Nove dias de emoções - 3


3º dia – 6/1/2001 – sábado
Escrito às 12:20h – Pousada de D.Didi (Subaúma)

De Porto de Sauípe a Subaúma – 21 Km
Saída P. Sauípe – 5:40h
Chegada entrada de Massarandopió – 8:20h (2:40h – 9 Km)
Saída Massarandopió – 8:35h
Chegada Subaúma – 11h (2:25h – 12 Km)
Jornada longa e dura, especialmente devido aos pés – estamos bastante castigados pelas basqueteiras e o consumo de bandeide cresceu enormemente. Tive de tirar o calçado logo após sair de Massarandopió – os dedos doendo, um chegou a sangrar um pouco. Andei então com duas meias, depois coloquei as palmilhas da basqueteira entre uma meia e outra, aliviando bastante o ardor no solado dos pés, principalmente nos calcanhares.
Há três pequenos riachos desembocando no mar entre Massarandopió e Subaúma – logo no primeiro molhei os sapatos e tive de tirá-los.
Deta aguentou com sapato até faltando cerca de 4 Km para Subaúma – ficou com as duas meias. Ela que teve tantos problemas na compra da basqueteira, está com os pés menos castigados do que eu.
Até agora, terceiro dia, continuamos poupados pelo sol – hoje não houve chuva. Um pouco de calor a partir das 10h.
Todos os 21 Km fomos pela areia – tudo terra batida – ótima para caminhada se não fosse o castigo dos pés. Todo o trajeto bastante deserto.
A cerca de 4 Km de Subaúma um grupo de pescadores/turistas (cinco homens), em dois Bugres, nos ofereceu carona. “Foi difícil recusar”, diz Deta, pois estávamos cansados e os pés doendo. Mas agradecemos, dissemos que se tratava de um desafio e seguimos em frente.
A 2 Km da entrada de Massarandopió (o povoado fica a 4 Km), deparamos com uma área da praia destinada à prática do nudismo (os adeptos usam o termo naturismo). É da Abanat (Associação Baiana de Naturismo), filiada à FBN (Federação Brasileira de Naturismo). Chegamos a uma barraca (era cedo e não havia ninguém na praia) e fomos recebidos, gentilmente, por dois senhores devidamente “trajados” (isto é, nus).
Como saímos às 5:40h perdemos o café da manhã, pegamos umas coisas na pousada – batata cozida (meio estragada), laranjas, uma manga de vez, um quiuí. Péssima experiência. Deta passou a manhã sustentada por rapadura.
Ao chegarmos, tomamos logo uma cerveja, compramos Violeta Gensiana para amenizar os problemas dos dedos dos pés e providenciamos pousada.
Deta observa que até agora não tomamos banho de mar e eu observo que nosso objetivo é a caminhada, o mais é secundário. Deta retruca que eu sou muito caxias, defende que fazemos a caminhada, mas entremeada por diversão – parar mais, tomar banho, tirar um coco na estrada, etc.
13:05h – agora vamos tomar uma e comer.
Volto ao diário na madrugada (dia 7 – 0,40h – Pousada D.Didi/Subaúma):
Há duas expectativas para o 4º dia: 1ª - decidimos abandonar as basqueteiras (pra mim, definitivamente; pra Deta, temporariamente). Vamos tentar a sandália japonesa, pois o castigo nos pés está intolerável; 2ª - continuamos esperando aparecer o sol brabo do verão baiano para testarmos nossa resistência ao calor.
No mais, é difícil dormir, após já ter dormido à tarde, ouvindo a famigerada música baiana (tipo Tchan e “Desarmonia” do Samba), uma erva daninha que grassa pelos ares da Bahia.

4º dia – 7/1/2001 (domingo)
11:40h - Pousada de D.Zezé e Seu Virgílio – Encantos Pousada – Baixio

