Bandeiras vermelhas tomam as ruas de Curitiba

Integrantes do MST caminham pelas ruas centrais da cidade
De Curitiba(PR) - Depois de duas semanas de caminhada por quase 30 cidades do Paraná, 400 militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, o aguerrido MST, tomaram na última quinta-feira, dia 4, as ruas centrais da capital e “plantaram” no coração da cidade (Boca Maldita, na Rua XV) as sementes da rebeldia, da resistência e da mudança.

Bandeiras vermelhas e gritos de guerra – como “Pátria Livre - Venceremos”, “MST – Esta luta é pra valer” – aqueceram a fria e ensolarada manhã dos curitibanos। Passantes, balconistas e moradores, das portas, janelas e calçadas, entre receptivos, curiosos e espantados, assistiam ao desfile barulhento e organizado daqueles homens e mulheres, com cara e cheiro de gente, de trabalho e de terra.

Por certo, eram humanos como a maioria de nós – talvez muitos tenham pensado। E não aqueles “bandidos” em que são transformados pela mágica das telas da TV Globo. Certamente que não! Mas quem reparasse nas faixas e palavras de ordem, amplificadas pelo carro de som, poderia facilmente entender o porquê do processo de criminalização infligido ao MST e a outros movimentos sociais pelas corporações da mídia brasileira.

Da Praça Rui Barbosa até o calçadão da Rua XV de Novembro, passando por ruas como a André de Barros, os militantes seguiam pregando “pela reforma agrária”, “em defesa do petróleo nacional”, “pela reestatização da Vele, Petrobras, Embraer e CSN”, etc, etc। Como se vê, uma pregação indigesta para o estômago da nossa grande imprensa।

DEBATE DA CRISE E PROJETO POPULAR - Um panfletinho era entregue de mão em mão – “Trabalhadores e trabalhadoras não pagarão pela crise” -, anunciando que se tratava de um “mutirão para debater a crise e o Projeto Popular para o Brasil”, sob os auspícios do MST, Via Campesina e Assembléia Popular (AP), com o apoio da Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS).
Em frente ao prédio do Ministério da Fazenda(fotos acima), na Rua Marechal Deodoro, houve uma breve parada e Juvêncio Rosa Ramos, da coordenação estadual do MST, discursou contra as medidas econômicas adotadas pelo governo federal no enfrentamento da crise do capitalismo, as quais – protestou – priorizam a manutenção dos lucros do capital.



Paulo Bearzoti

Juvêncio Rosa Ramos
Diante da Universidade Federal do Paraná, na Praça Santos Andrade, outra parada. Paulo Bearzoti, da AP, falou em nome dos movimentos populares urbanos. Para ele, o modelo urbanístico da capital paranaense, tão exaltado na mídia, atende na verdade aos interesses da elite em detrimento dos bairros mais pobres. E Isabel Cristina Diniz, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), referiu-se ao quadro de perseguição e assassinatos de trabalhadores rurais.
Isabel Cristina Diniz

"Plantando" sementes de ideias no calçadão da Boca Maldita"
PLANTANDO SEMENTES DE IDÉIAS - Já na Boca Maldita, no encerramento do desfile, foi encenada a “plantação” com sementes de milho, espalhadas sobre bandeiras do movimento estendidas no meio do calçadão, simbolizando o debate de ideias que os militantes sociais empreenderam nos últimos 20 dias।

Foi uma maratona। De Florestópolis, a 450 quilômetros da capital, saiu a “coluna do Norte” no dia 18 de maio, com 200 pessoas. E de Foz do Iguaçu, a 650 quilômetros, saíram mais 200 na “coluna do Oeste”. Todos convergiram para Campo Largo, na região metropolitana. Daí, após ato no Memorial ao MST na BR-277 (Monumento Antonio Tavares, feito por Oscar Niemeyer, em homenagem ao líder camponês assassinado no local), rumaram para Curitiba, de ônibus.

Durante toda a caminhada foram parando nas cidades e promovendo panfletagens e debates nas escolas e comunidades. Por isso, o termo mutirão. E o mutirão continuou na capital na quinta, sexta e sábado, só encerrando no domingo, dia 7, com um encontro de avaliação no Colégio Estadual do Paraná (CEP), no Centro Cívico.

