronunciamento de Chávez sobre sua doença, não só para a sociedade venezuelana, mas também para aqueles que acompanham atentamente a conjuntura no continente, ao fato de que haverá eleição presidencial marcada para o ano que vem e que Chávez sempre apareceu como um fortíssimo candidato.


Estimular as mobilizações de massas para garantir as mudanças estruturais


Quando Chávez se elegeu presidente em sua primeira eleição em 1999, deu-se início a um processo em nosso continente onde se elegeram candidatos que traziam consigo um forte discurso anti-neoliberal e que agora comparando com o que tínhamos no passado, os chamamos de “progressistas”. Daí resultaram Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, Fernando Lugo no Paraguai, Lula e Dilma no Brasil, José Mujica no Uruguai, entre outros, e mais recentemente Ollanta Humala no Peru.


Ao analisarmos o que foram os governos em nossa região, onde a maioria eram ditaduras e que nos anos 90 se tornaram neoliberais, hoje podemos dizer que estamos vivendo uma situação mais favorável para os processos de transformações.


No entanto, não podemos nos esquecer que há uma disputa permanente entre projetos representados pelas classes e forças sociais atuantes. Há ainda o predomínio de um modelo de capitalismo dependente, o qual não permite o desenvolvimento de modelos de desenvolvimento nacional. Há uma hegemonia do capital financeiro internacional, e que após a crise de 2008 ampliou o processo de exploração e espoliação de nossas riquezas naturais.


Portanto, ainda que vejamos como positivas as vitórias eleitorais e os governos progressistas, essa via sozinha não se sustentará por muito tempo. O nosso papel sempre será o de estimular as mobilizações de massas para garantir as mudanças estruturais que necessitamos.

Joaquín Piñero é integrante do coletivo de relações internacionais do MST.

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