De Subaúma a Baixio – 20 Km
Saída – 5:15h
Chegada – 10h

Como perdemos 1h (ver em seguida), 3:45h p/20 Km – se a quilometragem estiver realmente correta, batemos recorde (mais de 5 Km/hora).
Tivemos um problema grave logo de saída: erramos o local da travessia do rio Subaúma e nos embrenhamos por um mangue, pedras e mata. Andamos uma hora, meio perdidos, tentando atravessar o rio. Acabamos voltando, sem perceber, ao povoado. Como era muito cedo, havia pouca possibilidade de encontrarmos pessoas para nos orientar. Ainda estava clareando o dia. Encontramos, afinal, dois pescadores, que, com a natural boa vontade dos nativos, nos mostraram onde atravessar. Fácil, fácil, a maré estava baixa, passamos com água até as virilhas. Nos informaram da maré baixa até 10h, bom para caminhada (areia batida) e como dissemos que iríamos até Baixio, um deles comentou com naturalidade: “Ah! Dá pra ir”.
Levamos um susto, eu fiquei um pouco irritado e perdemos 1h.
Após a travessia, porém, a coisa foi melhor do que o esperado. A experiência da sandália japonesa deu certo, por enquanto. Deta teve dois calos pequenos (já está com quatro calos) e usou uma meia com a sandália. Eu fiquei só com a sandália e tudo correu bem depois que aprendemos a tirar os resíduos de areia, que machucam a pele com o atrito nas correias. Pelo menos com maré baixa e areia batida, a sandália superou plenamente a basqueteira.
A outra expectativa do dia (o sol/calor) foi enfrentada muito bem. Houve efetivamente sol, mas como conseguimos chegar até 10h, o castigo foi ameno. Deta nem chegou a molhar a toalha usada para umedecer a cabeça e pescoço.
O percurso bastante deserto: encontramos apenas três nativos de bicicleta (vinham em direção contrária, passaram por nós e voltaram) e um outro a pé.
Como saímos sem café, comemos andando quatro sanduíches de queijo e pedaços de rapadura (por sinal, um pão gostosíssimo).
Eu senti bastante cansaço nas pernas. Deve ter sido agravado pelo uso da japonesa – doeram o pé (as articulações), as batatas da perna e os músculos das coxas. Foi duro, mas aguentei.
Pensávamos em chegar em torno de 11h, quando muito 10:30h, mas, com alívio, chegamos às 10h.
Atingimos mais ou menos a metade do percurso previsto para a costa baiana.
Em Baixio fomos alvos de duas manifestações de simpatia: quando fomos comprar álcool canforado, numa pequena farmácia, a dona não quis cobrar, comentando sobre nossa aventura com admiração; a outra foi quando atravessávamos o povoado em direção à pousada: um casal passou de carro, o cara comentou para a mulher que “esse pessoal tava ontem em Subaúma” e nos saudou buzinando o carro. Na pousada de Subaúma uma moça tinha nos falado sobre sua vontade de fazer uma caminhada semelhante, dizendo que se achava capaz fisicamente da empreitada, mas lembrava não poder, porque tinha um filho pequeno para cuidar.

5º dia – 8/1/2001 (segunda-feira)
12:45h - Pousada Canto do Mar – Barra de Itariri

De Baixio a Barra de Itariri – 16 Km (?)
Saída – 8h (após travessia do rio Inhambupe)
Chegada – 11:15h (3:15 para 16 Km)
Uma grande confusão sobre as distâncias: de Subaúma a Baixio seriam 20 Km, enquanto de Baixio a B.de Itariri seriam 16 Km. Pela nossa caminhada, ficamos convencidos de que o trajeto de hoje pode ser mais de que 16 Km e o de ontem pode ser mais curto de que 20 Km. Ficamos confusos. Como as pessoas sabem a quilometragem pela rodovia, me parece que em alguns casos a distância pela praia é bem menor e, às vezes, bem maior.
Hoje, na saída, tivemos um pequeno contratempo na travessia do rio Inhambupe. Outra vez informação truncada ou mal entendida sobre o local da travessia. Mas encontramos Seu Nilson, já avisado pelo dono da pousada (Seu Virgílio), e fizemos a travessia por barco.
Mais uma vez tivemos sorte com a maré baixa – “maré morta”, como disse Seu Nilson.
Mais um dia de sandália japonesa. Acredito que, pelo menos pra mim, a basqueteira está descartada definitivamente. Andei sem problemas com sandália. Aprendemos inclusive a técnica de arrastar a sandália, relaxando os músculos do pé e da perna, tipo “sarga-bunda”, Prá mim tudo bem. Deta, no entanto, teve problemas com sandália: dor nas costas e no pé direito, que ela atribui à sandália, além de uma bolha estourada no pé esquerdo. Teve de usar sandália com meia. Ela chegou bastante castigada e vai voltar amanhã à basqueteira.
Eu continuo com dois dedos com as unhas roxas, herança da basqueteira, e pretendo me desfazer dela o mais rápido possível, pois é um peso a mais na mochila.
O sol hoje foi mais ou menos, saiu cedo, mas foi amenizado por algumas nuvens.
O trecho hoje foi bem mais movimentado por pescadores (nativos).
A travessia do rio Itariri (na chegada) foi a pé com água até a cintura, guiados por um salva-vida. Após a travessia, já em pleno povoado, sentamos num bar e tomamos duas cervejas, prática que vem se tornando uma praxe nas chegadas a cada povoado (depois, no almoço, havia sempre mais duas cervejas e uma dose de bebida quente).
19:20h – B.de Itariri (retomando o diário)
Estamos bem com alimentação até aqui. Almoço todos os dias com peixe. Eu já estou meio enjoado, doido por um ensopado de galinha (devido ao tratamento de dentes devo evitar carne). Já Deta está adorando peixe todo dia.
À noite, temos conseguido café com leite. Hoje mesmo está programado um com cuscuz de milho, minha predileção. Além disso, comemos uma pizza ótima no Diogo e um macarrão italiano do Porto de Sauípe.
Pela manhã, só duas vezes (até agora) não esperamos o café da manhã da pousada: numa vez comemos gostosíssimos pães com queijo e noutra fomos mal, com umas frutas ruins e batata cozida azeda (claro que só eu comi as batatas azedas). No mais, temos o adjutório da rapadura.

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