(A “coluna do Norte” percorreu as seguintes cidades: Florestópolis, Porecatu, Bela Vista do Paraíso, Londrina, Rolândia, Arapongas, Marialva, Sarandi, Maringá, Mandaguari, Jandaia do Sul, Apucarana, Marilândia, Ortigueira, Imbaú, Ponta Grossa, Campo Largo e Curitiba. E a “coluna do Oeste”: Foz do Iguaçu, Medianeira, Matelândia, Cascavel, Ibema, Nova Laranjeira, Laranjeiras do Sul, Cantagalo, Guarapuava, Irati, Palmeiras, Campo Largo e Curitiba).

Nas paredes da memória
Enquanto acompanhava as atividades do MST, voltando aos meus velhos tempos de repórter, agora com uma maquininha digital, três lembranças repassavam nas paredes da memória (expressão feliz de Balzac e Belchior):

1 – No início de 2002, Deta (minha mulher) e eu visitamos um assentamento do MST em Viamão, Grande Porto Alegre. Leonildo Zang, da coordenação local, nos recebeu muito bem e mostrou o belo trabalho que faziam. Conversa vai, conversa vem, Leonildo disse mais ou menos assim: “Não, Lula não vai fazer a reforma agrária. Quem tem que fazer a reforma agrária somos nós”. Me espantei, mas ele estava certo. Naquela época, no início da quarta campanha presidencial de Lula (afinal, vitoriosa), eu acreditava que no seu governo a reforma agrária viraria, finalmente, realidade. Santa ingenuidade!

2 – Após uma das muitas e ruidosas campanhas de ocupação de terras, executadas pelo MST, o então ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, é entrevistado na Rede Globo. Comentarista e apresentador da Globo transpiram raiva, chantagem, querem estrangular os “baderneiros”. O Dirceu me saiu com uma resposta exemplar: “A solução não é reprimir o MST, mas sim fazer a reforma agrária”.

3 – Em entrevista à Carta Capital, há uns quatro anos, João Pedro Stédile, da coordenação nacional do MST, fez uma previsão temerária. Ele próprio admitia tratar-se de um palpite, um chute. Previa que em meados do próximo mandato presidencial, fosse quem fosse o presidente (terminou dando Lula de novo), o povo brasileiro acabaria desembocando num processo de mobilização de massas. Meados do mandato estão aí. Até agora, nada ou quase nada. Será que a crise pode balançar o marasmo? Pelo sim, pelo não, o MST insiste, persiste e não desiste de “plantar” suas sementes.

(Em seguida a esta matéria, este blog publicará outras reportando algumas das muitas atividades do MST em Curitiba nos quatro dias).

Comentários

Jadson disse…
O amigo José Crisóstomo, companheiro de militância dos velhos tempos, professor de Filosofia da Universidade Federal da Bahia (atuou também com os jesuítas de Salvador na respeitada revista Cadernos do CEAS – Centro de Estudos e Ação Social), fez uma rápida apreciação crítica da matéria. Como não conseguiu postar o comentário – problemas da nossa geração com a tal da informática – transcrevo aqui, devidamente autorizado, o conteúdo de seu e-mail.
Depois de me saudar como “jornalista romântico-realista” (coisa de amigo), ele diz que a matéria é “eficaz na comunicação de um negócio. Eu, por outro lado, procuraria puxar - ainda que implicitamente - uma avaliação apenas um pouquinho mais pragmática. A bandeira ‘reestatização’ de coisas não dá apenas raiva na grande imprensa (e no grande capital), tb não empolga mais lá muito a população (mediania). Nem Lula fez a reforma agrária nem veio a sublevação (o MST poderia ter me perguntado que eu diria que não vinha). O movimento social vive, compreensivelmente, de certos artigos de fé - e de muita ideologia. Eu simpatizo com o MST, defendo. Que bom que existe ele! Mas, como tudo nesse mundo, pensa que tá fazendo uma coisa e tá fazendo outra. E se envolve tb em problemas e em pecados próprios. Não?”
Está aí o recado do companheiro Crisóstomo.
Unknown disse…
Amor,
Seu texto tá lindo! Gostei muito, mas sou suspeita, né?
Quando se trata de movimentos sociais, especialmente o MST, vc bota sua emoção no texto, eu mesmo chego a sentir essa emoção, mas repetindo, sou suspeita. Beijo
pethi disse…
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